“Vacinação é diferente de imunização”

No gabinete do secretário estadual da Saúde, André Motta Ribeiro, uma tela enorme expõe os números do Vacinômetro. É nela que o responsável pela pasta que trata diretamente do enfrentamento da pandemia analisa dados e o cenário de um dos maiores dramas da sociedade moderna. Estratégias, regramentos e ações passam por este funcionário de carreira da secretaria, que bem cedo se acostumou aos desafios, desde quando atuava nas emergências de hospitais.

Motta Ribeiro assumiu a secretaria após o escândalo dos respiradores que levou à queda do então titular, Helton Zeferino. Desde então, tem cruzado o estado e viajando diversas vezes a Brasília em busca de soluções para os diversos problemas que a pandemia trouxe.

Nesta entrevista exclusiva à coluna Pelo Estado, ele fala do avanço da vacinação e da falsa impressão de que a guerra está vencida. Explica que os novos regramentos apenas fazem parte do processo e que todos ainda precisam tomar muito cuidado diante do vírus poderoso.

Confira:

 

Os números da pandemia estão em queda. É a luz no fim do túnel?

Os números são interessantes, há um indicativo de melhora de cenário gradual, ainda não muito consistente, mas a gente percebe claramente a diminuição dos casos ativos, da média de número de óbitos/dia, apesar de ainda estar alto – 30 a 40 por dia em Santa Catarina eu ainda considero elevado. Nós melhoramos a oferta de leitos de terapia intensiva, temos mais de 200 leitos vagos. Isso é fruto e resultado de uma série de ações. Em março foi editado um decreto num momento de piora do cenário. Então, não há agora uma flexibilização e sim a extinção de necessidade do decreto. Nós continuamos com a Matriz de Risco e as portarias norteando cada risco.

 

Até que ponto a vacinação contribui para esta melhora de cenário?

Tratamento e resolução de crise pandemia é com a vacinação. Isso é muito claro. É certo de que várias atitudes trouxeram este cenário melhor. Nós temos um percentual bastante interessante de vacinados. Em números absolutos somos o oitavo estado que mais vacina, mesmo não sendo o oitavo mais populoso. Mas quando a gente compara os números de doses pela população alvo nós vamos para a quarta posição. Nós temos mais de 4,4 milhões de doses aplicadas, o que é bastante impactante. Se nós entendermos que 3,2 milhões de pessoas já receberam ao menos uma dose, isso está entre 55% a 60% do público vacinável, que são, no total, mais de 5,5 milhões de pessoas acima de 18 anos. Então, isso diminui a velocidade do vírus, gravidade de doença. Enfim, um conjunto de fatores que nos traz um apontamento de melhora de cenário que a gente espera que seja gradual. Mas, a vacina não é carta de alforria. Os nossos regramentos sanitários precisam ser mantidos.

 

O senhor está satisfeito com o ritmo de recebimento de vacinas?

O Ministério da Saúde tem cumprido com seus compromissos e tem contratado um quantitativo bastante grande de doses. São mais de 600 milhões de doses para todo o país, suficiente para toda a população, com sobra. É um ritmo adequado e nós temos o cuidado em Santa Catarina de só liberar a D2 (segunda dose) para o lugar da D1 (primeira dose) com garantia da chegada de mais remessas. Foi o que fizemos esta semana.

 

 

Foto Divulgação/Secom

“Precisamos ter pelo menos 95% da população imunizada. Ou seja, com as duas doses, exceção à vacina de dose única. E para imunizar são necessários 20 a 30 dias após a segunda dose.”

 

O senhor continua confiante no compromisso de vacinar todos os adultos acima de 18 anos até o final de agosto, com pelo menos uma dose?

Sim. Temos a segurança, e sempre tenho dito que esse governo não faz promessas, assumimos compromissos. Então quando o calendário é posto desta forma, é porque entendemos que será cumprido.

 

Como o senhor vê a questão das pessoas que não buscam a segunda dose?

Nós melhoramos muito a busca ativa. Já tivemos mais de 100 mil pessoas que não foram atrás da segunda dose e hoje são 85 mil. Esse número é importante, mas é menos de 2% do que nós estamos vacinando. E existem vários motivos: as pessoas acabam vacinando e adoecendo ou falecendo porque a primeira dose não traz imunidade; tem pessoas que mudam de cidade; além das dificuldades de registro das doses, talvez seja o maior número. Nós temos 50 cidades de Santa Catarina responsáveis por 80% dessas ausências e isso pode significar problemas de registros, ao contrário do não retorno das pessoas.

 

O cenário atual cria uma sensação de que a pandemia está acabando. Qual a mensagem a passar neste momento?

Nós estamos no meio da pandemia. Ela não acabou. As doenças infectocontagiosas, para se ter segurança, nós precisamos ter pelo menos 95% da população imunizada. Ou seja, com as duas doses, exceção feita à vacina de dose única. E para imunizar as pessoas são necessários 20 a 30 dias após a segunda dose. Então, enquanto não atingirmos esse percentual de vacinados, aquelas pessoas vacinadas não pegam a doença de forma grave, mas elas podem ser assintomáticas e são contaminantes. Por isso precisamos manter o regramento. É uma doença da sociedade, são pessoas contaminando pessoas. Por isso, usar máscara, manter ambiente arejado, distanciamento, limpeza e lavagem de mãos e superfícies são fundamentais.

 

Como serão realizados os eventos testes e o que se espera deles?

Santa Catarina é muito rica em eventos, são feiras internacionais, festas municipais típicas e outros. Então a gente precisa propor um calendário e para fazer isso com regras que sejam seguras precisamos fazer eventos testes. A gente vai começar a fazer primeiramente com vacinados, para entender se é possível seguir regras previamente combinadas e acompanhar o resultado dessas ações. Monitorar essas pessoas por um tempo. O evento teste vai servir para dizer como poderemos suportar o calendário que tem que ser definido com antecedência, com segurança sanitária.

 

Foto Divulgação/Secom

“A vacina não nos dá carta de alforria. Precisamos continuar usando máscara, manter distanciamento e todo o regramento proposto.”

 

A pandemia represou cirurgias eletivas e, ao mesmo tempo, exige que se crie estrutura de atendimento pós-covid. Como trabalhar esses dois pontos?

Nós estamos realizando várias ações para chegarmos a um mesmo resultado: regionalizar o acesso às pessoas. Nós temos hoje 16 regiões de saúde, então precisamos que essas regiões sejam mais auto-suficientes possíveis para que possam regionalizar o acesso de todos ao sistema de saúde. Para isso, precisamos qualificar mais, ofertar mais serviços, trazer uma rede hospitalar complementar. Quando a gente fala em ofertar mais serviços são as cirurgias eletivas, terapia renal substitutiva, que é a hemodiálise do pós-covid, centro de especialidades de recuperação, saúde mental que foi muito impactada com a doença e para esses movimentos todos nós estamos fazendo agora a releitura da política hospitalar.

 

E como fazer para reduzir essa fila?

Nós estamos lançando um desafio à nossa rede hospitalar. A partir de 1º de outubro, se o cenário sanitário permitir, esperamos que em seis meses a gente diminua todo esse impacto que foi nos imposto por 1 ano e meio É um desafio forte mas eu tenho certeza absoluta que nós temos condições de vencer esse desafio. Eu tenho convicção de que isto é possível.