Regulamentação das redes sociais: não é sobre censura!

foto: Freepik

Por: Raphael Rocha Lopes

06/02/2024 - 10:02 - Atualizada em: 06/02/2024 - 16:03

“♫ Come up to meet you, tell you I’m sorry/ You don’t know how lovely you are/ I had to find you, tell you I need you/ And tell you I set you apart” (The scientist, Coldplay).

É importante alertar, de início, aos eventuais radicais de lado a lado, que esse não é um texto sobre política partidária ou ideológica no sentido transfigurado; não se trata de esquerda e direita, nem do nós contra eles, e muito menos da busca de polarização forçada, coisas, especialmente essa última, que as redes sociais têm feito muito bem.

Por outro lado, é extremamente necessário adiantarmos a muito atrasada discussão sobre as transparências, obrigações e responsabilidades das redes sociais, de forma madura, e como praticamente todo o mundo democrático já está fazendo. Isso não quer dizer que chagaremos logo a uma solução e nem que será perfeita. Mas algo, indiscutivelmente, deve ser feito neste sentido.

O PL das fake news e o Senado norte-americano.

No Brasil, há uma discussão enviesada que está nublando a visão de muitos locutores: o fato do projeto de lei sobre o tema ter recebido a alcunha de PL das fake news. Praticamente nada trata de fake news. É uma semântica equivocada decorrente da ideia inicial da discussão, totalmente remodelada ao longo dos debates.

Dúvida sobre isso? Recomendo que o leia para não passar vergonha em alguma roda de conversa de amigos.

Ainda assim, se não estiver convencido da importância desta discussão, outra recomendação: assista à recente audiência pública no Senado dos EUA sobre a responsabilidade das plataformas de redes sociais em relação a crimes cometidos contra crianças e adolescentes. Estavam presentes representantes da Meta, TikTok, Snap, X (Twitter) e Discord. É importante destacar que senadores dos dois partidos que compõem o Congresso norte-americano são a favor de mais transparência, responsabilidade e regulamentação.

Entendo, porém, se você não estiver disposto a assistir toda a audiência. Mas encontrará facilmente na internet, ou aqui no meu Instagram, o pedido de desculpas de Mark Zuckerberg, da Meta (dona do Facebook e Instagram) pelos males causados aos filhos das pessoas presentes na audiência. E ele não foi o único a se dirigir a esses pais que viram a vida de seus filhos se tornarem um inferno ou mesmo que perderam seus filhos.

Tantos números.

Ainda há os números, ah!, os números, e as informações. Elenquei apenas alguns poucos dados para você, leitor, ter a dimensão do que está em jogo. E é só a ponta do iceberg:

16% de crianças e adolescentes entre 11 a 17 anos já receberam mensagens com conteúdo sexual na internet;
9% nesta mesma faixa etária já tiveram pessoas pedindo foto ou vídeo seus sem roupa;
denúncias de imagens de abuso e de exploração sexual infantil na internet cresceram 84% em 2023 em relação a 2022;
foi comprovado que a direção da Meta (ou o próprio Zuckerberg) barrou repetidamente iniciativas para resguardar a saúde mental de crianças e adolescentes;
é público que cibercriminosos se aproveitam da vulnerabilidade proposital das redes sociais para praticar graves crimes contra crianças e adolescentes;
há notícias cada vez mais frequentes de adolescentes que cometem suicídio por situações ocorridas nas redes sociais;
está se confirmando documentalmente que as plataformas agem com o intuito de viciar seus usuários, e usa diversos mecanismos para isso, de algoritmos à tela infinita, entre outros.

Outros dados que não podem passar em branco: nos EUA, 40 Estados entraram com ações contra plataformas de redes sociais pelos vícios e transtornos que estão causando a crianças e adolescentes, nos moldes da indústria do tabaco décadas atrás; e mais de 30 países já regulamentaram ou estão em processo adiantado de regulamentação das redes sociais sem colocar em risco a liberdade de expressão. O mundo todo discute isso atualmente.

Por fim, mas não menos importante: os algoritmos das plataformas de redes sociais buscam deixar as pessoas cada vez mais tempo nas suas páginas infinitas. E isso significa muito, mas muito dinheiro para elas! Entende, agora, por que elas são tão contra regulamentações?

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Raphael Rocha Lopes

Advogado, autor, professor e palestrante focado na transformação digital da sociedade. Especializado em Direito Civil e atuante no Direito Digital e Empresarial, Raphael Rocha Lopes versa sobre as consequências da transformação digital no comportamento da sociedade e no direito digital. É professor da Faculdade de Direito do Centro Universitário Católica Santa Catarina e membro da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs.