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Espionagem industrial: tudo que você sempre quis saber sobre o assunto

Por: Pedro Leal

27/02/2018 - 13:02 - Atualizada em: 27/02/2018 - 15:31

Polêmico, controverso e preocupante, considerado por especialistas como “a maior redistribuição de riqueza da era moderna” e responsável por mais de US$ 500 bilhões de prejuízos por ano, o tema da espionagem industrial foi foco na plenária da Associação Empresarial de Jaraguá do Sul (Acijs) desta segunda-feira (26).

A palestra do consultor de segurança, coronel Eugênio Moretzsohn, especialista em operações de inteligência pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), ocupou lugar de destaque na plenária.

Moretzsohn frisa que, embora possam ajudar, investimentos em tecnologia são uma parte menor do trabalho de segurança empresarial. “Temos que desmitificar esta questão da tecnologia e olhar para as pessoas, não adianta investir em tag, câmeras, sensores, todo um aparato de segurança sem ter educação continuada em segurança”, diz.

Pessoas são o ponto fraco dos segredos empresariais

De acordo com o militar, se engana quem pensa que os ataques de espionagem dependem de grandes apetrechos tecnológicos – não que estes não existam, como escutas ambientais e grampos telefônicos.

Os métodos mais usados são bem mais simples: engenharia social, focando em funcionários. “Isso começa muitas vezes com um contato direto, em momentos de confraternização como coffee breaks e coquetéis”, explica.

Estes ataques são facilitados pelo ambiente de descontração – especialmente quando álcool está envolvido. “Um erro que Hollywood comete é que espiões não tomam gin: eles tomam e oferecem Bourbon, uma bomba etílica para deixar o alvo bêbado e vulnerável mais rápido”, comenta.

Uma vez estabelecido o contato inicial, o espião mantém e fortalece o contato por outros meios – e nesse jogo, vale tudo: de relações profissionais a sexuais, para alimentar a confiança do alvo e fazer ele falar.

Redes sociais e até o lixo são úteis na espionagem

As redes sociais facilitaram muito o trabalho de inteligência. “Elas viraram livros abertos onde as pessoas postam informações em excesso que acabam sendo usadas não só por espiões, mas também por bandidos”, conta.

Outra coisa que “fala” muito é o lixo – revelando não só informações de trabalho, como de hábitos pessoais. Essas informações, muitas vezes acompanhadas de trabalhos de vigilância.

E onde uma aproximação amigável pode falhar, essas informações podem servir para forçar informações por outros meios: a chantagem, em cima de vícios, perversões sexuais e delitos que o alvo não deseja que venham à tona.

Medidas de segurança efetivas são simples

De acordo com o especialista, várias medidas de contra inteligência são baratas, de fácil aplicação e extremamente funcionais – e em sua maioria, envolvem educação dos funcionários.

“São coisas como normas sobre uso de equipamentos eletrônicos, uso de redes sociais, descarte de material, programas de educação continuada em segurança, medidas simples mas eficazes”, explica.

Uma medida a nível de gestão que é frequentemente negligenciada é a compartimentação de informações – “Que é o segredo da fórmula da Coca Cola: quem tem ela não tem a fórmula inteira, mas uma parte. Desta maneira, não se coloca todos os ovos na mesma cesta”, explica.

Outra, relacionada, é a determinação de níveis de acesso às informações. “Quem não precisa saber de um determinado projeto não tem que saber dele”, diz, destacando que os colaboradores precisam entender que sua falta de acesso não significa que a empresa não confie neles. Ao mesmo tempo, isso não pode cair no secretismo e deixar os funcionários sem saber no que estão trabalhando.

Outra medida importante e simples é a chamada função compliance, preparando pessoal para garantir o cumprimento das regras internas da empresa, assim como regras externas do mercado. Esse trabalho faz parte das medidas de contrainteligência – que incluem também corregedorias e investigações internas – ajudando a combater e detectar desvios.

Outra parte importante a ser cuidada é o monitoramento do chamado turn-over – a saída de funcionários da organização. “Quem sai da empresa sai com informações, e é importante monitorar essas pessoas por conta dessas informações”, diz, frisando que há casos em que funcionários são colocados de quarentena e retirados do serviço por um período antes de serem desligados oficialmente para que informações não caiam na mão da concorrência. “E é claro, se saiu da empresa brigado, ele vai estar mais disposto a falar”, destaca.

Em termos de segurança da informação, Moretzsohn recomenda a adoção das normas de segurança ISSO 27000 junto com regras simples sobre o uso de dispositivos móveis alheios a empresa. “Um ataque simples e eficiente é ‘abandonar’ um pen drive dentro da empresa, na esperança de que alguém o abra para ver o que tem dentro. Esse tipo de operação precisa ser feita em um computador que não esteja ligado na rede da empresa”, exemplifica.

Setor público é o maior alvo de espionagem no Brasil

Moretzsohn destaca que o Brasil tem um padrão de espionagem empresarial típico de países subdesenvolvidos, com estruturas políticas marcadas pela corrupção: onde nos chamados países de primeiro mundo a espionagem tende a se centrar nas etapas de desenvolvimento e pesquisa das empresas, aqui o trabalho ocorre fora do meio empresarial: o principal alvo da espionagem por parte de empresas são os setores de licitação de órgãos públicos.

Esse trabalho visa influenciar e “marcar” a redação de editais, se aproximando das pessoas responsáveis pela redação de forma que, ao ser publicado, ele saia com “as cores da empresa”. “É por conta desse jogo de cartas marcadas que temos tantos editais embargados”, explica.

Outro trabalho desempenhado com foco no setor público visa aproximar e elevar a imagem da empresa junto aos representantes do poder público, complementando (ou integrando) o trabalho de lobistas.

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Pedro Leal

Analista de mercado e mestre em jornalismo (universidades de Swansea, País de Gales, e Aarhus, Dinamarca).