Os deputados que analisam o primeiro texto de regulamentação da reforma tributária vão apresentar relatório até quinta-feira (3) em que incluirão carne bovina, de frango e peixe na nova cesta básica. Os produtos da cesta terão alíquota zero dos novos Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços, instituídos pela emenda constitucional da reforma e que passam a vigorar a partir de 2027.
Outros itens, como o sal, que também ficou de fora da lista apresentada pelo governo federal em abril, também podem ser incluídos, mas ainda dependem de negociação.
Pela versão original do projeto de lei complementar (PLP) 68/2024, encaminhado pelo Ministério da Fazenda, proteínas bovina, suína, ovina e caprina, além do sal, teriam uma alíquota reduzida em 60% em relação à taxação padrão.
Para evitar que a isenção dos produtos eleve a alíquota padrão dos novos tributos, estimada em 26,5% – uma das mais altas do mundo –, os parlamentares pretendem ampliar a lista de bens e serviços sobretaxados com o Imposto Seletivo (IS).
Apostas esportivas e carros elétricos devem aparecer no rol de itens abrangidos pelo IS, também chamado de “imposto do pecado” por incidir sobre produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
A lista original, proposta pelo governo, inclui cigarros, bebidas alcoólicas, carros à combustão, aeronaves, embarcações, bebidas açucaradas, petróleo, gás natural e minério de ferro.
Na segunda-feira (1º), os parlamentares que integram o grupo de trabalho da Câmara que analisa o projeto de regulamentação foram recebidos pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para apresentar as propostas de mudança.
O grupo é formado pelos deputados Claudio Cajado (PP-BA), Reginaldo Lopes (PT-MG), Hildo Rocha (MDB-MA), Joaquim Passarinho (PL-PA), Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Moses Rodrigues (União-CE) e Luiz Gastão (PSD-CE).
Uma versão prévia do relatório deve ser levada nesta quarta-feira (3) ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e ao Colégio de Líderes da Casa, segundo Cajado. A ideia é que o relatório seja publicado na quinta-feira (4) e vá ao plenário na próxima semana.
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse confiar que a votação da regulamentação da reforma na Câmara deve ser concluída antes do recesso parlamentar, que tem início no próximo dia 18.
Em pouco mais de um mês, os deputados já ouviram, em audiências públicas e reuniões internas sobre a proposta, mais de mil pessoas, entre economistas, tributaristas, cientistas políticos, além de representantes de ministérios, de setores específicos da economia e de centrais sindicais.
As demandas foram as mais diversas. A Associação Nacional das Indústrias de Vinagre (Anav), por exemplo, pede a inclusão do produto na cesta básica nacional, que terá isenção do IBS e da CBS.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) defende que também tenham alíquota zero itens como sal, carnes, óleos, gorduras, sucos naturais, castanhas e nozes, molhos preparados e condimentados, biscoito, bolos, chá e mate.
Em debate sobre o futuro sistema de cashback, vários participantes defenderam a ampliação do valor do imposto devolvido para famílias inscritas no Cadastro Único de Programas Sociais (CadÚnico).
No projeto original, o governo previu 100% de cashback da CBS, que é federal, na compra de botijão de gás, e 50% da CBS no pagamento de contas de luz, água e gás encanado. Os demais produtos teriam 20% da CBS.
Já o percentual de devolução do IBS partiria de 20%, mas poderia ser ampliado por estados e municípios em legislação própria.
Na audiência, o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) disse que pediu ao Ministério da Fazenda uma simulação do impacto de ampliar o cashback da CBS para as contas residenciais de 50% para 100% e do impacto de elevar de 20% para 50%, no caso dos demais produtos.
Na semana passada, em discussão específica sobre o Imposto Seletivo (IS), o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerante e Bebidas não Alcoólicas (Abir), questionou os efeitos da inclusão de produtos açucarados no rol de itens a serem sobretaxados.
“Pela Pesquisa de Orçamentos Familiares [POF, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística], somente 1,7% de toda a ingestão calórica do brasileiro vem de bebidas açucaradas”, disse. Um levantamento feito pelo PoderData a pedido da entidade aponta que 73% da população é contra o aumento de impostos sobre refrigerantes e refrescos.
Em nome do Ministério da Saúde, Letícia Cardoso, diretora do Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis, defendeu o imposto para o setor.
De acordo com ela, doenças crônicas não transmissíveis como obesidade, diabetes e complicações cardiovasculares matam cerca de 760 mil pessoas no Brasil anualmente, e estudos demonstrariam que os preços desestimulam o consumo de bebidas açucaradas.
Na discussão sobre alcoólicos, que também terão incidência do Imposto Seletivo, houve divergência entre representantes dos setores cervejeiro e de bebidas destiladas. Márcio Maciel, presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindicerv), defendeu a manutenção da atual carga tributária, mas solicitou que o “imposto do pecado” deixe de ser recolhido de cervejarias pequenas, inscritas no Simples Nacional.
Já o presidente da Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD), José Eduardo Cidade, pediu que a regra prevista no PLP 68, que estabelece alíquotas maiores para produtos com maior teor alcoólico, seja revista. Ele destacou que a cerveja responde por mais de 90% do consumo de álcool no país, mas que as empresas do setor que representa acabam pagando mais impostos.
Luiz Carlos Moraes, vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), questionou a incidência do Imposto Seletivo sobre carros. Segundo ele, a indústria automotiva tem investido em inovação de modo a reduzir a emissão de gases de efeito estufa.
Representando o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviço (MDIC), Margarete Maria Gandini, no entanto, defendeu que até mesmo veículos elétricos também entrem na lista dos produtos sobretaxados em razão da bateria.
Setores de extração mineral, como petróleo e ferro, são contra a nova taxação por considerar que haverá impacto na competitividade do país no exterior. Já a Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo), representada na reunião por Edmilson Alves, argumenta que tributar mais o cigarro vai estimular o contrabando.
Houve ainda quem defendesse a cobrança do Imposto Seletivo de outros produtos, como alimentos ultraprocessados, armas e munições, agrotóxicos e jogos eletrônicos.
Na segunda-feira, após reunião com Haddad, Reginaldo Lopes disse que o grupo está conseguindo atender cerca de 70% das demandas recebidas em audiências com a sociedade.
O PLP em questão é apenas o primeiro que regulamenta a reforma tributária, cuja parte constitucional foi aprovada e promulgada no fim do ano passado pelo Congresso.
No início de junho, o governo apresentou um segundo projeto que trata especificamente da instituição e do modelo de funcionamento do Comitê Gestor do IBS, que será responsável por administrar e distribuir os recursos arrecadados entre estados e municípios.
Durante viagem a Portugal na semana passada, o presidente da Câmara, Arthur Lira, afirmou acreditar que a votação dos projetos deve ocorrer nas próximas semanas. “Não penso que haverá, a princípio, nenhum tipo de problema que possa postergar essa votação”, disse.
* Informações da Gazeta do Povo.