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Riqueza rural: programador jaraguaense abandona tecnologia para viver do campo

Por: Elissandro Sutil

07/04/2018 - 05:04 - Atualizada em: 10/04/2018 - 09:17

A olericultura vem ganhando espaço tanto pelo consumo cada vez maior de produtos mais saudáveis, quanto pela capacidade de produção em pequenas áreas. Além disso, permite que o agricultor produza o ano todo, em todas as estações.

No entanto, a cultura de plantas olerícolas e hortaliças exige mão de obra constante e está exposta a condições climáticas, o que representa alto risco ao produtor. Enfrentando altas e baixas no mercado, a olericultura exige dedicação e, como qualquer negócio, uma gestão focada em eficiência.

Há 25 anos nessa atividade, o produtor Vanderlei Walter Henrique Lenz, 47 anos, conta que sua conexão com a terra atravessa gerações e significa, além de renda, maior qualidade de vida. No Rio Cerro II, ele mantém sua residência e empreendimento, numa região cuja paisagem sofreu diversas mudanças ao longo do tempo.

Conexão do jaraguaense com a terra atravessa gerações | Foto Eduardo Montecino

Conexão do jaraguaense com a terra atravessa gerações | Foto Eduardo Montecino

“Na verdade, eu era programador de computador e hoje sou agricultor. Recebi oferta de várias empresas para trabalhar nessa área, mas escolhi a agricultura. Porque está no sangue e eu gosto, me sinto muito bem. Moro numa região privilegiada, no meio da natureza”, revela.

“A melhor coisa é levantar cedo com aquele ar puro da manhã. Dá aquela sensação de felicidade. Eu moro praticamente no céu (brinca, referindo-se à casa no alto da propriedade). É uma sensação tão gostosa que é até difícil descrever como a gente se sente”, completa.

Gosto pela terra vem de família

O bisavô, Albert Ranh, foi desbravador e professor naquele território da cidade. Estabeleceu-se quando o local era tomado por árvores nativas e natureza virgem. Depois o avô, também agricultor, plantou arroz e fumo, assim como o pai, que além dessas culturas, investiu na criação de suínos.

Lenz também chegou a participar do negócio, mas acabou desistindo. Foi aí que resolveu mudar para a olericultura. “Começamos com uma roça pequena e em 1994 a gente plantou uma roça maior. Aí passamos a comprar implementos”, revela.

Família enfrentou muitas dificuldades ao longo do tempo | Foto Eduardo Montecino

Família enfrentou muitas dificuldades ao longo do tempo | Foto Eduardo Montecino

O agricultor ressalta que daquela época até agora muitas foram as dificuldades, mas que é persistente e, portanto, continuou com a produção de hortaliças. Os motivos, enfatiza, são muitos; vão desde a viabilidade e potencial do empreendimento, até a possibilidade viver em contato constante com a natureza.

Em contrapartida aos benefícios dessa relação íntima com meio rural, o produtor conta que nos últimos 18 meses os olericultores estão enfrentando muitas dificuldades devido ao clima e também a queda dos preços. Em 2015, explica, os preços praticados foram extremamente altos.

Em consequência disso, em 2016 e principalmente 2017, os produtores plantaram muito, especialmente no Paraná. “E lá eles recebem muito incentivo do governo, daí então o preço despencou. O nosso custo aumentou e a renda diminuiu”, explica Lenz, destacando a falta de incentivo à atividade.

Escassez de mão de obra inviabiliza negócio

Outra dificuldade apontada por Vanderlei Lenz diz respeito à escassez de mão de obra. O cultivo de olerícolas exige tratos  intensivos, demandando manutenção constante durante todo o ciclo das culturas implantadas.

“Já cheguei a ter nove funcionários e hoje tenho dois. Claro, isso tanto pela crise financeira que atravessamos, mas, especialmente, porque ninguém mais quer sujar as mãos. O pessoal quer trabalhar de segunda a sexta e de preferência nem trabalhar na sexta, e esse é um grande problema”, justifica. Hoje ele conta com dois funcionários e a ajuda da esposa, Sandra.

Atualmente, a produção é de três hectares cultivados, mas a família já chegou a cultivar dez hectares. Para a área atual, Lenz diz que deveria contar com seis pessoas trabalhando, portanto, é necessária a contratação de mais quatro colaboradores. “Estou contratando mais um agora, porque estamos nos capitalizando aos poucos depois desse período mais difícil. A mão de obra é o fator determinante para aumentarmos a produção”, ressalta.

Na propriedade e áreas arrendadas, ele planta 20 tipos de verduras, mas são as berinjelas, pimentões, brócolis, couve-flor e repolho as que mais se destacam.

“Eu planto muita berinjela, na região acho que sou um dos maiores produtores. São 25 mil/30 mil pés por ano. Colho aproximadamente 6 mil caixas por mês, então esse excedente vai para Curitiba. Lá não se produz berinjela no inverno e inclusive, aqui, no frio, também. Mas eu tenho várias áreas na região de morro, onde a geada não mata tanto”, conta. Eu sempre vendi muito bem. O problema hoje não é vender, é produzir”.

Mudas das hortaliças são produzidas pela família

Com o auxílio da esposa, ele produz as próprias mudas das hortaliças que depois são replantadas. Segundo o agricultor, isso representa uma economia de 30% a 40%, além da garantia de mudas adequadas. “Pela questão da confiabilidade, passei a comprar as sementes e produzir. Não vou dizer que os viveiristas agem de má fé, mas para cada estação tem uma variedade específica”, comenta.

