“♫ Brigo eu você briga também/ Por coisas tão banais/ E o amor em momentos assim/ Morre um pouquinho mais/ E ao morrer então é que se vê/ Que quem morreu fui eu e foi você/ Pois sem amor estamos sós/ Morremos nós” (Brigas; Cauby Peixoto)
Na realidade, como no ano passado, não é exatamente uma palavra, mas uma expressão.
A Oxford escolheu rage bait, e não por acaso. Em tradução livre, trata-se de qualquer conteúdo criado para provocar indignação, gerar cliques impulsivos e acender discussões inflamadas nas redes. É a estratégia da isca emocional: uma manchete exagerada, uma opinião calculadamente absurda, um vídeo distorcido, uma afirmação feita apenas para irritar. Não importa se é verdadeiro, relevante ou mesmo sensato; importa apenas que provoque. E, no ambiente digital atual, provocar dá lucro. Dá dinheiro para alguém!
Lógica perversa
O que está por trás disso é simples: a economia da atenção foi capturada pela economia da irritação. Plataformas que dependem de engajamento perceberam que poucos estímulos prendem tanto quanto a raiva. Diante de uma timeline disputada por milhões de vozes, um conteúdo tranquilo pode passar despercebido, mas um conteúdo capaz de despertar fúria se espalha como incêndio em palha seca. A lógica é perversa, mas eficiente: quanto mais as pessoas brigam, mais tempo passam on-line; quanto mais tempo on-line, mais anúncios são exibidos; quanto mais anúncios, maior o faturamento. Com isso, quem se beneficia?
Influenciadores descobriram que polêmica dá mais retorno do que profundidade. Canais que cresceram transformando qualquer nuance em guerra cultural. Plataformas que assistem, de camarote, ao aumento de tráfego alimentado pela discórdia.
Prejuízo coletivo
O prejuízo, porém, é coletivo. O rage bait empobrece o debate público, cria bolhas emocionais, acelera a disseminação de notícias falsas e treina nosso cérebro para reagir antes de pensar. Aos poucos, a raiva vira um produto de consumo rápido. Exitamos cada vez menos, refletimos cada vez menos, e clicamos cada vez mais.
Mas existe saída. Só que exige esforço e consciência. Passa por não recompensar a isca, por reconhecer quando estamos sendo manipulados e por entender que nem toda postagem absurda merece resposta. Passa também por valorizar criadores que constroem diálogo, não incêndios. E, sobretudo, por lembrar que a raiva constante não é natural: é fabricada, calibrada e distribuída em escala industrial.
Se a expressão do ano é rage bait, talvez o aprendizado do ano devesse ser outro: a atenção é o nosso bem mais valioso e precisamos protegê-la de quem tenta comprá-la ao preço da nossa indignação diária.