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STF segue método do arbítrio, não da Lava Jato – Deltan Dallagnol

Foto: Divulgação

Por: Deltan Dallagnol

04/10/2023 - 06:10 - Atualizada em: 17/01/2024 - 15:57

Já virou moda ver jornalistas, comentaristas e analistas políticos dizerem que o STF tem utilizado “métodos” da operação Lava Jato para investigar e punir o ex-presidente Jair Bolsonaro nas investigações que existem contra ele no Supremo: os supostos casos de fraude nos cartões de vacinações, a venda de joias no exterior e de tentativa de golpe de Estado após a vitória de Lula nas eleições de 2022. Mas será que isso é verdade?

Não, não é verdade. Quem é adepto da tese de que o STF está se tornando “lavajatista” para prender Bolsonaro normalmente afirma que os supremos ministros, em especial o ministro Alexandre de Moraes, têm se utilizado dos seguintes “métodos” da Lava Jato para encurralar Bolsonaro: a delação premiada de réus presos, prisões preventivas alongadas, a fishing expedition (pescaria de provas) e a concentração de poder na figura de um só juiz.

Em primeiro lugar, é mentira que a Lava Jato prendeu pessoas para conseguir delações. Um levantamento do procurador Regional da República Douglas Fischer mostra que, até o mês de agosto de 2018, foram 197 colaborações premiadas na Lava Jato, dentre as forças-tarefas do PR, de SP, do DF e do RJ. Dessas 197, apenas 31 eram presos. Desses 31 presos, apenas 7 obtiveram a liberdade provisória, não porque fizeram delação, mas sim porque não havia mais os requisitos previstos em lei. Muito diferente do que aconteceu com o tenente-coronel Mauro Cid, que foi solto pelo ministro Alexandre de Moraes imediatamente depois de fazer delação premiada.

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Em segundo lugar, todas as prisões preventivas da Lava Jato ocorreram por pedido fundamentado do Ministério Público, em que foram demonstrados todos os requisitos legais para a prisão, ao contrário do que ocorre hoje no STF, em que Moraes decide de ofício sem ouvir o MP. Além do mais, na Lava Jato ninguém nunca ficou preso sem denúncia, sendo que o próprio Mauro Cid ficou mais de 4 meses preso sem acusação formal, de modo idêntico ao que aconteceu com Anderson Torres.

Em terceiro lugar, não existiu a chamada “pescaria de provas” na Lava Jato, já que muitas das provas dos crimes foi entregue de forma voluntária pelos próprios colaboradores e pelas empresas que fizeram acordo de leniência, os quais também se comprometeram, de forma voluntária, a devolver o dinheiro roubado. As buscas e quebras de sigilo sempre estiveram bem fundamentadas em crimes graves, como as várias instâncias do Judiciário reconheceram. Foi diferente nos casos de Mauro Cid e Bolsonaro, em que as buscas e apreensões no caso da fraude no cartão de vacinas pareceram apenas um pretexto para a PF ter acesso aos celulares de Mauro Cid e Bolsonaro, e assim chegar a um caso maior como o de suposta tentativa de golpe de Estado. No caso dos empresários bolsonaristas que sofreram buscas e quebras por comentários em grupos de whatsapp, nem crimes havia.

A alegação de que havia uma indevida concentração de poder na mão de um só juiz na Lava Jato também é uma falácia, já que naquela operação havia, de fato, uma mega organização criminosa envolvendo partidos, doleiros, políticos e empresários que sistematicamente agiam em conjunto para fraudar licitações e desviar dinheiro das maiores estatais do país, como a Petrobras. Havia uma conexão probatória entre os casos porque os mesmos doleiros lavavam dinheiro para os mesmos partidos e os mesmos políticos, além de que os mesmos empresários pagavam propina para os mesmos funcionários públicos corrompidos.

Além disso, a própria competência da Vara de Curitiba foi restrita pelo STF para englobar apenas os crimes que envolviam a Petrobras. O caso originalmente foi distribuído ao juiz Sergio Moro de forma aleatória e por sorteio como manda a lei, ao contrário do que ocorreu no STF, com o ministro Alexandre de Moraes sendo designado relator de ofício do inquérito das fake news e depois relator universal de todas as questões do Brasil que quiser, sem fundamento jurídico que se sustente, em uma concentração de poder difícil de explicar para a sociedade.

É preciso ressaltar, ainda, que a Lava Jato aconteceu principalmente em primeira instância, onde todos os réus e investigados tinham amplo direito a recursos e podiam rediscutir seus casos, fatos e provas na segunda instância (TRF4), terceira instância (STJ) e quarta instância (STF). Na maioria dos casos, os tribunais superiores sempre validaram as decisões da Lava Jato. Agora, Bolsonaro e demais investigados perante o STF não têm para onde recorrer em caso de condenação: tudo começa e termina no Supremo. E, o que é pior, sem que haja sequer uma pessoa com foro privilegiado que justifique a competência do STF.

A realidade, portanto, não comprova a tese de que o STF tem utilizado “métodos” da Lava Jato, e quem alega isso só deve fazê-lo por ignorância ou má-fé. A Lava Jato sempre seguiu a lei e a jurisprudência dos tribunais, enquanto que os ministros do Supremo se colocam acima da leis Temos visto abusos, ilegalidades e autoritarismo contra aqueles que são vistos como ameaça ao Supremo ou como adversários políticos, como o ex-presidente Jair Bolsonaro e os agentes da lei que atuaram na Lava Jato, como eu mesmo e o senador Sergio Moro. O verdadeiro método do STF de hoje é o arbítrio.

 

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