“Quando a proeminência asnática das orelhas caracteriza a conduta”

Por: Nelson Luiz Pereira

13/09/2019 - 09:09 - Atualizada em: 13/09/2019 - 09:32

Testemunhei, recentemente, uma cena repugnante de intolerância e desrespeito contra animais. Ao reduzir a velocidade e acionar o pisca de alerta para permitir que um pequeno cão atravessasse a autovia, um elemento que vinha em sentido contrário acelerou e arremessou, deliberadamente, seu veículo na tentativa, frustrada, de atingir o animalzinho, já no acostamento. Infelizmente não consegui flagrar a placa do acéfalo. De soslaio notei, entretanto, a proeminência de suas asnáticas orelhas.

Admiro quem possui animais de estimação com responsabilidade, estrutura, respeito e afeto. É um fenômeno mundial da nova sociedade humana. Na contramão desse fenômeno, vem os que matam e maltratam os bichinhos. Esses sustentam o argumento raso de que no Brasil o número de pets que convivem com as famílias supera o de crianças até doze anos. Proclamam que as taxas de natalidade mostram que há mais pets do que crianças nos berços. Justificam que se há, em média, 1,6 crianças por família, essa proporção com animais de estimação já passa de 2,0 por domicílio. Eu diria a esses: se a análise é tão determinista assim, teríamos, então, por outro lado, menos crianças passando fome, não é?

Ocorre que nosso perfil de sociedade majoritariamente conservadora, que vê como pecado o sexo fora do contexto da procriação, não tolera que o número de animais de estimação tenha suplantado o de crianças. Não admitem que passamos a ter uma relação mais estreita com os bichinhos e, por conseguinte, uma extensão do princípio de igualdade. Tampouco entendem a simples equação de que: (+) bichinhos (–) humanos (=) mais paz no mundo.

Já não se aceita mais ‘lorotas’ como: “é apenas um animal”, ou, “os animais não tem sentimentos como os seres humanos”. Oras, é justamente por serem animais e não terem os mesmos sentimentos dos humanos que merecem ter assegurados seus direitos fundamentais. Também já não servem argumentos como: “dá-se maior atenção aos animais do que aos humanos”. Ué? que bom que assim seja, afinal, quem é mais vulnerável e vitimado entre os dois?

Penso que estamos muito próximos do que profetizara o gênio Da Vinci: “chegará o dia em que um crime contra um animal será considerado um crime contra a própria humanidade”. Teríamos avançado mais um degrau em nossa condição de humanos. Por ora, não passamos de principiantes diante do legado do sensível Kant: “podemos julgar o coração de um homem pela forma como ele trata os animais.” Eu acrescentaria: e ao que maltrata, deveríamos penalizá-lo enjaulando-o.

Esses seres que nos ensinam a difícil virtude da fidelidade são dignos de respeito e aconchego familiar sim, pois, se não somos iguais na forma, somos iguais no medo, na fome e na dor. Respeito aos animais é premissa de sociedades evoluídas.