Ele não é só a Personalidade de Turismo de 2017. Uma de suas empresas, o Atracadouro Barra Sul, em Balneário Camboriú, também foi eleita O Empreendimento Turístico do Ano. Os dois prêmios são resultado de uma votação popular feita pela internet, com 8,6 mil internautas, metade de SC, metade de turistas de outros estados brasileiros.
Esses troféus são apenas mais dois na galeria de sucessos empresariais do catarinense de Caçador Júlio Tedesco, que em fevereiro faz 70 anos. Líder da terceira geração da família Tedesco, que chegou a SC em 1932, ele preside a Primo Tedesco, companhia que, para surpresa de muitos, não é do setor turístico. Responsável pela fabricação de 40% dos sacos de cimento do país, a Primo Tedesco produz celulose, papel kraft, embalagens de papelão ondulado e sacos industriais.
Além do mercado nacional, exporta para países do Mercosul, América do Norte, Europa e até para o Egito. Na entrega dos troféus de Personalidade e Empreendimento Turístico do Ano, no Parque Beto Carrero, Júlio Tedesco tinha o semblante de um homem realizado – mas nem por isso sem sonhos e projetos para o futuro. Com os prêmios nas mãos, ele lembrou da história do pai e do avô, empreendedores que o destino acabou levando para Balneário Camboriú há mais de 60 anos. Foi essa história que Júlio Tedesco contou à coluna e que você conhece agora.

Atracadouro de Júlio Tedesco, em Balneário Camboriú, foi eleito O Empreendimento Turístico do Ano | Foto Fernando Bond/OCP
UM POUSO NA PRAIA E O DESTINO MUDA PARA SEMPRE
“Você tem certeza de que quer fazer uma marina aqui em Balneário Camboriú? Faz três dias que estou olhando para o mar e não vi nenhum barco passar!”. A pergunta incrédula foi feita ao empresário Júlio Tedesco pela arquiteta carioca Vera Mafra, considerada referência internacional em projetos de marinas. O ano era 2002 e Júlio havia convidado Vera para conhecer a Barra Sul, onde hoje se localiza uma das melhores – e mais movimentadas – marinas do Brasil, a Marina Tedesco. “Respondi a ela que tinha certeza de que ia encher essa praia de barcos”, o empresário conta hoje, às gargalhadas, sentado na sala de estar do seu próprio iate, ancorado na marina construída por ele para 500 embarcações na barra do rio Camboriú. Com certeza, Vera Mafra não teria feito essa pergunta se conhecesse pelo menos um pouco da história de empreendedorismo e superação dos Tedesco.
Uma saga que começa há 80 anos em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, onde aos 53 anos o avô de Júlio, Primo Tedesco, compilou uma literatura italiana que ensinava a fazer pasta de madeira para fabricação de papel. Sem ter completado o segundo grau, Primo Tedesco era autodidata e dono de um teodolito, instrumento de precisão que serve para fazer em medições na terra e no mar. Isso lhe valeu um convite para seguir de trem até Caçador, em 1932, “para dar uma olhada” em negócios no meio oeste catarinense. Primo ficou encantado com uma cachoeira e mediu com o teodolito a altura e a força da água para fazer girar a roda de pedra que ele instalaria ali para “ralar” a madeira e produzir a pasta, que depois seria vendida à Klabin para fabricação de papel.
Primo Tedesco e a avó de Júlio, Henriquieta, foram morar no andar de cima da pequena fábrica. O filho Normando ficou estudando no Colégio Militar, em Porto Alegre e, ousado como era, depois foi fazer Jornalismo no Rio de Janeiro. Mas quando a empresa cresceu, Normando voltou para ajudar o pai e também participar da vida da cidade, como vereador e dono de jornal. Casou com Natércia Ruas e tiveram dois filhos. O primeiro, Marco, nasceu em 1945. Quando Júlio nasceu, em 4 de fevereiro 1948, a empresa já era exportadora de araucária pelo porto de Itajaí. Normando não se conformava que os caminhões que seguiam carregados para o litoral voltavam vazios e achou que eles poderiam trazer peixes e camarões, por exemplo.
Para viabilizar o negócio, ele fez a viagem que mudaria a vida da família Tedesco. Embarcou num monomotor e seguiu em direção a Itajaí e ficou encantado com o sobrevoo sobre Balneário Camboriú. Mas foi algo acidental que selou de vez o futuro dos Tedesco: o monomotor teve problemas e foi preciso pousar no extremo sul da praia. Apaixonado pelo lugar – e agradecido pela boa sorte – Normando comprou tempos depois a área que hoje vai do Hotel Fischer até a barra do rio Camboriú, que pertencia à família do ex-governador Antônio Carlos Konder Reis. Algo como 280 mil metros quadrados – hoje de valor incalculável num dos metros quadrados mais caros do Brasil.
