No Brasil, cerca de 90% das empresas têm perfil familiar, respondendo por 75% dos empregos gerados no país e por mais de 65% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo levantamento do Sebrae com base em dados do IBGE. Apesar de sua expressiva participação na economia, grande parte dessas empresas enfrenta dificuldades para garantir a continuidade dos negócios ao longo das gerações.
Para o economista João Victor da Silva, analista de mercado da Orsitec, a profissionalização da gestão é hoje o fator mais determinante para a sustentabilidade dessas organizações. “Avaliar uma empresa é tanto ciência quanto arte. Mas, na prática da gestão, não há espaço para amadorismo. Profissionalizar é uma necessidade estratégica, não uma opção”, afirma.
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É comum ver empresas familiares crescerem com rapidez, saindo do pequeno porte e atingindo faturamentos significativos em uma ou duas gerações. Contudo, esse avanço costuma ser acompanhado de tensões internas, especialmente quando o fundador, acostumado ao controle direto de todas as decisões, se vê diante da necessidade de delegar funções e adotar práticas mais técnicas.
“Empresários que construíram negócios com base na intuição e no esforço pessoal precisam entender que, em um cenário de competição globalizada, isso não é mais suficiente. As decisões devem ser sustentadas por dados, planejamento e análise de risco”, destaca João Victor. Ele lembra que a ausência de uma estrutura profissional pode expor o negócio a riscos financeiros, operacionais e estratégicos.
Concorrência digital e perda de mercado
A urgência da profissionalização é ainda maior quando se leva em conta o novo cenário de mercado, impulsionado pelo digital. O avanço do e-commerce e a consolidação de plataformas de serviços online reduziram drasticamente as barreiras geográficas entre empresas e consumidores. “Hoje, uma pequena livraria em cidade do interior pode estar competindo diretamente com a Amazon. Uma clínica local, com médicos de São Paulo via telemedicina. A competição não é mais só com o vizinho da esquina”, ressalta o economista.
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Nesse ambiente, o improviso dá lugar à necessidade de processos estruturados. “Reduzir o empirismo é fundamental. Um erro de cálculo, que antes era contornado com esforço pessoal, hoje pode comprometer toda a operação. Não se trata de abandonar a intuição, mas de complementá-la com dados e estratégia”, reforça.
Gestão qualificada e cultura organizacional
Uma etapa decisiva para a transição é a formação de uma equipe qualificada. Embora muitos empresários relutem em ampliar o setor administrativo por medo de elevar custos, João Victor defende que profissionais experientes agregam valor ao negócio. “Uma equipe técnica enxuta, bem treinada e com clareza de funções pode reduzir erros, otimizar processos e fortalecer a cultura de planejamento. É um investimento que se paga no médio e longo prazo”, afirma.
O economista destaca que a falta de profissionalização sobrecarrega os sócios-diretores e atrasa o desenvolvimento organizacional. “Quando tudo depende de uma ou duas pessoas, o risco aumenta exponencialmente. É preciso distribuir responsabilidades e criar uma estrutura que sustente o crescimento.”
Governança e sucessão: o calcanhar de aquiles das empresas familiares
Outro ponto sensível é a governança e o planejamento sucessório. Sem uma estrutura societária clara, que separe interesses familiares e empresariais, conflitos se intensificam e a gestão se torna ineficiente. “Misturar finanças pessoais com os recursos da empresa é um dos maiores erros. Isso gera distorções e decisões equivocadas que comprometem a saúde financeira do negócio”, alerta João Victor.
Para ele, a definição de funções claras para membros da família e a preparação de herdeiros para assumir responsabilidades são etapas indispensáveis. “É preciso avaliar se os herdeiros têm preparo e interesse. Quando isso não acontece, o ideal é considerar a contratação de executivos externos. O apego ao sobrenome, se não vier acompanhado de competência, pode ser fatal”, conclui.