Impulsos de amor

Foto: Pixabay

Por: Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

16/08/2024 - 18:08 - Atualizada em: 16/08/2024 - 18:32

Querido Diário,

Estamos em agosto de 2024.

No último domingo, segundo do mês foi o Dia dos Pais. Alguns se recusam a comemorar datas do calendário, mas fato é que o dia dos pais tem um simbolismo ainda maior após a partida do meu pai desta vida terrena. Tive fortes e boas emoções com meus filhos e meu marido – que, aliás, diga-se de passagem, é um pai presente e amoroso.

Estávamos desfrutando de um fim de dia belíssimo (de sol e frio) de inverno, brincando com as crianças na área verde do nosso condomínio. Meu marido estava jogando futebol com nosso filho e os meninos e, eu, fui convidada pela minha filha a brincar no balanço.

Lá estávamos interagindo, quando ela gritou ao papai: – “Papai, papai olha só eu no balanço! Viu que alto?! Eu pedi pra mamãe me dar um impulso só no comecinho!”. “E eu consegui!” “Olha que alto!”

Ela bradou em tão alto e bom som que soou parecido com aqueles anúncios publicitários que encontramos por aí:

ATENÇÃO: Vendem-se “impulsos de amor”!

O preço é atenção e acolhimento e o retorno imediato são crianças felizes, curiosas, corajosas e que se jogam ao acontecimento!

Neste exato momento, meu coração transbordou de amor e meus olhos marejaram.

O que ela queria era que eu estivesse ali, dando apoio moral, carinho, motivação e demonstrando confiança nela, pois ela já domina a técnica de se balançar no balanço. E além de estar orgulhosa consigo mesma e se divertindo, quis compartilhar a sua grande conquista com o papai.

Entendi tanto com isso. Meu pai faleceu há 3 anos e eu já não sou mais criança. No entanto, ainda sinto desejo de tê-lo ao meu lado para, pelo menos, me impulsionar “no comecinho” de tantos voos árduos que encontro pelo caminho e/ou compartilhar tantos voos altos, lindos e leves que já alcei e sigo alçando. Já li por aí que “voar começa no chão”! Nada melhor do que alçarmos voo e saber que podemos voltar ao chão; às raízes, embora essas raízes e essa base familiar tão significativa, expressiva e essencial não sejam mais palpáveis fisicamente…

Hoje, “meu balançar” e “meus voos” são diferentes desse que acabei de relatar, envolvendo a minha filha. Preciso “dar inúmeros impulsos” diariamente ante às dificuldades da vida real: impulsos na saúde física, mental e emocional; na carreira; perante os obstáculos de relacionamentos interpessoais e no núcleo familiar; diante do ânimo diário referente à construção matrimonial; impulso na criação e educação dos filhos; e, até mesmo, impulsos quanto às árduas batalhas que incluem as perdas, as doenças e outros muitos conflitos que nos afetam, angustiam, entristecem e atormentam.

Em certas ocasiões, meus impulsos transformam-se em tropeços e precipitações… Recordo-me, portanto, que o gesto de amor de ser acolhida pelo meu pai e de ver minha filha sendo amparada também quando pede para “dar um impulso só no comecinho” é o que caracteriza a confiança e a certeza de conseguir chegar até o alto para saborear o misterioso e doce aroma do vento, da vista, do deleite e da conquista.

Desconheço os tipos de impulsos que eu, tu, você, a gente, nós teremos pela frente, mas, brincando com as palavras em alusão ao poema “Insignificâncias” de Manoel de Barros, entendo que “a palavra amor não pode andar vazia. Tem gente dentro dela. Melhor ser do que entender”. Melhor ser do que parecer. Melhor ser. Amor. Abrigo. Sustentação. Nutrição. Impulso. Pra mim, pra ti, pra você, pra gente, pra nós todos.

Batimentos…

Tum-tum-tum

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Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

Doutoranda em Linguística pela UFSC, atua como professora de Língua Portuguesa e Redação e escritora, membro da Academia Desterrense de Literatura, ocupante da cadeira 6. É autora de livros e artigos na área da Língua Portuguesa, Literatura e Educação.