No mundo do marceneiro José não havia espaço para o luxo. Nem ele queria. Era um mundo simples, modesto e discreto, como ele. A honestidade, a dedicação ao trabalho e o bom coração eram as características que mais se associavam a José. Podia perguntar para qualquer um que o conhecia.
Para José, a família sempre vinha em primeiro lugar. Se sacrificou para sustentar a mulher e os dois filhos, que a duras penas fez estudar em escola particular, e depois para cuidar dos netos, que sempre levava para passear. Gostava do peixe defumado, aquele do vendedor do balaio, que trazia o produto ainda quente, envolto em panos de prato alvíssimos. Apreciava também os licores caseiros, que ele tomava em minúsculas doses, só para sentir o gostinho…
Quando tomava o café reforçado da noite e ficava pensativo, girava a colher no sentido horário, como um carrossel, com o olhar fixo em um ponto à frente. Tinha um pequeno galinheiro, no fundo do quintal, e uma cachorra chamada Bela.
Pode parecer um absurdo nos dias de hoje, quando a ânsia de “subir na vida” e a competitividade é estimulada já nos primeiros anos de vida, mas ele mesmo reconhecia que não tinha ambição. Certa vez foi duramente criticado por isso, mas a verdade é que para ele existiam valores muito mais importantes do que valores econômicos. Até que tentou empreender no ramo de funerária com um sócio, mas, definitivamente, negociar não era o forte dele…
E se alguém perguntasse qual o lugar que mais gostava de ficar, ele com certeza diria que era no galpão, nos fundos da casa, onde mantinha algumas ferramentas do ofício e alguns pedaços de madeira. O cheiro característico do pó de madeira imprengnava todo o espaço, onde o opa José literalmente se sentia em casa. Lá ele criava caixinhas e pequenos objetos que faziam a alegria dos netinhos. Eles se admiravam pelo fato do avô ter fabricado todos os móveis da casa…
Mesmo quando José chegava cansado da marcenaria onde trabalhava, soltando aquele longo suspiro ao entrar pelo portão, tinha sempre um sorriso para os pequenos. As mãos calejadas pela aspereza da madeira, pelo uso da plaina, do serrote e do martelo, nesse momento proporcionavam um abraço macio e reconfortante.
O tempo foi passando, os netos cresceram e um dia aquele vovô querido por todos adoeceu e se foi para outra esfera. E quando me perguntam onde penso que ele está, sempre respondo, sem pestanejar:
– Ele deve estar em uma grande marcenaria, conferindo a chegada das madeiras e dos materiais, a quantidade de pregos, parafusos, colas, lixas, óleos e vernizes. O imagino circulando por entre as fileiras de trabalhadores na feitura dos móveis, olhando cada detalhe, sentindo o aroma característico das madeiras nobres, distribuindo sorrisos e elogiando o exímio esforço laboral dos colegas. Essa era a vida dele aqui. Deve ser lá também, como no sonho que ele me contou, quando eu ainda era uma menina.