“A Reforma da Previdência impacta na vida de todos os catarinenses”

Eron Giordani, secretário da Casa Civil | Foto - Divulgação/Secom

Por: Ewaldo Willerding Neto

11/07/2021 - 14:07 - Atualizada em: 11/07/2021 - 14:33

O secretário da Casa Civil do Governo de Santa Catarina, Eron Giordani, assumiu o cargo num momento delicado da administração de Carlos Moisés da Silva. Ameaçado por processos de impeachment e distante da Assembleia Legislativa, o governador ganhou além de um assessor direto, um aliado com interlocução junto aos parlamentares e experiência na vida pública.

Ex- secretário da Casa Civil nas prefeituras de Chapecó e Florianópolis, além de ter participado do Conselho de Administração da Celesc, Giordani atuava na chefia de gabinete da presidência da Alesc, quando Julio Garcia ocupava o cargo.

Com toda essa experiência e relacionamento, Eron foi fundamental na construção do projeto da Reforma da Previdência, que necessitava da parceria dos deputados. Após muita negociação, e cafezinho, conseguiu costurar um projeto que já tramita na Alesc.

Nesta entrevista exclusiva à coluna Pelo Estado, Eron fala sobre essa construção e detalha, didaticamente, a importância da aprovação da Reforma para o futuro dos catarinenses.

Confira:

 

 

A Reforma da Previdência é um tema complexo, muitas pessoas não têm ideia da sua relevância. O quanto ela é importante e o quanto a sua não aprovação pode afetar a vida das pessoas?

Até 2019, existiram dois regimes de previdência no Brasil. O Regime Geral e o Regime Próprio. Depois de 2019 entrou um terceiro, não obrigatório, que é o Regime Complementar. O Regime Geral, todos conhecemos as regras porque a maioria dos brasileiros está inserida neste contexto, sobretudo os que trabalham na iniciativa privada. O Regime Próprio é mais ligados ao setor público, nas esferas federal, estadual e municipal, quando há. No caso do Estado, o que havia antigamente: não era um regime de previdência, um sistema previdenciário, até 2003. Tínhamos um clube de benefícios, tanto é que o Ipesc, antigamente, pagava farmácia para os seus associados. Cobria despesas que iam muito além da questão da seguridade social. De 2004 para cá as regras começaram mudar e com a metodologia do cálculo atuarial é possível identificar o quanto o sistema vai precisar de injeção de recursos para custear os benefícios até o último segurado estiver vivo. Por exemplo: nós estamos em 2021, o nosso cálculo atuarial vai até 2096. Nós sabemos hoje o quanto será necessário para cobrir as despesas de todos os segurados até 2096, sem deixar faltar um centavo. Até porque se faltar, o Tesouro do Estado é o responsável por isso. Estamos falando de uma massa de segurados de 106 mil pessoas, que são os funcionários da ativa, 47 mil; os inativos, 49 mil – desde 2016 em SC o número de aposentados é maior do que os da ativa -, e os pensionistas, que são 12 mil. Essa conta precisa fechar. Só que esta conta hoje apresenta um déficit de R$ 149 bilhões – estou falando dessa conta até 2096.

Em 2008, o Estado criou ou segundo regime de previdência, que foi o Iprev, e trabalhou em paralelo – Ipesc e Iprev – até a junção dos fundos em 2015, quando foi pego o saldo financeiro de um para cobrir as despesas do outro, reunificaram os fundos e colocaram mais de R$ 800 milhões na conta do governo. Só que em 2009, o Estado desembolsava todo ano R$ 780 milhões para cobrir o déficit financeiro mensal da previdência.

Então, para ficar ainda mais claro, pega a contribuição do servidor que hoje está na alíquota máxima de 14%; pega a contribuição do Estado, que é de 28% e coloca tudo numa conta, ainda falta um tanto e esse tanto que em 2009 era de R$ 780 milhões por ano, em 2020 foi de R$ 4,8 bilhões por ano, ou seja, R$ 400 milhões todo mês que o Estado aporta no sistema para poder pagar os aposentados e pensionistas.

 

 

Esse é o dinheiro que faz falta nos investimentos do Estado?

Quando se faz uma avaliação “a Reforma da Previdência vai impactar a vida do servidor público”, não! Vai impactar a vida de 7,2 milhões de catarinenses. Porque todos os meses nós deixamos de investir em saúde, educação, intraestrutura, R$ 400 milhões. Para se ter uma ideia, a obra estadual que tem a maior medição mensal é a BR-280. O máximo que uma empresa consegue executar de obra hoje em SC é de R$ 6 milhões por mês. Então, imagina, estamos falando de R$ 400 milhões que não podem ser usados em investimentos e vão para a conta da previdência. Quantas obras igual a da BR-280 poderíamos estar fazendo com esses recursos que saem do bolso dos catarinenses e vão para a previdência?

