Por Kamila Schneider e Verônica Lemus
Construir uma casa e abrir uma empresa podem parecer atividades muitos distintas, mas quando analisadas do ponto de vista do setor público, representam o mesmo interesse: o desenvolvimento econômico e social. Enquanto uma nova residência gera qualidade de vida e ajuda a ampliar a arrecadação de impostos de grande relevância, como o IPTU, uma nova empresa é fonte de emprego e renda para a população. São investimentos que fazem toda a diferença para o crescimento sustentável do município.
Mesmo assim, realizar estes investimentos ainda significa enfrentar, na maior parte dos casos, um verdadeiro calvário de burocracia e espera. De acordo com um estudo realizado pelo Banco Mundial, no Brasil são necessários em média 101 dias para abrir uma empresa, tempo 200 vezes mais demorado do que na Nova Zelândia, país mais bem classificado da pesquisa. Além disso, é preciso gastar 2.038 horas para organizar e pagar tributos no país, o que representa quase 85 dias gastos com burocracia.
A situação não é diferente em Jaraguá do Sul – diante da falta de informações e o excesso de obrigações legais, alguns empreendedores se viram obrigados a procurar outros municípios na tentativa de alcançar seus objetivos.
Para entender que tipo de dificuldades são enfrentadas diariamente pelos empreendedores e moradores de Jaraguá do Sul e também quais as iniciativas que estão sendo tomadas pelo poder público para diminuir a burocracia e dar rapidez aos processos, o OCP inicia nesta edição a publicação de uma série especial de três reportagens que detalham a burocracia vivenciada na cidade. Na reportagem desta sexta-feira (16), acompanhamos os trâmites de emissão do alvará de construção, o chamado habite-se, e a angústia de quem depende deste documento para realizar o sonho de uma vida.
No especial de sábado (17), conheceremos a história de um empreendedor individual que precisou buscar outro município para formalizar uma atividade, mesmo diante dos avanços alcançados com a Lei do Alvará de Atividade, aprovada em março deste ano.
Já na terça-feira (20), a última reportagem da série mostra as dificuldades enfrentadas por um empreendedor que, após cinco meses de espera, ainda aguarda a liberação da Prefeitura para iniciar suas atividades.
Depois de longa espera, novo modelo facilita emissão do alvará de construção
Há seis meses, completados nesta sexta-feira (16), a assistente técnico-pedagógica Eliane Forgiarini espera para receber seu alvará de construção e então dar início à obra da sua casa própria. O projeto da futura residência foi protocolado em 16 de dezembro do ano passado na Prefeitura, mas até maio deste ano ainda não havia sido analisado, relata a assistente.
“Passamos na Prefeitura no começo de maio, mas nem tinha sido mexido ainda no nosso projeto. Quando fomos lá conversar, a pessoa que nos atendeu disse que tinha uns 250 projetos na frente do nosso”, conta Eliane. A assistente, seu marido e os dois filhos moram há dois anos em Jaraguá do Sul, no bairro Barra do Rio Cerro, e pretendem construir a casa própria na região, para assim sair do aluguel.
“É angustiante a espera, porque você planeja construir a casa e sair do aluguel, que custa em média hoje de R$ 1,5 mil a R$ 1,7 mil, e precisa do projeto para começar tudo, fazer orçamento com pedreiros. Até começar a obra leva um tempo ainda”, diz a assistente. Na casa alugada, a família decidiu não fazer grandes investimentos, como com mobília, por exemplo, já que não pretende ficar por muito tempo.
“Temos somente o básico, para que vou investir se logo pensamos em sair? Aí ficamos nessa angústia, querendo sair, até porque pagamos aluguel, é diferente de pagar um financiamento, porque o aluguel é um dinheiro que não volta”, comenta Eliane.

Depois de esperar pelo alvará de construção por seis meses, Eliane foi orientada a mudar processo para o Projeto Legal. Promessa é que pelo novo modelo, aprovado em lei no ano passado, os alvarás sejam emitidos em até 35 dias | Foto Eduardo Montecino
Projeto Legal foi criado para reduzir tempo de análise
Foi indo à Prefeitura para buscar informações sobre seu projeto que a família foi informada sobre o Projeto Legal, iniciativa que simplificou a análise dos projetos para concessão de alvarás, reduzindo o tempo de tramitação. “Quando fomos à Prefeitura falaram que estavam começando a dar preferência aos que estavam no Projeto Legal”, relembra a assistente, que por conta própria buscou aderir ao novo processo, aprovado em lei durante a gestão passada.
