Era uma terça-feira qualquer e o aplicativo de inteligência artificial instalado no celular enviou uma notificação: “Você pagou imposto demais este mês. Deseja ver onde está o erro?”. Com linguagem clara e objetiva, abriu uma tela com gráficos, cruzamentos de dados fiscais, artigos de lei aplicáveis e até sugestões de regimes tributários mais vantajosos. Em poucos segundos, era possível compreender tudo: quanto foi pago, por que foi pago, o que poderia ser pago — e o que jamais deveria ter sido recolhido. Sem surpresas, sem sustos, sem burocracia.
Pena que, por enquanto, isso ainda é apenas um exercício de imaginação. O cenário real é bem diferente. O sistema tributário brasileiro segue como um dos mais complexos do mundo, repleto de regras sobrepostas, exceções confusas e obrigações acessórias que mudam conforme o Governo da vez. E, enquanto isso, muitas empresas seguem recolhendo tributos a maior ou equivocadamente, não por excesso de zelo, mas por insegurança — como se errar fosse inevitável e compreender o sistema, um privilégio.
A tão esperada reforma tributária traz promessas de simplificação, mas não basta reorganizar tributos ou reduzir siglas. Sem transparência, tecnologia e compromisso institucional com a previsibilidade, a reforma corre o risco de apenas suavizar o caos absoluto. Para que funcione, é preciso ir além: é necessário permitir que todos compreendam com clareza quanto e por que estão pagando.
É nesse ponto que a inteligência artificial pode desempenhar um papel transformador. Bem utilizada, ela pode ser o elo entre os princípios constitucionais e a prática tributária cotidiana. Isonomia, capacidade contributiva, vedação ao confisco, seletividade e transparência deixam de ser apenas promessas normativas e passam a ser verificáveis, mensuráveis e acessíveis. A IA pode alertar sobre excessos, sugerir melhorias e garantir que o Contribuinte esteja diante de um sistema compreensível, e não de um enigma jurídico.
A tecnologia já existe. O que falta é vontade — política e institucional — para colocá-la a serviço da justiça fiscal. Se essa convergência acontecer, o futuro tributário será não só mais eficiente, mas também mais justo. E quem sabe, enfim, a maior inovação seja um sistema tributário realmente transparente e lógico.
Por
Dr. Celio Dalcanale.
OAB/SC: 9.970
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