Nós temos que inverter essa lógica. Precisamos estancar o crescimento desse déficit e aí vai haver sacrifício de quem? De quem é assegurado. Nós temos que parar de olhar a árvore, que seriam essas 106 mil pessoas, e olhar a mata toda, que são os 7,2 milhões de catarinenses.

 

 

Foto – Divulgação/Secom

“Para manter o pagamento de aposentados e pensionistas, todos os meses nós deixamos de investir em saúde, educação, intraestrutura, R$ 400 milhões”

 

 

O senhor faz um comparativo bem didático do quanto se gasta com a previdência e o quanto se investe nas outras pastas. O senhor pode nos mostrar?

O que nós gastamos hoje com folha e previdência corresponde a 2/3 de toda a arrecadação do Estado. Então estamos pegando 2/3 de tudo que se arrecada e gastando com 106 mil pessoas. E 1/3, com 7 milhões; Não pode estar certo. O que se gasta com previdência e folha é 1.6 vezes o que investimos em educação; 1.9 vezes o que gastamos com saúde; 2,5 vezes o que é gasto com segurança pública; 9.8 vezes o que se gasta com infraestrutura e 10,5 vezes o que se gasta com agricultura, que corresponde a quase 40% do PIB do Estado. Não pode estar certo.

 

 

Essa não é a primeira vez que se faz uma Reforma da Previdência em SC e imagino que foi necessária muita conversa para que se construísse um diálogo antes de apresentar os projetos na Alesc. Como foram essas negociações?

Essa Reforma é a ideal? Não! Ela vai resolver o problema? Não! Ela é necessária, precisa ser feita e está sendo feita na máxima escala que a Constituição Federal permite e resolve o problema em 26% do seu contexto, que é essa a economia que ela vai gerar. Nós podemos ir além do que propusemos? Não, esse é o limite legal. Como ela não será suficiente, futuramente, quando se mudarem as regras nacionais, os estados e municípios terão que se adaptar também. As reformas vão sempre existir. Se nós estamos fazendo a Reforma que reduz o déficit de R$ 149 bi para R$ 110 bi, esses R$ 110 bi continuarão existindo, alguém vai ter que pagar essa conta. Então, sempre será traumático fazer uma revisão porque as pressões surgem, as categorias se mobilizam e ninguém quer deixar mexer no seu bolso. Mas não tem outro jeito. Nenhuma reforma é feita de maneira autoritária. Nós buscamos o diálogo, o equilíbrio, para tirar o bem comum.

E o que tem hoje na Alesc que não tinha em 2019? Hoje há um senso de responsabilidade permeado entre os parlamentares. Eu não ouvi nenhum deputado dizer: não quero a reforma. Todos estão dizendo que é necessária a reforma, o que estamos discutindo é o tamanho que ela vai ter.

 

 

As primeiras manifestações contrárias não foram de categorias que formam a base do servidor público, que são quase sempre as mais barulhentas. Quem se manifestou primeiro foi a chamada “elite do funcionalismo”, que emitiu nota oficial, inclusive. O que o senhor achou deste movimento?

Toda a defesa é legítima. É natural que eles tentem garantir o máximo que puderem porque quando eles ingressaram na carreira as regras eram aquelas. Talvez pessoas qualificadas, que se soubessem que mudaria a ponto de nenhum servidor vá se aposentar com valor superior a R$ 6 mil, deixassem de prestar o concurso público e fossem para outra atividade. Então, essa compreensão é necessária ter, assim como também é necessário ter o bom senso que é preciso contribuir um pouco mais agora para garantir o futuro. Porque se não esse futuro não vai existir.

 

 

Há na proposta da Reforma diminuição do número de isentos. Como vai funcionar?

A nossa faixa de isenção hoje é o teto do Regime Geral da Previdência Social, que é R$ 6,4 mil. A proposta é reduzir para 1 salário mínimo, R$ 1,1 mil. Ao todo, 15 estados da Federação já fizeram reformas em suas previdências e 10 mexeram no limite de isenção e dos 10 que mudaram, 7 reduziram para 1 salário mínimo. Porque esse é ponto que gera o benefício financeiro imediato para o sistema. Todos os demais: tempo de contribuição, aumento de idade, reforma do cálculo de aposentadoria e pensão causam impacto atuarial a médio e longo prazo. Já a redução da faixa de isenção é um impacto imediato. Então, o que estamos propondo: com essa redução o Estado vai deixar de aportar todos os meses os R$ 400 milhões e vai reduzir em R$ 83 milhões, ou seja, mesmo assim vai ter que continuar pagando R$ 320 milhões. Nós estamos falando numa redução de R$ 1 bilhão por ano e de R$ 22 bilhões em 20 anos que é o cálculo do impacto que nós fizemos.

 

 

Até que ponto é possível ceder na negociação na Alesc?

Nós podemos flexibilizar, melhorar a proposta, ceder num ponto ou em outro, isso faz parte do processo, agora, um ponto que o governo vai tentar manter, vai defender a permanência no projeto é essa questão da redução para 1 salário mínimo.

