“Eles estão preocupados em manter o castelo de pé”, diz Giuliano Donini sobre a classe política

Foto Eduardo Montecino/OCP

Por: Elissandro Sutil

30/09/2017 - 06:09

Aos 42 anos, Giuliano Donini se destaca não só como o presidente da Marisol, uma marca reconhecida nacionalmente, mas também por sua liderança frente a pautas do associativismo e de interesse público. Acompanhando de perto dados econômicos e políticos tanto nacionalmente quanto localmente, o jaraguaense entende que a sociedade precisa parar de tratar político como celebridade e fazê-los entender que eles estão, na verdade, a serviço da população.

Pouco antes de conversar com a nossa equipe para entrevista, na manhã de sexta-feira (28), Donini recebeu a informação de que o presidente do Fórum Parlamentar Catarinense, o deputado federal João Paulo Kleinubing (PSD), havia cancelado a vinda do grupo para reunião agendada para próxima segunda-feira na Associação Empresarial de Guaramirim. O motivo alegado foi de que a pauta política inviabiliza que os deputados e senadores saiam de Brasília. “Eles estão preocupados em manter o castelo de pé por uma questão de sobrevivência, quando, na verdade, deveriam estar atentos e ter uma agenda para sociedade”, critica Donini.

O empresário enxerga uma melhora na economia, mas avalia que o Brasil ainda precisa se modernizar e perder o ranço ideológico para avançar com mais consistência. Exemplo nesse sentido Donini dá quando fala sobre as diferenças entre administração pública e privada. A lógica, diz ele, é a mesma: ter planejamento, prioridades na hora de investir e atender bem a demanda.

Na entrevista a seguir, Donini fala sobre uma possível participação na política, comenta a ausência de protestos contra o presidente Michel Temer, defende as reformas, as privatizações, e diz que administração de Antídio Lunelli pode pecar às vezes na forma, mas acerta nos resultados. Acompanhe:

A economia começa a melhorar. Na sua avaliação os sinais são suficientes para recuperação da confiança?
Não, de forma muito prática não, porque os sinais não são lineares, tivemos meses em que os índices foram positivos, depois caíram novamente. O governo tem feito coisas positivas, tem a questão das privatizações, está mostrando que quer o Estado menos intervencionista na economia. Entretanto, o país ainda enfrenta algumas barreiras, a reforma trabalhista, por exemplo, foi feita, mas agora ainda tem um debate sobre a interpretação dos juízes. Essa é uma preocupação da própria CNI (Confederação Nacional da Indústria), porque diversos juízes se manifestaram dizendo que não concordam com alguns pontos da reforma, mas, ora, essa não deveria ser uma questão ideológica. Não compete ao juiz gostar ou não gostar da lei, ele tem que julgar da forma mais isenta possível. Por isso, ainda é dúvida se vamos mesmo sair dessa situação que nos colocou na crise, todo esse ranço, que dificulta de diversas maneiras o crescimento do país. Mas uma coisa podemos afirmar com certeza, o Brasil não vai andar mais para baixo.

Os empresários não deveriam se posicionar mais, fazer o contraponto desses debates que estão em pauta? Aproveitando o gancho, o senhor tem pretensões políticas, vai se candidatar?
Não me vejo, hoje, por algumas razões, dentro da política. Ainda tenho uma determinada dificuldade com esse tipo de ambiente, reconheço e enalteço o estômago de quem tem. Jaraguá está vivendo uma realidade onde um empresário se dispôs a fazer parte da administração pública. Ele teve que se indispor para mudar algumas questões e faz isso com bastante veemência. Às vezes funciona, às vezes não, mas o fato de enfrentar todas essas problemáticas é bom.

A cidade deveria ter uma capacidade maior de investimento. A sociedade quer isso e os próprios vereadores também quando fazem esse elevado número de indicações. A saúde precisa de investimento, a educação, a infraestrutura, a segurança. E quando a Acijs defende isso, não é uma fala alienada, em defesa do setor empresarial. É uma preocupação com o coletivo. A Prefeitura precisa ser administrada com essa lógica.

“Jaraguá está vivendo uma realidade onde um empresário
se dispôs a fazer parte daadministração pública. Ele teve
 que se indispor para mudar algumas questões e faz isso
com bastante veemência.”

Há muito esse debate sobre as semelhanças e diferenças da gestão privada para a pública. Como enxerga essa questão?
As pessoas costumam falar que administrar uma Prefeitura não é como administrar uma empresa, dando a entender que administrar uma empresa é uma coisa ruim. É necessário sim usar os mesmos princípios, a mesma lógica. A mesma lógica que eu tenho na Marisol, eu tenho na minha casa. Não posso gastar mais do que ganho, tenho que eleger prioridades para cuidar da casa, da família. O que se pede é que se tenha planejamento no setor público, isso não tem como ser ruim.