Enquanto o pai se aventurava pelo litoral, o pequeno Júlio estudava em Caçador, onde ficou até os 14 anos, quando foi para Porto Alegre fazer o “científico” e depois cursar Administração na Unisinos. “Mas não terminei porque meu avô e meu pai ficaram doentes e eu precisei assumir a presidência da empresa com 25 anos”, lembra ele. A responsabilidade cresceu mais ainda com a morte de Primo Tedesco, em 75, e de Normando, em 78. Enquanto tocava o empreendimento em Caçador, Júlio conta que deu “continuidade aos projetos que meu pai tinha aqui em Balneário Camboriú – em 1970 ele construiu um camping, que chegou a hospedar três mil pessoas nos verões”. Outra obra que Normando fez com recursos próprios foi a avenida da praia entre o Hotel Fischer e a foz do rio Camboriú, área que nessa época Júlio batizou de Barra Sul, hoje nome oficial.
“Meu pai sonhava com um teleférico”, recorda Júlio, mas até que esse sonho se tornasse realidade outros empreendimentos turísticos foram saindo do papel, como o minigolfe, “a primeira grande atração na ponta da praia”. Com o movimento, veio o restaurante Migula’s e o Rancho do Baturité, bar- restaurante-boate que tem lugar reservado na história de algumas gerações de catarinenses. Não eram investimentos nossos, mas a gente incentivava porque vinham pessoas do Brasil inteiro”, observa Júlio. Seguiram-se um boliche, um shopping de verão e o Bondindinho, que faz até hoje o tour turístico pela cidade, mas não pertence mais ao portfólio de negócios dos Tedesco.
Nessa época a prefeitura tinha um projeto para fazer uma avenida beirando o rio Camboriú. “Se isso acontecesse não haveria terreno suficiente para realizar os projetos turísticos e imobiliários que hoje estão em pé aqui nessa região e por isso nós propusemos que a avenida ficasse no meio do nosso terreno. Fizemos o projeto e doamos para a cidade os 12 mil metros quadrados da via com toda a infraestrutura. Hoje, como seus flamboyants, é considerada a avenida mais bonita de Balneário Camboriú”, orgulha-se Júlio. A Câmara deu a ela o nome de Normando Tedesco, o sonhador que também deixou plantada a semente do futuro teleférico.
“Em 1995, a gente achou que era hora de fazer o Parque Unipraias com esse teleférico. Encomendamos o projeto à empresa italiana Leitner, mas não tínhamos dinheiro para fazer tudo. Por isso nos associamos à família Bogo, de Joinville. O teleférico, com peças italianas e o cabo suíço, foi inaugurado em 99, depois de um ano de montagem e dois para conseguir a licença”, recorda Júlio, que assim começava a conviver com a burocracia e a lentidão dos órgãos governamentais. Mas isso não o desanimou para realizar outro grande sonho: a Marina Tedesco. Casado com a gaúcha Vani desde 1972, pai de Patrícia e de Juliana, com a marina o empresário continuou a tradição dos negócios familiares. “Quando a Juliana foi estudar inglês em Vancouver, no Canadá, eu pedi a ela que fosse depois para os Estados Unidos estudar o negócio de marinas”, diz o pai, que também ficou feliz em saber que Patrícia viria morar em Balneário Camboriú para cuidar do teleférico.
A Marina Tadesco, inaugurada em 2006, levou dois anos para ficar pronta – e mais dois para conseguir as licenças. Junto com os empreendimentos imobiliários de alto padrão e também com os investimentos públicos feitos na infraestrutura da cidade, foi fundamental para a mudança de perfil de Balneário Camboriú. “Quando o teleférico começou a funcionar o metro quadrado aqui era avaliado em R$ 1 mil. Com a Marina, em 2010 o valor já tinha subido para R$ 35 mil”, relata Júlio. Porém, o sonho não estava completo: “Em 2005, começamos a pensar no atracadouro para os navios de cruzeiro e 32 iates. Há dez anos aprovamos a ideia no Conselho da Cidade e daí partimos para o licenciamento”. A luta foi longa e difícil – 23 licenças em uma década de vai e vem, mas Tedesco conseguiu convencer o governo federal a fazer a primeira licitação pública de águas do país, para aquele que é considerado o melhor atracadouro privado do Brasil.
No dia 6 de abril de 2017 o primeiro navio de cruzeiro atracou em Balneário Camboriú, o MSC Preziosa. Na tradicional cerimônia de troca de placas que celebra a chegada de um transatlântico pela primeira vez a uma cidade, o grande homenageado foi Júlio Tedesco. Nesta temporada, Balneário Camboriú terá 20 paradas de navios de cruzeiro, trazendo 80 mil turistas. Um movimento intenso de navios, iates e barcos na Barra Sul.
“Imagine se a arquiteta Vera Mafra visse isso aqui hoje. Ela não ia acreditar”, sorri o vitorioso Júlio Tedesco.