Por Francine Sevignani
Jornalista e mãe atípica
Para pessoas que assim como eu cresceram ouvindo Belchior, lendo Castro Alves e até assistindo filmes de Woody Allen, perceber que o amor romântico pode vir muitas vezes disfarçado de controle e abusos, é uma tarefa difícil. Mas, a verdade é que no mês em que se celebra o Dia dos Namorados, o tema não poderia ser outro, afinal, precisamos deixar a romantização de lado e entender que o amor não machuca, não deixa marcas e não mata.
Segundo dados do Observatório da Violência Contra a Mulher de Santa Catarina, apenas em 2024, o Estado registrou 30.234 medidas protetivas e 51 feminicídios. Neste ano, de janeiro a abril, as medidas protetivas já somam 11.384 e 14 mulheres foram vítimas de feminícidios em Santa Catarina. Destas mortes, quatro mulheres eram esposas e quatro eram namoradas. A maioria tinha entre 15 e 49 anos. Uma realidade que assusta e que não pode ser ignorada, assim como os sinais que os próprios autores de agressão apresentam durante o relacionamento.
Para ilustrar bem, a Lei Maria da Penha (nº 11.340, de 07 de agosto de 2006) define cinco tipos de violência doméstica contra a mulher. São elas: violência física, psicológica, moral, sexual e patrimonial. E de certa forma, todas elas matam, aos poucos, ou “de repente”.
A diferença é que algumas violências são mais difíceis de serem identificadas, mais sutis e passam quase despercebidas. Precisei atuar na Procuradoria da Mulher da Câmara de Vereadores de Jaraguá do Sul para entender que eu mesma já havia passado por isso e que muitas amigas ainda estavam vivenciando essas violências. A violência psicológica, por exemplo, é a mais comum e uma das mais cruéis. Ela humilha, ridiculariza, chantageia, persegue, ameaça e proíbe. É tudo aquilo que causa dano emocional, que destrói a autoestima, a confiança, a vida da mulher. São falas e atitudes que fazem a mulher duvidar da própria sanidade, muitas vezes.
A moral é outra violência difícil de ser detectada. Define-se em qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. Um exemplo bem comum e covarde é acusar a mulher de traição, culpabilizando-a pelo término do relacionamento.
Já a violência sexual, diferente do que muitos pensam não se resume apenas a forçar relações sexuais. Proibir a mulher de usar método contraceptivo também é violência. Controlar o dinheiro, proibir de trabalhar ou arremessar o celular na parede durante uma discussão é violência patrimonial.
Todos os tipos de violência, igualmente, são crimes e causam danos à vida da mulher e de seus filhos, inclusive à vida do próprio autor de agressão. Por isso, tão importante quanto alertar e falar com as mulheres sobre violência é falar com os homens. Porque essa responsabilidade é deles. Nenhum homem é morto pelo simples fato de ser homem. Nós somos. Todos os dias.
Antes de amar, ame-se…
Claro que muitas vezes a busca pelo par perfeito, por amar e ser amada, por pressão da própria sociedade em não estar sozinha, nos cega e nos faz relevar situações que não deveriam ser toleradas.
É importante ficar atenta, entender que se o teu namorado te bate, te humilha, controla suas mensagens, te afasta dos teus amigos e da tua família, não é amor.
Se ele minimiza teus sentimentos, força relações sexuais, controla o seu dinheiro, te faz duvidar de si mesma, não é amor. É violência, é crime.
Não ignore o seu desconforto. Nunca começa com o feminicídio, mas pode terminar com ele.