Movências

Por: Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

18/10/2024 - 16:10 - Atualizada em: 18/10/2024 - 16:26

A infância na cidade pequena permitia-nos ir para a escola da cidade caminhando ou pedalando. De sandália de dedo, conguinha, tênis, bota, tanto faz. Sentíamos o ar puro da vida. No inverno, a brincadeira massa era soltar “fumacinha” pela boca e fingir que fumávamos. O frio era grande, mas estávamos aquecidos pela companhia e pelas risadas uns dos outros.

De lanche, levávamos frutas, sanduíches ou comíamos na cantina da Zorilca e do Tarcísio, ou na escola mesmo. Algumas sextas-feiras ganhávamos pão com mortadela e nescau ou suco de uva. Delícia! A fila era quilométrica, assim como nosso apetite e vontade de brincar. Algumas vezes, confesso que menti. Escondia o meu lanche e voltava à fila para pegar outro! Rsss Acredito que a Neusa (que nos entregava o lanche) sabia de tudo e também se calava!

Estudávamos todos juntos: filhos de profissionais de diferentes áreas – do médico, do farmacêutico, do prefeito, do professor, da merendeira, da faxineira, da dona da papelaria, do açougue, da padaria, do policial, do marceneiro etc. Naqueles bancos escolares usávamos o mesmo uniforme, tínhamos materiais semelhantes e recebíamos o dentista e a enfermeira para realizar alguma vacinação específica na escola. Seguíamos iguais na desigualdade, sendo educados na diversidade.

Os tempos são outros; os alunos também. Percebi que ainda levam lanche, porém creio que não gostam de pão com mortadela e nescau ou suco de uva, como a gente gostava (ou nem se dava conta). Todavia, há algo em comum entre nós ainda: somos seres humanos – apesar de já estarmos convivendo com a IA, seres não humanos (o que não existia naquela época não tão distante – anos 80 e 90).

Os professores ainda exercem a profissão por amor, contudo algo não mudou… Eles precisam ser bem remunerados, afinal, carecem pagar prestações, aluguel ou a casa própria, comer, beber, se vestir, ter um computador, um celular e momentos de lazer (sim!), uma vez que: “a gente [ser humano] quer comida, diversão e arte”.

Carecemos (re)pensar maneiras de mover a realidade educacional baseados nos alicerces da escola, a fim de que, por meio de movimentos críticos, incorporemos uma educação de qualidade social emancipatória, uma vez que ainda estejamos imersos em contextos sociais que produzam desigualdades. Portanto, a valorização e o reconhecimento dos professores na sociedade são vitais, a fim de que o envolvimento e compromisso com reflexões e ações reverberem transformações. Desse modo, o (des)aprender e o (re)aprender tornam-se caminhos a serem percorridos, dando luz a obstáculos e adversidades encontradas no mundo real para, a partir desse ponto nodal, intervirmos com criticidade.

Vivemos tempos em que muitas certezas estão sendo postas em xeque, imersos em um planeta em risco, que sofre por conta de problemas ecológicos, fobias sociais e outros. Vivemos tempos de incertezas e não há como se abster ou não se envolver com essas questões… Impossível.

Temos uma comum intersecção: nos unir em prol da educação. Sem educação de qualidade não adiantarão armas, visto que armarmo-nos de educação, conhecimento, leitura, confiança, amor, sonhos e atitudes é o que nos ajudará a construir um mundo mais humano – tão “desumano” hoje em dia.

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Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

Doutoranda em Linguística pela UFSC, atua como professora de Língua Portuguesa e Redação e escritora, membro da Academia Desterrense de Literatura, ocupante da cadeira 6. É autora de livros e artigos na área da Língua Portuguesa, Literatura e Educação.