Misoginia, redpill, Campari, internet e a violência contra as mulheres

Foto: isabella Quintana/Pixabay

Por: Raphael Rocha Lopes

07/03/2023 - 13:03 - Atualizada em: 07/03/2023 - 14:22

 

“♫ At first, I was afraid/ I was petrified/ Kept thinking I could never live without you by my side/ But then I spent so many nights thinking how you did me wrong/ And I grew Strong/ And I learned how to get along” (I will survive; Gloria Gaynor)

Inicio o texto de hoje com a frase do filósofo Umberto Eco que consegue resumir e explicar muita coisa: “As redes sociais deram voz a uma legião de imbecis”.

Repercutiu, poucas semanas atrás, o vídeo com comentários bizarros de um autointitulado coach redpill dizendo que jamais trocaria a sua dose de Campari por uma “breja” a pedido de uma mulher porque isso significaria que ela, a mulher, estaria tentando lhe moldar, tirar sua liberdade, entre outras besteiras.

REDPILL, INCEL MGTOW, novos nomes para misoginia

Na realidade, não sei nem como classificar tudo isso. Se são movimentos ou apenas grupos acéfalos tentando justificar o injustificável.

O pessoal redpill entende que, para confirmar sua virilidade, deve-se tornar as mulheres submissas, sem vez e sem voz. A expressão faz referência à pílula vermelha do filme Matrix, que daria consciência do mundo real, como forma de fugir da simulação em que se vive.

Incel são os celibatários involuntários (em inglês, INvoluntary CELibates), homens que se consideram heterossexuais, mas são incapazes de ter parceiras sexuais, e culpam os sexualmente ativos, independentemente da orientação sexual. Em outros tempos, eles seriam chamados simplesmente de frustrados.

MGTOW são os “homens seguindo seu próprio caminho” (em inglês, Man Going Their Own Way), que pregam que a sociedade foi contaminada pelo feminismo e acreditam que as mulheres são perigosas e manipuladoras. Supremacistas masculinos.

Todos esses grupos são misóginos e o grau de virulência e violência varia muito, mesmo dentro de cada uma destas comunidades (comunidades?). Alguns se escondem por baixo de perfis de aconselhamentos ou coaching de como os homens devem (des)tratar as mulheres e se impor contra o crescimento da força delas, colocando-as em “seu devido lugar”.

A internet e o crescimento da violência contra as mulheres

Esse tipo de gente sempre existiu: misóginos, homofóbicos, racistas. A internet apenas os conectou e, como disse Eco, lhes deu voz. Infelizmente, por razões que talvez Freud e Lacan explicariam, estão a contaminar muitas mentes fracas, dando corpo para seus movimentos.

O que não se pode esquecer é que o discurso de ódio das redes sociais contagia o mundo real, naturalizando-o. Não estão dissociados. E os dados confirmam isso. No Brasil, em pesquisa recente, mais de 33% das mulheres relataram já ter sofrido algum tipo de violência física ou sexual do parceiro e 43% violência psicológica, e quase metade delas não tem coragem de denunciar.

Além disso, tem a violência de gênero praticada por homens que não os parceiros, que só por sentirem “machos alfa” pensam que podem se impor contra qualquer mulher que passe na rua ou em seu ambiente de trabalho.

Ou seja, quando essas comunidades discriminatórias ganham voz, quem perde são as mulheres, nossas esposas, filhas, mães, irmãs, amigas. Não dá para compactuar com isso, e não dá para achar que é apenas bobagem de internet.

Como cantava Gloria Gaynor, no início dá medo, mas as mulheres são fortes o suficiente para aprender a se recompor e manter e aumentar o espaço que estão conquistando!

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Raphael Rocha Lopes

Advogado, autor, professor e palestrante focado na transformação digital da sociedade. Especializado em Direito Civil e atuante no Direito Digital e Empresarial, Raphael Rocha Lopes versa sobre as consequências da transformação digital no comportamento da sociedade e no direito digital. É professor da Faculdade de Direito do Centro Universitário Católica Santa Catarina e membro da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs.