“Deus, ciência e o limbo”

Por: Nelson Luiz Pereira

02/02/2022 - 22:02 - Atualizada em: 02/02/2022 - 22:59

Minha particular percepção, ao observar o cenário bem de longe do ringue político ideológico extremista, é de que a fervura da ‘panela de pressão social,’ alimentada pelo tsunami da “pinoquiomania,” começou a assoviar. A nova variante Ômicron realimentou o fogo que tinha arrefecido ao final de 2021. Sua letalidade é baixa, mas o impacto na economia é alto, por comprometer a produtividade da mão de obra, que já é, naturalmente, baixa em situação saudável. Mesmo com a fervura intensificada, a válvula de escape segue expelindo o grosso vapor.

No entanto, pelo estágio da fervura, é muito provável que a válvula venha a sofrer um entupimento lá pelo meio do ano, por conta do calor eleitoral. O risco de a panela explodir será altíssimo. Não vou querer estar por perto. Por ora, resta digerir os mimizentos com a guerra da vacina. Por eu já ter sido internado com a covid, já ter contraído a H3N2, já ter completado o ciclo vacinal e, como se não bastasse, ser da imprensa, venho tomando o ‘elixir anti-bareja.’ Um santo remédio.

Nesse momento chato que vivemos, chego a imaginar que a imprensa deveria produzir um jornal para cada cidadão, com pauta personalizada. Ou seja, a redação consultaria, previamente, cada mimizento, sobre o que ele acredita e espera ler. Tenho recebido diariamente em meus canais, inbox, conteúdos amealhados de teóricos da conspiração, das mais variadas estirpes, para que sejam publicados no jornal como serviço à população. Como é delicado explicar que aquele conteúdo não serve, sem arranhar a amizade.

Como é difícil incutir na cachola desses mimizentos, o que ouvi de um professor amigo: “antes de estudos formulados por autores ou grupos isolados, existe uma “Comunidade Científica” debruçada em pesquisas profundas, testes e comprovações, capacitada a absorver ou descartar essas teses isoladas.” Aqui com meus botões, deduzo que tudo se afunila em três dimensões: Deus, ciência e o limbo. Nesse conflito pró-vacina X antivacina, penso que a Comunidade Científica se assemelha àquela velha diligência passando na cidade. Enquanto ela passa, os cães latem.

A única variável em questão, é sua velocidade. Mas ela passa. Entretanto, devo confessar que meu milagroso elixir só não faz efeito quando me deparo com aqueles mimizentos antivacina, mas que se vacinaram por medo de morrer. Ou da amiga que não se vacinou alegando risco de sequelas, e foi infectada, intubada, exibindo agora, as reais sequelas numa cadeira de rodas. Não encontro categorias para enquadrar essa espécie, mas sei que habitam o limbo.