O que seria de nós não fosse a possibilidade de vivermos intensamente o autoengano? Autoengano, que conversa é essa? Autoengano, os enganos que criamos para nos anestesiar das pancadas da vida, criamos esses enganos consciente ou inconscientemente, não temos como escapar.
Quando se diz, por exemplo, que todas as famílias são iguais, aí pode haver um exagero, mas não um erro. Aquela história de suspirar por um pai tipo o da nossa colega costuma ser um engano. O sujeito pode até ser um belo pai, mas a mãe, a mulher dele, um diabo disfarçado. Ou vice-versa. Claro, pode ser um irmão, uma irmã…
Achamos que nossos amigos ganham bem mais que nós, são mais felizes que nós, têm um trabalho mais cômodo que o nosso, a empresa deles é mais humana etc., etc. Tudo engano ou autoengano, não queremos ver a verdade. E não ver a verdade pode produzir infelicidade, mau-humor. Sem falar que na outra empresa, a “melhor” que a nossa, há gente dando um dedo para trabalhar onde estamos…
O diacho é que não imaginamos que apesar de todos os nossos “problemas” haja quem nos inveje da cabeça aos sapatos. O ser humano é uma desgraça de contradições e equívocos.
Isso tudo sem falar que as coisas não são o que são; são, isso sim, o que fazemos delas, o que percebemos delas. Dizer que os olhos não enganam é engano, afinal, você já não ouviu dizer que o pior cego é o que não quer ver? O mundo é de cegos, de cegos da cabeça, das percepções equivocadas e das suas consequências.
Todas as famílias, todas, são um caso de polícia sem deixar de ser, e ao mesmo tempo, um caso psiquiátrico. Repito, todas. E nós aqui do lado de fora achando que só a nossa família é um caso sério, pobrezinha, às vezes nem tanto…
Os autoenganos fazem-nos bem até certo ponto, depois desse ponto é um crime que cometemos contra nós mesmos. Muitas vezes, leitora, somos bem mais ricos do que pensamos, bem mais felizes do que imaginamos. E essa riqueza, como a felicidade, vem de uma verdade que costumeiramente não vemos, mas que vamos ver muito bem quando perdermos algo extremamente valioso e que hoje nos passa despercebido. Aí, acordaremos. É bom ser esperto. As famílias dos outros não são melhores que as nossas, podes crer. Não raro, são bem piores. Mas eles disfarçam, e nós mordemos a isca. Burros.
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