“As pessoas costumam falar que administrar uma prefeitura
não é como administrar umaempresa, dando a entender
que administrar uma empresaé uma coisa ruim.”

Voltando à questão anterior, a sua participação política, sua contribuição à administração pública, está descartada?
Não tenho ambição política até pela angústia de lidar com isso, com todos os entraves da administração pública. A segunda questão é que não posso confundir as funções. Não posso usar a Acijs em benefício próprio. Sou um crítico ácido em relação a esse comportamento e não são poucos os exemplos.

Na Federação das Indústrias de São Paulo, por exemplo, não tenho nada contra o presidente Paulo Skaf ser candidato a governador, mas tenho tudo contra a entidade ser colocada a serviço de um projeto pessoal. Perde a credibilidade. Acho que o grande desafio é encontrar esse equilíbrio entre a linearidade entre o que é ser político e o que é ser empresário.

O Doria, por exemplo, as pesquisas mostram que com menos de um ano de governo ele já é visto como político, justamente pelo comportamento que tem tido, ao contrário do prefeito de Joinville, Udo Döhler, que está no segundo mandato e ainda é considerado como um não-político. Uma das coisas que alimenta muito isso (a imagem do Doria) é a ambição de carreira. Ele mal virou prefeito e não quer mais ser prefeito. Enquanto o Udo já foi muitas vezes convidado a ser governador e diz que não tem o mínimo de interesse, a não ser que esse seja o desejo e que seja para dar a sua contribuição, não como um projeto pessoal.

“O Doria, por exemplo, as pesquisas mostram que com
menos de um ano de governo ele já é visto como político,
justamente pelo comportamento que tem tido, ao contrário do
prefeito de Joinville, Udo Döhler.”

 

O combate à corrupção tem auxiliado na melhora da economia? O Brasil vai colher frutos de toda essa esculhambação?
Sim. A gente já deu alguns passos, mas será que o Brasil mudou? Vamos precisar dar mais uns passos para ver isso. Ainda temos que ver se de fato a impunidade vai ter fim. O sistema tem que punir melhor. Hoje, as pessoas não têm medo de fazer o que fazem. E isso é uma questão cultural também. Essa história no Brasil de pessoas terem sido presas, pegas em vídeo, em áudio, não estou nem falando da discussão de recibos terem sido falsos ou verdadeiros, e ainda conviverem na sociedade com tranquilidade. O crime financeiro ainda não parece crime no Brasil. O brasileiro ainda faz piada da corrupção. Vem sempre aquela frase: ‘ah, vai dizer que não teria ficado com o dinheiro?’. Eu não, tenho certeza que não.

A impunidade acaba com a manutenção dessas pessoas na prisão?
Não é só isso. Acho que tem várias formas de punir. A sociedade entende melhor a prisão. A pessoa que roubou tem que perder aquilo que alcançou dessa maneira. Um diretor que roubou milhões da Petrobras tem que perder tudo e voltar de novo de onde começou. A casa que ele tem hoje é a mesma que tinha antes? Se a casa foi conquistada com dinheiro roubado, ela também tem que ser tomada. Vamos pegar o caso da JBS, a multa é de R$20 bilhões. Mas isso não é punição. Tem que ver como estava a empresa quando o esquema começou, quando ela foi escolhida para faturar mais de R$ 170 bilhões em um fenômeno “nunca visto antes na história”. Então, antes disso, o dono tinha apartamento em Nova Iorque? Tinha barco, helicóptero? As empresas que fecharam por concorrência ilegal com a JBS, quem vai ressarcir?

As empresas que fecharam por concorrência ilegal com a JBS, quem vai ressarcir?

Quanto ao desemprego, a situação está melhorando, vai continuar assim? O setor têxtil lidera esse ano a abertura de vagas.
Está havendo consumo, está crescendo pouco, mas está crescendo. Há uma sensação maior de estabilidade. Vejo a sociedade hoje mais segura, e isso faz a economia melhorar. Jaraguá está acostumada com muitos postos de trabalho, mas não vai ter, pelo menos tão cedo, aquela situação de ter 73 mil postos de trabalho, 75 mil, e apenas 70 mil trabalhadores. A retomada mais consistente depende do processo do país como um todo, mais ou menos instável, mas não tem sinalização que vamos passar por um momento ruim.

