“Intoxicação ideológica: uma crônica amarela”

Por: Nelson Luiz Pereira

16/10/2020 - 17:10 - Atualizada em: 16/10/2020 - 17:30

Num recente ‘chat with coffee’, um ‘caixa alta’, expressão usada por um brother colunista, assim me indagou: de que lado você é? Como assim? Você está se reportando a identidade de gênero? interpelei. Não, não, estou me referindo à cor. Hum… Matutei por alguns segundos, beberiquei o café, e retruquei: mas o que tem a ver cor com lado? Bem, é que se você me disser qual sua cor, eu saberei identificar qual seu lado. Matutei por mais alguns segundos, porém, já ciente de sua leviana curiosidade, e então resolvi me tornar mais obtuso que ele.

Brother, disse eu, minha cor preferida é amarela. Desde criança me identifico com amarelo. Minha flor preferida é girassol. Ah, a capa de meu próximo livro, um romance, será amarela. Ele tentou me atropelar e reconstruir a pergunta, mas o sufoquei emendando: a cor amarela significa otimismo, alegria, calor, descontração, prosperidade, felicidade, luz… Mais uma vez ele esboçou uma reação, e novamente o abafei, continuando: a cor amarela também é inspiradora. Ela estimula o raciocínio e desperta a criatividade e imaginação, mas também a dúvida. As inquietantes e expressivas pinceladas de Van Gogh, pintaram o mundo de amarelo, sabia? Para ele, o amarelo era uma cor capaz de encantar Deus.

Subitamente me dirigiu um gesto de ‘stop’ com a mão, ao que eu disparei: só para concluir… Apenas 6% dos seres humanos se identificam com a cor amarela, curioso né? Então, desencurralando-se foi enfático: cara, a cor que me refiro é a relacionada a partido ou ideologia política, entendeu? Ah entendi. Veja você: eu posso acrescentar um pouco de vermelho no amarelo e terei a cor laranja. Posso acrescentar azul e terei verde. Posso, também, misturar verde e vermelho e terei meu amarelo novamente. Consegues me enquadrar?

Percebi as têmporas dele avermelhadas ao pronunciar o binário cheque mate: você é de esquerda ou direita? Sou de direita, esquerda, centro, centro-direita, centro-esquerda, centro-direita-esquerdante, centro-esquerda-direitante. Mas minha cor dominante é a amarela. Ao que ele arrematou sobressaltado: eu detesto a cor amarela. Bem, disse eu, então você é um xantofóbico. Ao evadir-se bruscamente, fiquei pensando com meus botões: ‘ele amarelou’.