O Código Penal criminaliza qualquer ato sexual ou libidinoso com menores de 14 anos. De acordo com a lei, crianças e adolescentes até essa idade não são capazes de consentir o ato, por isso essa situação caracteriza o estupro de incapaz. A Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso de Jaraguá do Sul registrou 29 ocorrências do tipo no primeiro semestre de 2017. Se forem somadas as ocorrências envolvendo adolescentes (11 ocorrências) e mulheres (13), o número sobe para um total de 53 registros na cidade.
De acordo com a delegada titular, Milena de Fátima Rosa, os crimes cometidos contra mulheres adultas são mais raros na cidade. Milena ainda afirma que muitos casos envolvendo menores não vêm à tona. “A gente ainda acha que as estatísticas estão aquém do que ocorre na realidade. Porque muitas crianças não reportam isso para os pais. Elas são sempre coagidas pelo abusador. A criança, para proteger a família ou acreditando que ninguém vai levar a palavra dela, acaba não revelando esses fatos”, revela Milena, ao ressaltar que muitas vezes as crianças têm vergonha de contar sobre os abusos aos responsáveis.
A delegada aponta que muitas crianças não se dão conta dos abusos sofridos na infância. Ela explica que esses menores só descobrem que foram abusados na adolescência, momento em que recebem orientação sobre a sua sexualidade na escola ou pelos pais. “Somente quando abordam esse tema é que percebem o que tinha acontecido com elas, que era uma conduta criminosa”, observa Milena, ao contar que as crianças recebem esses gestos como um carinho, porque o abusador normalmente é uma pessoa carinhosa.
“O abusador sexual de crianças e adolescentes não é uma pessoa agressiva. Ele tem uma empatia com a criança, ele é super amável, ele dá sempre mais atenção para a criança do que para outras pessoas da família”, define a delegada. Milena aponta que muitas vezes é alguém muito próximo e está acima de qualquer suspeita. “Temos muitos casos envolvendo o namorado da avó, porque as crianças ficam sobre os cuidados dela enquanto os pais trabalham. Aquele companheiro acaba por abusar da criança. Em outros casos é um vizinho próximo. A criança vai brincar na casa do vizinho e o abuso pode vir de um irmão mais velho da coleguinha”, relata.
A descoberta de um caso de estupro de vulnerável pode revelar muitos outros. No momento em que um estuprador consegue êxito em um abuso, ele vai procurar em outras vítimas. Um caso recente é de um homem preso em uma operação da Polícia Civil no bairro Estrada Nova.
Os policiais civis foram até o local para cumprir um mandado de prisão. O preso era respeitado na comunidade. Vítimas revelaram o abusador após a fachada da sua casa aparecer no vídeo do Plantão Policial. “Ele era uma pessoa respeitada na comunidade, frequentava a igreja. As vítimas procuraram a polícia após ele ser preso”, frisa a delegada.
Denúncia e orientação podem evitar novas vítimas
A descoberta de um abusador, segundo a delegada, pode evitar outros abusos. “Só um deles vai poder dar seguimento ao processo, pois os outros prescreveram. Mas os depoimentos dessas vítimas vão servir para corroborar a palavra dessa vítima”, constata a delegada. Milena destaca que uma das vítimas, agora com 30 anos, tinha 14 anos quando os fatos aconteceram. “Se ela tivesse tido conhecimento de que poderia denunciar esse abusador, outras meninas poderiam não ter sido submetidas a isso. Mas ela disse que só não revelou porque tinha certeza que os pais não iriam acreditar”, esclarece.
Segundo Milena, os responsáveis devem abordar as crianças conversando sobre comportamentos estranhos, dizendo que “ninguém pode mexer nesses locais que estão cobertos, porque eles precisam de proteção e que nenhuma outra pessoa pode tocar nesses locais”. Em muitos casos, quando há o abuso físico, meninas passam a ter secreções vaginais que não são correspondentes à sua idade. “Crianças que sofrem abusos têm queda no rendimento escolar, não interagem como antes, não riem, ficam mais contidas no seu mundo, têm pesadelos à noite e até se cortam”, salienta, ao contar que muitas meninas não deixam que os pais lavem as partes íntimas por causa das lembranças do abuso.
Com relação ao abusador, há um conjunto de características que levam a suspeita. “Muitas vezes há uma pessoa próxima que prefere ficar com as crianças, e não conversando com os adultos. Muitas vezes eles abordam as crianças quando elas estão sozinhas. Os abusadores faz perguntas de conteúdos adultos para as crianças, se tem namorado, por exemplo. Eles tratam a criança como adulto, mas agem de forma infantilizada com relação à criança. Tudo isso para se aproximar dela”, finaliza.
Como denunciar abusos?
Disque 100 – Serviço de proteção de crianças e adolescentes com foco em violência sexual. Disque 180 – Central de atendimento à mulher. Disque 181 – Disque denúncia da Polícia Civil. (47) 3370-0331 – Telefone da DPCAMI.
Reportagem de Cláudio Costa para o jornal O Correio do Povo