Alguns críticos amigos, que acompanham minhas inquietudes nessa coluna semanal, gentilmente me solicitaram que eu republicasse uma irônica experiência vivenciada há dois anos. Com pequenas lapidadas, aqui está: “Num recente chat with coffee, um ‘caixa alta’ da Urbe, assim me indagou: de que lado você é? Como assim? Você está se reportando a identidade de gênero? interpelei. Não, não, estou me referindo à cor.
Hum… Matutei por alguns segundos, beberiquei o café, e retruquei: mas o que tem a ver cor com lado? Bem, é que se você me disser qual sua cor, eu saberei identificar qual seu lado. Matutei por mais alguns segundos, porém, já ciente de sua tendenciosa curiosidade, e então resolvi me tornar mais obtuso que ele. Brother, disse eu, minha cor preferida é amarela. Desde criança me identifico com amarelo. Minha flor preferida é girassol.
Ele tentou me atropelar e reconstruir a pergunta, mas o sufoquei emendando: você sabia que a cor amarela significa otimismo, alegria, calor, descontração, prosperidade, felicidade, luz? Mais uma vez ele esboçou uma reação, e novamente o abafei, continuando: a cor amarela também é inspiradora. Ela estimula o raciocínio e desperta a criatividade e imaginação, mas também a dúvida. As inquietantes e expressivas pinceladas de Van Gogh, pintaram o mundo de amarelo, sabia? Para ele, o amarelo era uma cor capaz de encantar Deus.
Subitamente me dirigiu um gesto de ‘stop’ com a mão, ao que eu disparei: só para concluir… Apenas 6% dos seres humanos se identificam com a cor amarela, curioso não? Então, desencurralando-se, foi enfático: cara, a cor que me refiro é a relacionada a partido ou ideologia política, sacou agora? Só quero saber se você é verde ou vermelho, poha.
Ah entendi. Então, preciso dizer a você que eu posso, nesse caso, misturar um pouco de vermelho ao amarelo e terei a cor laranja. Posso acrescentar azul e terei verde. Posso, também, misturar verde e vermelho e terei meu amarelo novamente. Consegues me enquadrar? Percebi as têmporas dele avermelhadas ao pronunciar o binário cheque mate: afinal, você é de esquerda ou de direita?
Ok, sou de direita, esquerda, centro, centro-direita, centro-esquerda, centro-direita-esquerdante, e centro-esquerda-direitante, mas, meu matiz é amarelo. Ao que ele arrematou sobressaltado: eu detesto a cor amarela. Bem, disse eu, então você é um xantofóbico. Ao evadir-se bruscamente, fiquei pensando com meus botões: ele amarelou”. Na ocasião, o título atribuído ao artigo foi: ‘Intoxicação ideológica: uma crônica amarela.’