Por que o empresariado e a população foram tão firmes e atuantes no Fora Dilma e agora, apesar de Temer ter apenas 3% de aprovação, o silencio é absoluto? O brasileiro decidiu esperar por 2018?
Nos fóruns em que participo, o “Fora Dilma” tinha aquela coisa: a carapuça caiu, do país apodrecido por baixo, sem alicerce. O Temer, pela história, já nos leva a crer que as pessoas que chegam a esse cargo, aparentemente ninguém chega a esse nível de influência sem jogar com o sistema. É difícil imaginar que com esse grau de poder ele não tenha participado desses esquemas. A grande diferença está nisso, o Temer continua tendo essa representatividade, mas está tendo a coragem de estar discutindo o que precisa ser discutido. Não tem mais como pagar imposto nesse país, as reformas precisam ser feitas. O Temer está fazendo isso, está fazendo para a parte da sociedade que raciocina, está fazendo. Verdade que ele está comprando a sobrevivência dele porque tem gente vendendo. E tira ele e vai fazer o quê? É melhor dar a oportunidade para a sociedade nas urnas, definitivamente fazer diferente.

“O Temer, pela história, já nos leva a crer que as pessoas que chegam a
esse cargo, aparentemente ninguém chega a esse nível de influência
sem jogar com o sistema. É difícil imaginar que com esse grau de
poder ele não tenha participado desses esquemas.”

Acredita em renovação em 2018?
É difícil uma renovação porque o sistema político tem uma série de armadilhas, o perfil da nossa sociedade, temos problemas. Já tive oportunidade de falar com presidente de partido que sabe, que tem ciência que seus representantes eleitos são pessoas enviesadas, mas o partido não expurga. A legislação ainda permite a participação dessas pessoas e quem está no Congresso tenta dificultar a renovação.

Outro debate atual é sobre a necessidade de igualar mais as condições do trabalhador da iniciativa privada da pública.
Estudos do BNDS apontam que cerca de 30% da população é favorecida pelo governo, está trabalhando e alguma maneira ou se aposentou. Então tem muita gente que vai ser contra essas mudanças. O sistema é todo problemático. Durante a greve aqui eu tive a oportunidade de conversar bastante, inclusive com representantes do sindicato e um dos diretores me falou: ‘ah, mas eu já fiz concurso’. E eu disse, ‘você fez um concurso na vida’. Um colaborador da iniciativa privada se não se reinventa, se não reestuda, se não aprimora, ele é expurgado naturalmente. E naturalmente porque chega outro mais competente. E o servidor público, muitos deles, se acomodam, porque o sistema acomoda e também inibe o crescimento. Se você faz concurso para professor, hipoteticamente, você não pode virar diretor, você não pode ser promovido. O servidor teria que ter oportunidade, inclusive, de fazer carreira no serviço público, por merecimento. Mas existem todas aquelas questões de desvio de função e etc. Tem muitos problemas dentro do serviço público, mas a discrepância entre os direitos de um servidor público e os direitos dos funcionários da inciativa privada é gritante. Ah, mas então vamos dar os direitos para os funcionários da iniciativa, não paga a conta, não fecha. E isso não é ser contra o servidor, é uma contestação de que algumas questões precisam mudar.

Como avalia até aqui a gestão do prefeito Antídio Lunelli?
É uma gestão que traz polêmica pela forma e benefícios pelos resultados. Ele está fazendo o que tem que fazer. Sobre a forma de fazer, eu não gosto de fazer muita crítica porque é sempre personificada. E se eu começar a dizer como tem que fazer, eu que deveria estar lá. O Antídio é como é, todo mundo, ou muita gente, sabia. Ele não surgiu ontem. Ele está sendo autêntico, não está surpreendendo ninguém. Eu gosto do que está acontecendo. Claro que teria mais uma forma de conduzir essas questões porque chega uma hora que a tensão paralisa, não contribui para sociedade por que quem precisa do serviço prestado é que paga o preço. Para quem tem estabilidade é fácil, ela tem autonomia inclusive para dizer que não vai fazer o trabalho.

O duro é o cidadão que não tem autonomia e precisa da creche, do posto de saúde. O governo tem que sustentar o básico, então a forma de fazer deve ser refletida. O Antídio tem a oportunidade inclusive de ser menos político partidário, entrou na prefeitura com essa prerrogativa. O centro do governo já é técnico, mas ele poderia não fazer assentamento político nenhum. No geral é uma gestão muito positiva, colocou as contas em ordem em um curto espaço de tempo e isso dá mais credibilidade. Ficar devendo para fornecedor é o primeiro passo para ter sacanagem, começa a ter restrição e começa a ficar refém. A preocupação é com a temática de educação. Nosso projeto hoje anda menos fluido, travado, burocrático. A questão da saúde está na agenda, depende também do Estado, a Prefeitura precisa recuperar algumas questões. Mas o maior dilema é não perder a mão na educação e recuperar a capacidade de investimento.