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O que dizem especialistas sobre as mudanças de Bolsonaro para as regras de trânsito

Fim do exame para motoristas profissionais é um dos pontos mais polêmicos | Foto Eduardo Montecino/OCP News

Por: Elissandro Sutil

08/06/2019 - 05:06 - Atualizada em: 08/06/2019 - 09:55

Entregue nesta semana à Câmara dos Deputados, o projeto de lei do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que propõe mudar regras de trânsito, divide opiniões.

Uma das principais críticas à proposta é de abrandamento a algumas infrações de trânsito, como substituir para apenas uma advertência a multa pelo transporte incorreto de crianças de até dez anos em cadeiras especiais e o fim do exame toxicológico para motoristas profissionais de veículos pesados.

Para uma análise das principais propostas,  o OCP ouviu o advogado criminalista e professor de Direito Penal e Processo Penal da Católica de SC, Mario Cesar Felippi Filho, e o diretor de Trânsito e Transportes da Prefeitura de Jaraguá do Sul Gildo Martins de Andrade Filho.

Veja o que eles dizem sobre as principais propostas:

Aumento da validade da CNH

Para o professor Mario Felippi Filho, o aumento do prazo para a renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) é positivo. Além de diminuir a burocracia, o Estado também economizaria recursos financeiros e humanos para atender aos processos de primeiras habilitações e de renovação.

Projeto fala em dobrar a validade da habilitação dos atuais 5 para 10 anos | Foto: Doutor Multas

“Àquele que está apto a dirigir, não há necessidade de, no quinto ano seguinte – quando terá mais prática -, passar novamente por um processo de reabilitação. Isso apenas gera mais filas, gastos públicos, precisando de mais servidores públicos para atender às habilitações e renovações”, avalia.

Por outro lado, o diretor de Trânsito Gildo Martins de Andrade Filho avalia que a proposta de ampliar a validade da CNH traz riscos à segurança da população.

O objetivo de fazer a renovação a cada cinco anos, diz o diretor, é verificar se há alguma doença ou outra condição que comprometa a capacidade de dirigir. Com o espaçamento de dez anos, a situação se tornaria mais grave.

“Ou alguém acredita que um condutor, descobrindo uma moléstia, irá procurar o Detran para que seja diminuído o prazo de validade da CNH?”, questiona.

Fim do exame toxicológico

A nova proposta retira do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) o artigo que obriga os motoristas profissionais das categorias C, D e E a realizar o exame toxicológico na hora de fazer a habilitação ou renová-la.

Neste ponto, tanto o professor Mario Felippi Filho, quanto o diretor de Trânsito Gildo Andrade enxergam a proposta como um retrocesso para a segurança no trânsito.

Os dois apontam o fato de que há motoristas profissionais de veículos maiores e mais pesados, como caminhoneiros e motoristas de ônibus, que usam substâncias psicoativas para dar conta de jornadas longas de trabalho.

“Tirando a necessidade desse exame, vai haver talvez um incentivo maior a quem utiliza essas substâncias de continuar utilizando. E aí a chance de ocasionar acidentes é muito maior”, afirma o professor.

Dobrar limite de pontos para suspensão da CNH

O professor Mario Felippi Filho aponta duas visões sobre a proposta, que considera complexa. A primeira é de que ela atenderia a quem vê o Estado como uma “fábrica de multas”, mais interessado em arrecadar verba do que realmente conscientizar a população.

Foto Arquivo OCP News

Nesse ponto, o diretor de Trânsito Gildo Andrade acredita que a medida pode ter o efeito inverso. Para o motorista, o pior não seria pagar a multa, ainda que a contragosto. O que o cidadão não quer, ele diz, é perder o direito de dirigir ao atingir os 20 pontos.

“Com a nova pontuação os condutores pagarão a multa sem se preocupar com a possibilidade de terem o direito de dirigir suspenso. Em outras palavras, aumentará ainda mais a arrecadação de multas”, acredita o diretor.

Quanto ao segundo viés da proposta, apresentado pelo professor, é que ela poderia beneficiar motoristas infratores e imprudentes.

Trocar multa por advertência na falta de cadeirinha de transporte

Os especialistas defendem o uso da cadeirinha e do cinto de segurança para o transporte das crianças e reforçam a importância dessas medidas.

O diretor de Trânsito Gildo Andrade Filho acredita que a aplicação da multa é muitas vezes o principal motivo para os pais seguirem a regra do transporte seguro de crianças.

Já o professor Mario Felippi Filho defende a aplicação da advertência como uma oportunidade de conscientizar pais e responsáveis do uso das medidas de segurança.

No entanto, o advogado concorda com Andrade ao avaliar que, se a proposta apenas se limitar à advertência, ela terá pouco ou nenhum efeito prático. Para ele, o importante seria advertir primeiro, e então aplicar a multa nos casos de reincidência da infração.

Multas não resolvem. Especialistas defendem educação e conscientização de motoristas

Embora tenham visões diferentes sobre o projeto, tanto o professor Mario Felippi Filho quanto o diretor de Trânsito Gildo Andrade são críticos quanto a falta, no país, de ações de educação e conscientização no trânsito.

O professor Mario Felippi Filho avalia que, mesmo com as multas, as infrações de trânsito continuam acontecendo. Para ele, a grande solução para as infrações, acidentes e mortes no trânsito é a formação de motoristas mais conscientes. Apenas aplicar as multas não resolveria o problema.

Bastante crítico ao projeto, Andrade espera no entanto que as medidas tenham os efeitos desejados. “Contudo, num país onde não se educa para o trânsito não será de se admirar que, em razão das alterações propostas, tenhamos ainda mais violência no trânsito”, pontua.

 

Entenda o que o projeto quer mudar nas regras de trânsito:

  • Dobrar de 20 para 40 o limite de pontos na carteira, no prazo de um ano, que leva à suspensão do documento.
  • Aumentar a validade da CNH de 5 para 10 anos. Aos maiores de 65 anos, prazo para renovação passaria de 3 para 5 anos.
  • Substituir para apenas uma advertência a multa e infração gravíssima pelo transporte incorreto de crianças de até dez anos: até 7 anos e meio, as crianças devem andar na cadeirinha adaptada no banco de trás; até 10 anos, também no banco de trás, com cinto de segurança.
  • Retirar da lei atual a obrigatoriedade do exame toxicológico para habilitação e renovação da carteira de motorista de condutores profissionais das categorias C, D e E (como caminhoneiros e motoristas de van, ônibus e veículos conjugados).
  • Abrandar a punição para motociclistas que andam com capacete sem viseira ou óculos de proteção.
  • Aumentar tolerância – de 14 para 30 pontos, no prazo de um ano – para que motoristas profissionais das categorias C, D e E possam optar por um curso de reciclagem para zerar pontuação na carteira.
  • Incluir no CTB a menção a bicicletas e equipamentos motorizados, como as patinetes elétricas, para que o Contran regulamente quais veículos do gênero precisarão de registro, licenciamento ou emplacamento para poder circular, liberando os veículos motorizados leves dessa obrigação.

 

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Elissandro Sutil

Jornalista e redator no OCP