O ministro Alexandre de Moraes interrompeu seu descanso durante o fim de semana para atacar, de forma truculenta, o portal de notícias UOL, depois que a jornalista Carolina Brígido publicou uma matéria com o título “Defesa matou chance de Bolsonaro concorrer em 2026, dizem ministros do TSE”. Na matéria, ministros do TSE teriam afirmado à jornalista que os advogados de Bolsonaro escolheram a estratégia de defesa errada ao recorrer diretamente ao Supremo, em vez de apresentar recursos sucessivos no próprio TSE até 2026, quando a composição do tribunal seria mais “favorável” a Bolsonaro.
A composição mais “favorável” mencionada pela jornalista se refere ao fato de que, em 2026, o presidente do TSE será o ministro Nunes Marques, indicado pelo próprio Bolsonaro, e o vice-presidente da corte será André Mendonça, também indicado por Bolsonaro. Mas por que será que Alexandre de Moraes se irritou com a matéria do UOL, a ponto de dizer que a jornalista fabricou a notícia, e inventou “fatos e versões”? Ora, é muito simples. É porque o UOL expôs algo que todo mundo já sabe: as decisões do TSE são políticas, e não jurídicas, e divulgar isso para o mundo é um baita constrangimento para Alexandre de Moraes, que prefere manter o teatrinho de que o TSE julga os casos de acordo com a lei.
Ao dizer que a defesa de Bolsonaro deveria apresentar um recurso atrás do outro até que haja uma “composição mais favorável” do Plenário, os ministros do TSE admitem que a corte não julga de acordo com fatos, provas e lei, mas de acordo com os ventos da política e do poder. Afinal, se a lei ampara Bolsonaro agora, e se os juízes são isentos e imparciais, então Bolsonaro deveria vencer seu processo agora, e não no futuro a depender de uma “composição mais favorável”. Por outro lado, se Bolsonaro fosse culpado, sua condenação deveria subsistir tanto agora como no futuro.
Quando se juntam as fragilidades técnicas da condenação de Bolsonaro com as evidências da atuação política do TSE, conclui-se que Bolsonaro perdeu os processos movidos contra ele, sendo condenado à inelegibilidade, por razões políticas. E isso é tão grave que o ministro reagiu contra o UOL com suas armas de sempre: chamando a notícia como “fake news”, conceito que tem sido deturpado e manipulado com frequência para calar as críticas feitas contra o governo e os tribunais. É o que aconteceu recentemente em relação às críticas à incompetência do governo federal em gerenciar a tragédia gaúcha.
Mas voltemos à matéria do UOL: os ministros do TSE, ao comentarem a estratégia da defesa de Bolsonaro publicamente, cometeram uma falta ética gravíssima. Primeiro, porque comentaram casos que estão julgando, o que é proibido pela lei da magistratura – algo aliás que Gilmar Mendes faz com frequência. Contudo, neste caso fizeram algo mais grave ainda: deram opinião sobre a estratégia de defesa do réu ser boa ou ruim, aconselhando qual seria a melhor maneira de ganhar o processo. Some-se que a recomendação feita pelos ministros foi a da litigância de má-fé e a do abuso de direito, já que sugeriram à defesa de Bolsonaro que apresentasse recursos sucessivos apenas para atrasar a conclusão do processo, algo simplesmente inacreditável.
Tanto os pitacos indesejados dos ministros do TSE como a reação exagerada de Moraes dão uma noção de como as nossas instituições estão apodrecidas, especialmente as do Judiciário, que foram infestadas pela política. Os ministros deixaram de ser juízes para se tornarem políticos de toga, e nem fazem mais questão de esconder isso ou manter qualquer aparência de decoro e de correção ética, a ponto de comentarem publicamente estratégias de defesa do réu. Algo bom, ao menos, veio de todo esse imbróglio: mais uma vez se escancara para a sociedade brasileira que, por trás das togas, escondem-se políticos com suas próprias ideologias e interesses.