Plínio e Adamastor estão almoçando numa churrascaria que serve espeto corrido. A dupla já comeu costela bovina, costela suína, cupim, picanha, frango enrolado no bacon, queijo coalho, coração de frango e mais uma porção de tipos de carne.
Adamastor, não aguentando mais comer nem mesmo uma asinha de galinha, se estica na cadeira, dá dois tapinhas na barriga e diz:
– Já alimentei minha solitária. Ufa! Comi como um touro.
– Que nada, Adamastor. Touro só come capim, come aí, se você comer um quilo ou cem gramas, o preço é o mesmo. Tem que aproveitar.
– Não, não. Pra mim chega. Nem posso abusar, meu colesterol está um pouco alterado, não quero ter um ataque cardíaco do coração.
– Como?
– Um ataque cardíaco do coração, por causa do colesterol. Muita gordura. Tem que cuidar.
– Adamastor, um ataque cardíaco só pode ser do coração.
– Então? O que eu falei? “Ataque cardíaco do coração”, animal.
– Eu sei que você disse isso, cabeção. Você não precisa dizer que o ataque cardíaco é o coração.
– Ah é? Quer que eu diga que vou ter um ataque cardíaco do pulmão?
– Não. Cardíaco é do coração, Adamastor. Não precisa ser dito. Isso se chama pleonasmo. É um pleonasmo vicioso.
– Não, Plínio. Eu não sou viciado em pleonasmo. O meu colesterol só está um pouco alto. Você acha que sou viciado em pleonasmo? Não fico me enchendo de remédios.
– Pô, mas é burro! Pleonasmo é um erro gramatical. Não é uma droga.
– Gramática? Você tá falando de gramática?
– Sim. É gramática! Pleonasmo é um erro gramatical.
– Como você pode ser assim?
– Assim como?
– Assim. Todo preocupado com a gramática. Eu aqui, temendo um ataque cardíaco do coração e você pensando em gramática? Pensei que você fosse meu amigo.
– Eu sou.
– Escute aqui, “professor Pasquale”, eu não to nem aí pra sua gramática. Ninguém quer saber da sua gramática. Na era da hashtag, o negócio é se comunicar. Ninguém liga se você escreve direito. Aliás, nem gosto muito de ter amigo que escreve tudo certinho, cheio de ponto e vírgula. Fica se passando no feice. Acha que é melhor que os outros, só por que usa ponto final?
– Cara, deixa disso, só quis te fazer um favor, para que você fale corretamente. Para não cometer erros tão grosseiros.
– Grosseiro? Tá me chamando de ignorante? Tá louco da cabeça, meu?
– Eu desisto. Vou pegar sobremesa.
10/09/2016 - 04:09