Depois de fazer as alterações necessárias para o novo formato, o projeto da casa foi reapresentado no dia 17 de maio. A assistente conta que segundo informações do engenheiro que contratou para elaborar seu projeto, nenhuma documentação a mais foi necessária, assim como não foi preciso pagar novas taxas à Prefeitura. Eliane relata que a abertura do processo, ainda pelo formato antigo, é simples, bastando fornecer a documentação solicitada, que é recolhida pelo próprio engenheiro.
“O que está difícil é conseguir a liberação, o problema mesmo é a demora. O engenheiro relatou que o primeiro alvará dele liberado pelo Projeto Legal saiu em 75 dias”, comenta ela, que pôde conferir a mudança entre o primeiro projeto apresentado e o segundo. Conforme a Secretaria de Planejamento e Urbanismo (Semplu), o número de parâmetros analisados caiu de cerca de 500 para 39. “Realmente muda bastante, fica mais fácil, são menos coisas para serem analisadas, nós vimos a diferença”, conta Eliane.
Secretário diz que tempo de análise pelo novo formato deve ser de 35 dias
Segundo o secretário de Planejamento e Urbanismo, Ivaldo Kuczkowski, o tempo médio de análise dos projetos pelo novo formato é de 35 dias, mas o objetivo da pasta é chegar próximo aos 15 dias. Em janeiro, informa a gerente de Análise de Edificações, Eliziana dos Reis, havia 670 processos parados no setor, demorando em média seis meses para serem analisados.
A implantação do Projeto Legal, relata ela, teve início ainda no primeiro mês do ano, processo que contou com treinamentos do pessoal interno e também de engenheiros e arquitetos, capacitações e redistribuição de trabalho dentro do setor. “Com isso, conseguimos, mesmo com a situação da paralisação (dos servidores, de abril a maio), reduzir para 487 o número de processos, enquanto o tempo passou de seis meses para 35 dias”, comenta Eliziana. Já para a reanálise dos projetos, que eventualmente retornam para alterações ou complementação de informação, o prazo é de sete a dez dias.

Secretário de Planejamento, Ivaldo Kuczkowski, e gerente de Edificações, Eliziana dos Reis, explicam que número de parâmetros analisados para emissão de alvarás caiu de cerca de 500 para 39 com novo modelo | Foto Eduardo Montecino
Dos 487 processos restantes, 180 não foram alterados para o Projeto Legal, informa a gerente. Ela afirma que todos foram contatados pela secretaria – por telefone ou e-mail – para fazer a alteração, e que a Prefeitura não cobra pelo novo processo e não há mudança no número do protocolo. Ainda assim, Eliziana diz encontrar resistência para adesão ao novo modelo.
“Nós estamos pedindo para os proprietários que têm processos antigos que troquem seus projetos para o Projeto Legal, porque a forma antiga gera um trabalho até oito vezes maior, já que temos que analisar toda a parte interna da edificação, toda a norma de acessibilidade, se tem rampa, se tem elevador, todos os detalhes da acessibilidade, e isso demanda muito tempo. No novo modelo, como é uma coisa simplificada e totalmente padronizado, é bem mais rápido”, explica. Os detalhes internos da construção, como explica a gerente, devem ser observados pelo profissional que elabora o projeto, respeitando as normas vigentes, como o Código de Obras.
Em até 60 dias, a secretaria pretende publicar decreto contendo uma listagem padrão de documentos mínimos que deverão ser apresentados no ato da entrada dos projetos para análise. O secretário da pasta explica que a documentação será conferida em até 48 horas e o projeto somente será protocolado para efetiva análise técnica caso não falte nenhum documento. A ideia, complementa Ivaldo, é filtrar os processos para diminuir o índice de devolução pela falta de algum item, como uma assinatura do proprietário ou do engenheiro, juntada de certidão de matrícula, entre outros.
Depois de reapresentar seu projeto pelo Projeto Legal, em meados de maio, Eliane diz que vai aguardar completar o prazo de 35 dias para ir buscar informações sobre o andamento dos trâmites e espera conseguir em breve o alvará para logo dar início à construção da casa própria da família.