“Embalo sem abalo”

Foto Arquivo Pexels

Por: Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

30/09/2021 - 14:09 - Atualizada em: 30/09/2021 - 14:45

Há algum tempo venho descobrindo a importância do movimento em minha vida… Tudo é movimento. E, se quisermos encontrar o equilíbrio, certamente teremos de nos mover, como quando andamos de bicicleta. As primeiras noções que temos do movimento de “balanço” são, seguramente, intrauterinas, quando ainda estamos submersos no “mar amniótico” da barriga de nossa mãe. Que lindo, não acham?! Talvez, por esse motivo, a maioria dos bebês sossega cada vez que é ninada no colinho aconchegante de quem os balança, em um ritmo aprazível.

E, assim, quanto mais o “embalador” permitir-se entregar ao balanço compassado e agradável para o bebê, mais tranquilo e “entregue” ele ficará. Por meio da tradição oral, já ouvi que muitos povos oriundos de áreas tropicais fabricavam balaios para colocarem seus bebês e balançarem, enquanto lidavam em suas jornadas, carregando-os. Balanços contínuos nos sucessivos dias, até que davam início a outras fases, como engatinhar e andar…

Em conversa com a Nona Thereza Perosso Brustolin – mulher admirável, nascida em 1921 e falecida em 2020, batalhadora e trabalhadora da lida no campo – contou-me que deixava seus filhos, ainda nenéns, em cestos na lavoura, a fim de estarem na companhia um do outro, enquanto os adultos trabalhavam. A hora do descanso para a mamãe consistia no momento precioso da amamentação. Assim, relatou-me ela, que gostava de amamentar seus filhos para descansar do trabalho pesado. Outros tempos…

Nos novos tempos, em 1985, a banda brasileira “Metrô” lançou “Tudo Pode Mudar”: “E no balanço das horas tudo pode mudar”. Bem, após alguns anos, costumamos apresentar “o balanço” às crianças para que elas se embalem sozinhas. E vamos combinar que elas costumam gostar muito do primeiro “balanço”, especialmente se estiverem na companhia de uma pessoa afetuosa e confiável que lhes permitam e garantam serem embaladas em um ritmo adequado e gostoso, uma vez que; conforme escreveram os compositores Marcelo Fromer, Antonio Bellotto e Arnaldo Filho, na letra “O Pulso”: “o pulso [ainda] pulsa”… E, consequentemente, a vida vibra: de dentro para fora e de fora para dentro…

Tecendo uma relação entre o significado do vocábulo “balanço” e a vida, observamos que a vida passa de maneira célere e, de repente, o presente torna-se passado – fato bem evidenciado durante esta pandemia do coronavírus – e, portanto, seguimos nos reinventando diariamente. A poetisa Cecília Meireles escreveu “Reinvenção” onde lemos: “não te encontro, não te alcanço… Só — no tempo equilibrada, desprendo-me do balanço que além do tempo me leva.”

Diante dessas razões, dia após dia, presenciamos que a dor pode tornar-se aprendizado e que tudo tem uma razão de ser. Dessa forma, o “balanço do tempo” prossegue e o relógio produz suas badaladas… As horas, os dias, os meses e os anos vão-se passando, concomitantemente aos fatos bons ou ruins. E, pouco a pouco, começamos a entender o porquê de algumas circunstâncias e/ou algumas consequências, bem como aprendemos a aceitar os desafios da vida e agradecer por eles.

“Bete Balanço” é nome de uma música que se tornou um dos maiores sucessos do “Barão Vermelho”, lançada em 1984. A melodia foi inspirada na batida funk dos “Rolling Stones” e se consagrou como uma das músicas de maior destaque da banda. Ao nos debruçarmos mais atentamente à letra, notamos que no verso: “Quem vem com tudo não cansa, Bete balança, meu amor, me avise quando for a hora”, o eu lírico traz uma ideia de que está tudo bem, basta seguir e somente avisá-lo assim que a hora chegar…

Desse modo, precisamos juntar as etapas entre o ir e vir do existir, visto que o balanço não foi feito para ficar parado! Então, quando a inércia quiser tomar posse (e o momento não se caracterizar só por um simples período de descanso), devemos nos lembrar de que o bom e velho balanço é aquele que está em constante movimento.

Portanto, que possamos nos permitir inclinarmo-nos para trás, esticarmos as pernas, dar pequenos e grandes saltos com os pés, olharmos para o alto, fecharmos os olhos (se preferirmos) e nos entregarmos por inteiro para o momento e para nós mesmos.

Ah, e na falta de um balanço ou de uma rede (que também cumpre essa função lindamente), sugiro colocarmos a música de nossa preferência e nos balançarmos com ela, de corpo e alma, com base nesta experiência lúdica do balanço, proporcionando-nos o embalo no colo da Vida!

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