Em pleno século 21, soa paradoxal que sociedades que se autoproclamam modernas e democráticas abram espaço para discursos que defendem a extinção do voto feminino, um direito conquistado a duras penas ao longo do século passado.
Esse fenômeno revela resquícios de estruturas patriarcais, além de fragilidades da democracia contemporânea. Do ponto de vista político, a democracia pressupõe igualdade de direitos e participação cidadã, mas, quando parte da sociedade questiona esse princípio, expõe-se a contradição entre o ideal democrático e as práticas de exclusão que persistem.
Sob a ótica sociológica, a permanência dessa visão regressiva está ligada a construções culturais e históricas que naturalizaram a subordinação feminina. Em tempos de polarização política e avanço de movimentos reacionários, o voto da mulher passa a ser usado como bode expiatório, associado, de forma preconceituosa, a mudanças sociais que certos grupos rejeitam.
É a tentativa de restaurar uma ordem hierárquica perdida, onde a mulher é relegada ao espaço doméstico e afastada da esfera pública.
Esse paradoxo não decorre apenas de ignorância, mas também de uma estratégia política: ao mobilizar discursos antifeministas, líderes populistas encontram um terreno fértil para reforçar identidades tradicionais e fidelizar segmentos sociais inseguros diante das transformações culturais.
A defesa do retrocesso, nesse sentido, não é apenas uma aberração ideológica, mas um sintoma da crise democrática: quando princípios básicos como igualdade de gênero se tornam negociáveis, a própria noção de cidadania universal se fragiliza.
Assim, a existência de tais discursos em democracias atuais escancara um dilema: ou se reforça a inclusão e a participação plena das mulheres, ou a democracia corre o risco de se tornar apenas uma fachada, capturada por forças ultraconservadoras que negam sua essência. O combate a esse retrocesso não é apenas uma questão feminista, mas, uma defesa da própria sobrevivência do ideal democrático.