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A adultização infantil

Foto: Freepik

Por: Raphael Rocha Lopes

12/08/2025 - 14:08 - Atualizada em: 12/08/2025 - 14:10

“♫ E agora é tarde, acordo tarde/ Do meu lado alguém que eu não conhecia/ Outra criança adulterada/ Pelos anos que a pintura escondia” (A cruz e a espada; RPM).

A crescente exposição infantil nas redes sociais, muitas vezes associada à sexualização precoce, tornou-se motivo de atenção urgente. Recentemente, o influenciador Felca, com mais de 4 milhões de inscritos no YouTube, lançou um vídeo longo e impactante denunciando esse fenômeno, provocando grande repercussão na sociedade como um todo, e resposta imediata do Legislativo federal, com a apresentação de novos projetos de lei sobre o tema.

Antes de entrar na discussão propriamente dita, ressalto que o debate sobre esse tema é urgente e importantíssimo, mas que tenho minhas ressalvas quanto a leis aprovadas no afogadilho para ficarem na crista da onda, com deputados mais interessados nos likes do que no resultado prático do que legislam.

A adultização infantil e o perigo da pedofilia

A adultização é um termo utilizado para um fenômeno social de exposição precoce de crianças e adolescentes a comportamentos, estéticas e responsabilidades próprios do mundo adulto, que, em regra, pode comprometer sua formação emocional e psicológica. No seu vídeo, Felca expôs casos concretos de crianças e adolescentes sendo utilizados em coreografias sensuais, cenas fora de sua faixa etária e manipulação por parte de algoritmos que ampliam essa exposição.

Com os algoritmos em ação (lembrem, meus caros leitores, lembrem sempre: as plataformas de redes sociais nunca perdem, apesar de algumas pessoas – por que será? – defenderem liberdade e desregulamentação totais para elas!!), essas imagens e vídeos erotizados ou sexualizados de menores acabam atraindo pedófilos para os perfis em que são expostos. E eles se tornaram extremamente organizados com a internet.

Se imagens inofensivas já são utilizadas por estas pessoas, imaginem a loucura quando têm propositadamente viés sexualizado. Felca tem razão: os adultos por trás disso devem responder severamente, independente das desculpas que criam para justificar seus atos.

Os projetos de lei

A repercussão do vídeo do Felca foi instantânea. Já ultrapassou 24 milhões de visualizações e mobilizou cidadãos e políticos. O presidente da Câmara, Hugo Motta, declarou que pautará os debates já nesta semana, ressaltando a urgência da proteção digital.

Foram, esta semana, apresentados diversos projetos de lei, de políticos de todas as cores ideológicas. Alguns propõe a restrição ao uso infantil na criação de conteúdo remunerado e exposição de crianças a vídeos com potencial de exploração sexual; outros criminalizam a adultização e a exploração lucrativa da imagem infantil e obrigam as plataformas digitais a criarem mecanismos efetivos de detecção e remoção, impondo multas altas pelo descumprimento.

Também há projetos para tipificar criminalmente a erotização infantojuvenil, com agravantes em casos de relação de autoridade ou uso de redes sociais.

Já há mais de 20 projetos (entre novos e antigos) tramitando no Congresso Nacional.

O papel da sociedade

O alerta do influenciador digital atingiu milhões de brasileiros e tocou, ainda que com as ressalvas que fiz no início do texto, alguns parlamentares. Mais do que conteúdo chocante, a denúncia revelou uma ferida aberta: a fascinação do digital por corpos e imagens infantis.

A legislação em debate deve preencher essa lacuna, protegendo a infância com ferramentas jurídicas reais, coerentes e ágeis, criminalizando práticas abusivas e responsabilizando as plataformas.

Mas a lei é apenas parte da solução. É preciso, como sempre digo, envolver família, escola (especial e fundamentalmente as escolas) e sociedade civil, e recusar a ideia de que a infância pode ser moldada como engajamento, trending ou curtida.

 

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Raphael Rocha Lopes

Advogado, autor, professor e palestrante focado na transformação digital da sociedade. Especializado em Direito Civil e atuante no Direito Digital e Empresarial, Raphael Rocha Lopes versa sobre as consequências da transformação digital no comportamento da sociedade e no direito digital. É professor da Faculdade de Direito do Centro Universitário Católica Santa Catarina e membro da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs.