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Guerreira não, sobrecarregada

Por: OCP News Jaraguá do Sul

11/05/2025 - 06:05

Por Francine Sevignani
Jornalista e mãe atípica

Eu amo os meus filhos, mas ser mãe é muito difícil. Toda vez que expresso isso levo reviradas de olhos, erguidas de sobrancelhas e expressões de espanto. Mas, a verdade nua e crua é esta: é difícil maternar e conheço pouquíssimas mães que falam abertamente disso.

A maternidade é exaustiva, sufocante, enlouquecedora e solitária. Na vida real, não tem filtro de Instagram que salve, nem música capaz de esconder tanto grito e tanto choro. Na atípica então, o cenário é ainda mais desafiador. Estudos já apontaram que o cansaço físico e o estresse de uma mãe atípica são iguais aos de um soldado em guerra. Sintomas de trauma como ansiedade e distúrbios do sono são comuns, principalmente pelo estado constante de alerta. É como viver em meio a um campo de batalha, lutando pelo desenvolvimento do filho ao mesmo tempo em que se luta por um sistema social que deveria funcionar.

O relacionamento é outra grande dificuldade. Pesquisas também mostram que casamentos onde existe uma criança com neurodiversidade têm uma taxa de divórcio muito maior, em média, 70% acabam dentro de cinco anos após o diagnóstico. Eu entrei para a estatística.

A verdade é que não faltam estudos e números que comprovem uma realidade alarmante e ainda assim negligenciada: a sobrecarga materna, carregada de responsabilidades e culpa. Uma conta que nunca fecha para a mãe que precisa se desdobrar entre os cuidados básicos com o filho, as tarefas domésticas e a pressão no mercado de trabalho.

Na atipicidade, as cobranças são cruéis. Levar e buscar o filho nas terapias, participar de reuniões frequentes nas escolas, lidar com a falta de respeito das pessoas, brigar por direitos básicos do filho, lidar com a ausência paterna e com a falta de uma rede de apoio, equilibrar a carreira profissional e ainda enfrentar os julgamentos de uma sociedade machista, hipócrita e injusta. Não há sanidade mental que dure, apenas mães cansadas, deprimidas, doentes, com baixa autoestima e que perderam a própria identidade enquanto mulher, enquanto indivíduo.

Pai não é rede de apoio

Se por um lado a maioria dos casamentos com filhos atípicos acabam, por outro, os que continuam podem trazer à tona outro grande problema: a maternidade solo, dentro de um relacionamento.

Muitas mães atípicas relatam a frustração que sentem com o parceiro. Após o diagnóstico, muitos utilizam o emprego como um “escape” para não precisar lidar com a deficiência ou transtorno do filho. Passam menos tempo em casa, não participam de reuniões escolares, não participam das terapias, e não buscam conhecimento sobre a condição do filho. Até mesmo em movimentos sociais, como grupos de acolhimento, são sempre a minoria. Com isso, a mãe precisa abrir mão do próprio trabalho, da própria vida, para se dedicar somente à vida do filho e, de bônus, a do marido.

Por isso, insisto em dizer que não são os filhos que adoecem as mães atípicas, é o sistema que tenta esconder todos os prejuízos causados pela sobrecarga materna por meio da romantização que no fim, não serve para nada.

Não precisamos do título de guerreiras. Precisamos de rede de apoio, políticas públicas eficientes para os nossos filhos e para nós e que os parceiros compartilhem equitativamente as responsabilidades domésticas e de cuidado. Precisamos de ajuda. Quando é você quem cuida, quem cuida de você?

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OCP News Jaraguá do Sul

Publicação da Rede OCP de Comunicação