Moraes investigará Lula? – Deltan Dallagnol

Foto: Divulgação

Por: Deltan Dallagnol

05/08/2023 - 07:08 - Atualizada em: 05/08/2023 - 10:40

Nesta semana, o Presidente Lula, em seu videocast intitulado “Conversa com o Presidente”, atacou mais uma vez a Lava Jato. O ataque começou assim: “Eu sempre fui uma pessoa que tive o mais profundo respeito ao Ministério Público. Era uma das instituições que eu mais idolatrava nesse país. Depois dessa quadrilha que o Dallagnol montou, eu perdi muita confiança.”

Assim, o Ministério Público era idolatrado por Lula enquanto investigava a corrupção dos outros, mas virou algoz ao investigar ele e seus aliados. Isso explica a vingança promovida no governo Lula contra quem trabalhou na Lava Jato.

Ao se referir à força-tarefa da Lava Jato como uma quadrilha, Lula tenta isolar o trabalho da Lava Jato num pequeno grupo de pessoas, quando foi um trabalho de mais de quarenta membros do Ministério Público, dezenas de policiais, auditores, analistas, técnicos, juízes e ministros.

Não é demais lembrar que Lula foi condenado na primeira ação por Moro e na segunda pela juíza Gabriela Hardt; que sua primeira condenação foi mantida de modo unânime no tribunal por uma turma de três desembargadores e, na segunda ação, pela mesma turma após sua mudança, com a troca de um dos seus integrantes; e que sua primeira condenação foi mantida no STJ por quatro ministros.

Em cada uma dessas instâncias os membros do Ministério Público defenderam a condenação de Lula pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro que somavam dezenas de milhões de reais. A Lava Jato foi um grande trabalho institucional.

Assim, Lula ataca as instituições democráticas. Por muito menos tem gente sendo investigada pelo STF e presa. Como se trata de crime relacionado às funções presidenciais, que não é abrangido pela imunidade presidencial, certamente o ministro Alexandre de Moraes já determinou a instauração de um inquérito.

Ironia à parte, não me preocupa que o Ministério Público tenha perdido a confiança de Lula. Eu me preocuparia se fosse o contrário. Veja bem em quem Lula tem confiança: mais de um terço dos ministros de Lula já foram investigados ou estiveram debaixo de acusações. Lula confia em pessoas como José Dirceu, condenado no Mensalão e Lava Jato.

O ataque de Lula à Lava Jato seguiu em alto tom: “Eu perdi [a confiança no Ministério Público] porque é um bando de aloprados, que acharam que poderiam tomar o poder. Estavam atacando todo mundo ao mesmo tempo, atacaram Governo, atacando Poder Executivo, atacando Poder Legislativo, atacando Suprema Corte, atacando todo mundo.”

Em seu malabarismo, Lula inverte o jogo: não é a corrupção que ataca as instituições. Também não é seu ataque aos agentes da lei que erode as instituições. O que mina as instituições, veja só, é o combate à corrupção. Tudo parece invertido no Brasil.

Entretanto, talvez haja alguma verdade aí: o sistema institucional ficou tão podre, tão corrupto, que se tornou impossível investigar e punir a corrupção no Brasil sem atingir um grande número de poderosos. Por outro lado, Lula está errado ao supor que isso é um ataque às instituições. Pelo contrário, é uma defesa das instituições contra quem as cooptou para praticar crimes.

Na leitura de Lula, ainda, a Lava Jato alcançou não só o governo e o Congresso, mas estava chegando ao STF. Gostaria de entender melhor a visão do presidente: será que, para ele, isso foi um fator fundamental para que o Supremo, que antes estava “acovardado”, nas palavras do próprio Lula, mudasse de visão sobre a investigação?

Lula finalizou assim seu ataque: “Eles [Dallagnol e sua quadrilha] fizeram a sociedade brasileira refém durante muito tempo.”

Aqui preciso concordar em parte com Lula: a sociedade brasileira foi realmente refém de uma quadrilha por muito tempo. Contudo, não é da Lava Jato que ficou refém e sim daqueles que saquearam a Petrobras e o Brasil por décadas, esses sim, na verdade, comprovadamente, uma quadrilha.

A verdade é que a operação revelou um mar de lama que estava debaixo dos tapetes do poder, e mostrou ao povo brasileiro que a corrupção não é uma fatalidade, mas sim uma prática criminosa que pode e deve ser combatida.

A fala de Lula não surpreende, afinal, sobre a Lava Jato, Lula, como um dos principais condenados nas apurações, ele não poderia falar a verdade. Por isso, ele segue tentando criar a narrativa de que seus crimes não ocorreram, com base na anulação – e não absolvição – realizada pelo STF.

Ao invés de encarar a situação com humildade e admitir seus erros, Lula prefere atacar a Lava Jato e sua equipe. Em seu governo, os agentes da lei são perseguidos, pagando, hoje, pelos acertos da operação, e não por eventuais erros. O grande crime da Lava Jato foi, diga-se francamente, incomodar aqueles que estão no comando do jogo político no país. O que precisamos fazer é virar esse jogo.