Na última quinta-feira, ensaiei, no Twitter, uma aposta com meus seguidores: lembrei que no dia seguinte o plenário virtual do Supremo julgaria uma liminar do ministro Gilmar Mendes que havia suspendido a tramitação do inquérito da Operação Hefesto, a mais recente (e fracassada) investigação da Polícia Federal contra o presidente da Câmara, Arthur Lira. Numa enquete, perguntei: o STF vai blindar Lira e anular as provas contra ele ou vai autorizar o prosseguimento da operação?
Em pouco tempo, 92,4% das pessoas responderam que o STF iria blindar Lira, enquanto apenas 7,6% expressaram confiança de que o STF iria seguir sua própria jurisprudência e validar a investigação da Polícia Federal. Cerca de 30 minutos depois, no entanto, a questão já estava resolvida: o ministro Gilmar Mendes voltou atrás em sua própria decisão de mandar o caso para o plenário virtual e anulou, sozinho, todas as provas da operação Hefesto contra Lira, o que significa dizer, na prática, que Lira não poderá mais ser investigado.
O que a decisão de Gilmar fez, na realidade, foi impedir que a população de Alagoas saiba a verdade sobre desvios de R$ 8 milhões ocorridos entre 2019 e 2022 na compra de kits de robóticas para mais de 40 municípios do Estado, com verbas do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação. Impediu, também, os brasileiros de saber se os pagamentos identificados pela Polícia Federal de cerca de R$ 1 milhão para “Arthur” referiam-se a Arthur Lira, e se o dinheiro da educação das crianças alagoanas foi desviado justamente para custear despesas do presidente da Câmara e sua família, em um aparentemente complexo esquema de lavagem de dinheiro.
Infelizmente, esta não foi a primeira vez que Gilmar Mendes proibiu que a sociedade soubesse a verdade sobre outras possíveis irregularidades em que Arthur Lira estivesse metido: anteriormente, o ministro do STF já havia suspendido, e depois encerrado, três ações de improbidade da Lava Jato contra Lira. A decisão foi sem precedentes, já que o ministro, além de suspender o trâmite dos processos, também decretou segredo de justiça, o que não encontra qualquer amparo legal, já que ações de improbidade tratam de ações públicas de agentes públicos e a regra, em processos do tipo, é a publicidade.
Com esse histórico, causa alguma surpresa o fato de que 92,4% dos internautas que responderam a minha enquete tenham demonstrado total descrença na capacidade do STF de responsabilizar Lira? A surpresa real, talvez, esteja no fato de que esse número não tenha sido ainda maior, dado o histórico de impunidade que Lira, o intocável, detém junto à Suprema Corte. Talvez a lição que podemos extrair desse novo caso de fracasso da Justiça brasileira seja apenas essa: de que em terra de Gilmar, Arthur Lira é rei.