 

 

Como é a proposta da Previdência Complementar?

O governo federal fez a sua previdência complementar, mas o volume de migração foi muito baixo. Nós precisamos implementar o PIM (Programa de Incentivo à Migração) do RPPS (Regime Próprio de Previdência Social) para o RPC (Regime de Previdência Complementar). Precisamos estimular o servidor a fazer essa migração. Nesse projeto que enviamos para a Alesc tem um artigo que diz o seguinte: o Poder Executivo tem até 180 dias para enviar para o Legislativo o projeto de PIM. Nós estamos com estudos bem avançados e provavelmente consigamos encaminhar o projeto ainda em julho, portanto antes da votação da Reforma da Previdência na Alesc. Desejamos encaminhar este projeto antes de 4 agosto, data da votação final. A resistência que tem para categorias como Polícia Civil, Poderes e órgãos poderá ser a solução de todo esse problema, aonde o sistema é paritário 8% de contribuição entre o governo e o servidor. É a tal da conta corrente, o volume de contribuição ao longo de todo o período vai para uma conta individualizada.

 

 

Foto – Divulgação/Secom

“O governo vai se caracterizar por muita realização e se preparou para isso, com enxugamento da máquina, revisão de contratos. O volume de obras é gigante”

 

 

O governo Moisés chegou ao Centro Administrativo após votação histórica. Passou por dois processos de impeachment e agora vive um novo momento. Qual a imagem que o senhor que fica nessa parte final de governo?

O governo vai se caracterizar por ser de muita realização e se preparou para isso nos primeiros anos, com enxugamento da máquina, revisão de contratos, e não podemos desconsiderar o fator importante: a economia nunca esteve do jeito que está. A arrecadação do Estado crescendo a quase 20% ao ano, exceto 2020, por conta da pandemia, que mesmo assim cresceu 2%. Esse ano deve se aproximar da casa de 20%. Então, com esses números aliado à revisão dos contratos e o enxugamento da máquina pública permitiram ao Estado a chegar na condição que tem hoje de investimento com recursos próprios. O volume de obras é gigante. São R$ 1,7 bilhão na captação, tratamento, adução e distribuição de água; R$ 5,5 billhões na infraestrutura; quase R$ 2 bilhões na educação, entre obras e valorização dos servidores. Então, vai ser um ano de muita realização e de muita parceria com os municípios. Para ser municipalista tem que sair do discurso. Muitos que passaram por essas cadeiras se disseram municipalistas, no entanto prometeram programas que não chegaram, tiveram problemas com a Celesc na questão dos incentivos fiscais, que depois tiveram que ser devolvidos aos municípios, problemas com o Prodec.

Isso não é ser municipalista. Ser municipalista é o que estamos fazendo agora: parceria verdadeira com os municípios. Um exemplo disso é a aprovação na semana passada da PEC 02, que é a tal da PEC Fundo a Fundo. Um processo que desburocratiza a liberação de recursos, que chega na ponta com mais velocidade, sem perder a transparência, a boa aplicação e a fiscalização dos recursos públicos. Porque todo esse processo de desburocratização é de pré-liberação. Nenhuma das fases pós-liberação foi suprimida nesse processo. Então estamos confiantes de que o governo vai fazer uma boa relação com os todos os prefeitos, de maneira apartidária. Vamos atender os prefeitos independentemente de que partido for. Prova disso foi o pagamento das emendas impositivas, que são mais de R$ 800 milhões de emendas impositivas, que, aliás, foi o primeiro governo que pagou. E pagou de anos anteriores.

Ser municipalista é transformar as palavras em ações e é que vamos fazer, com intensidade daqui para frente. Vou citar um exemplo: estamos indo no final de julho para o Extremo Oeste onde o governador vai fazer entrega no dia 22 de pagamentos de R$ 63 milhões de emendas parlamentares e deverá celebrar convênios nas cidades pólos que deve passar de R$ 150 milhões. Só nesse roteiro de julho serão mais de R$ 200 milhões, que os municípios vão receber de incentivo do governo do Estado para diversas obras que são importantes e históricas, aguardando há muito tempo.

 

 

Com todo esse panorama, o governador fica a vontade para sair candidato à reeleição?

Esse é o único assunto que não é debatido no Palácio da Agronômica e no Centro Administrativo. O governador vai se desfiliar do PSL vai ficar sem partido. Ele está focado na gestão, vai cuidar do governo. Ele não quer esse debate. Falta um ano e meio para terminar o governo. Ele está focado na gestão, no governo, preocupado com o fim da pandemia, com a retomada da economia e se tem um assunto que ele não quer tratar é eleição ou reeleição. Ou questões partidárias. Ele vai ficar sem partido e o futuro a Deus pertence. Quando for oportuno e se for o caso ele vai abordar esse tema.