“Por exemplo, existe couve-flor para inverno, para meia estação e para verão e já me aconteceu de me mandarem couve-flor para verão no inverno”, explica. Devido ao alto custo das sementes, é necessário que o produtor esteja atento e busque maneiras de diminuir os gastos.

Pela questão da confiabilidade, produtor passou a comprar as sementes e produzir | Foto Eduardo Montecino

Pela questão da confiabilidade, produtor passou a comprar as sementes e produzir | Foto Eduardo Montecino

“Hoje, uma semente de couve-flor está na faixa de R$ 0,15 e muitas vezes o produtor chega a vender a cabeça a R$ 0,50, como vendi ano passado. Só que nem toda a semente germina, mais o custo de mão de obra, adubo, os remédios que é obrigado a passar para não adoecer, isso te gera um custo de R$ 0,70 a R$ 0,80. Ah, e mais a nota… aí o custo é alto”, destaca.

A comercialização de sua produção é regional. Os maiores clientes são as grandes redes de supermercados, mas também atende algumas cozinhas industriais, que processam as hortaliças e revendem. O excedente é vendido à Ceasa de Joinville e Curitiba. No ano passado, a produção de brócolis e couve-flor atingiu 30 mil cabeças, enquanto a de repolho chegou a 50 mil cabeças.

Para 2018, o agricultor diz estar otimista, já que a expectativa é de que o Brasil plante 5% a menos de olerícolas, o que deverá manter os preços em um patamar favorável.

“Quanto mais fiscalização, melhor”

Quanto mais rígida a fiscalização, melhor, afirma Vanderlei Lenz. Segundo ele, esse acompanhamento garante que somente os profissionais permaneçam no mercado. “Eu sou um produtor convencional (não orgânico), porém, obedeço as carências dos produtos (defensivos agrícolas). Cada produto que a gente passa tem uma carência. Se é de cinco dias, durante esse tempo você não pode entrar na roça, porque somos fiscalizados. Nós atendemos grandes redes de supermercados e a própria Cidasc fiscaliza, e com rigor”, garante.

Acompanhamento garante que somente os profissionais permaneçam no mercado | Foto Eduardo Montecino

Acompanhamento garante que somente os profissionais permaneçam no mercado | Foto Eduardo Montecino

Ele diz que procura utilizar os defensivos das faixas verde e azul, que causam menos danos à saúde humana e à biodiversidade. Conta que o pai morreu em decorrência do câncer no pulmão, pois, além de fumante, não usava proteção para manejar os agrotóxicos. “Fazia isso sem camisa, sem botas, o contato era direto”, revela.

Com o tempo, tanto a segurança do produtor quanto a do consumidor foram recebendo cada vez mais atenção e Lenz ressalta que até o final do próximo ano, 100% das verduras e frutas do Estado terão que ser rastreadas. Esse monitoramento representa mais segurança e qualidade nos produtos oferecidos.

“Nós queremos criar o selo ‘Produto de Jaraguá’, para incentivar o consumo do que é produzido aqui. Existe hoje o selo da agricultura familiar e queremos colocar o nosso juntamente com esse. Para isso, os produtos têm que ser monitorados”, complementa.

Tecnologia aliada ao sustento no campo

Para expandir ainda mais seu empreendimento, Lenz possui um projeto de cultivo protegido. A estrutura, que demanda a construção dos abrigos e implantação de tecnologia que deverá permitir, por exemplo, a irrigação por meio de sensores (quando a planta precisa de água o equipamento mesmo atende à demanda), terá investimento de R$ 150 mil para atender área de sete mil metros quadrados. A expectativa é um retorno bruto de R$ 340 mil por ano.

Lenz possui um projeto de cultivo protegido | Foto Eduardo Montecino

Lenz possui um projeto de cultivo protegido | Foto Eduardo Montecino

“O maior risco do produtor é o clima. Por isso há necessidade de investir no cultivo protegido e aproveitar os recursos tecnológicos. Aliás, se não fosse a tecnologia muitas culturas seriam inviáveis e muita gente estaria passando fome”, diz.

Para esse e outros projetos, o agricultor ressalta o apoio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Rural. Segundo ele, os produtores rurais estavam desassistidos, o que mudou na atual gestão.

“O novo governo realmente está buscando recursos e novas metodologias, trazendo palestrantes, nos levando para conhecer novas áreas de plantio, novas técnicas. Temos um grupo de olericultores com 60 pessoas aqui, só que produzindo mesmo deve ter uns 15. Mas a tendência é crescer mais. Inclusive, tem um programa chamado Cinturão Verde que vai auxiliar na implantação de abrigos para o cultivo protegido”, revela.

Para diversificar a produção, o produtor está começando o plantio de mudas ornamentais, como a palmeira azul, cujo mercado ele considera promissor. Lenz também acredita que para a região, a grande saída para os produtores rurais será o investimento em pequenos negócios, que não demandem grandes áreas.

“Posso citar a produção de ovos caipira, pequenos animais, como galinhas caipiras, coelhos, ovos de codorna, conservas, bolachas artesanais. São alternativas mais viáveis se comparadas ao arroz, por exemplo. Pelo preço que está hoje, não vale mais a pena plantar, levando em conta o maquinário necessário para se manter na atividade”, ressalta.

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Elissandro Sutil

Jornalista e redator no OCP