Quando se fala em golpe de Estado, imediatamente imaginamos tanques nas ruas, militares fardados tomando o poder com a ajuda das tropas, presidentes sendo depostos e dissidentes fugindo para o exílio, sendo presos ou até mesmo mortos. O que ninguém imagina, com certeza absoluta, é encontrar como protagonista uma mãe de duas crianças armada com um batom, respondendo pelo crime hediondo de escrever “Perdeu, mané” em uma estátua.
Mas essa é exatamente a situação de Debora Rodrigues dos Santos, mãe, cabeleireira e evangélica batista, cujo único crime, o de pichar a estátua da Justiça na frente do Supremo Tribunal Federal (STF) com um batom no dia 8 de janeiro, foi reclassificado como golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, associação criminosa armada, deterioração de patrimônio tombado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União.
Quem diria que seria possível derrubar um governo com um mísero batom? Essa perigosa arma só pode ser a única coisa capaz de explicar o fato de que Debora está presa há exatos um ano e dois meses, desde março de 2023. Nesse período, Debora ficou 420 dias presa sem denúncia, quando o prazo legal máximo é de 35 dias. Mesmo depois de denunciada, continuou presa.
A defesa já tentou de tudo: 8 pedidos de liberdade provisória ou prisão domiciliar de Debora foram negados pelo ministro Alexandre de Moraes, que viola não só as leis como os precedentes do próprio Supremo. Com certeza o ministro conhece um precedente do STF, de 2018, que concedeu habeas corpus coletivo para todas as presas preventivas do Brasil que são mães de filhos de até 12 anos de idade – mesma situação de Debora. Será que se ela fosse uma traficante, uma homicida ou uma corrupta, ela já não estaria nas ruas, livre, leve e solta?
A decisão do Supremo seguiu a regra do art. 318 do Código de Processo Penal, que garante o direito de mães de cumprirem a pena ou serem detidas em prisão domiciliar, mas como Debora é uma “golpista”, “bolsonarista” ou “extrema-direitista” é como se ela não tivesse mais direito fundamental algum. O único direito que ela tem é de sofrer calada, de fazer um sacrifício “em nome da democracia”, longe de seus filhos pequenos. Afinal, se não for isso, o que explica a absoluta diferença de tratamento entre Debora e outras presas?
O que explica, na verdade, é uma coisa só: são decisões políticas tomadas por políticos de toga. Eles só fazem política, não mais justiça. Nesse cenário, é inócuo procurar solução no Direito. A única solução é política, e depende de eu e você ficarmos indignados o suficiente nas redes sociais e nas ruas até que o Senado – que tem o poder de aprovar o impeachment de ministros do Supremo – faça alguma coisa. A família de Debora, assim como milhares de outras famílias dos réus do 8 de janeiro, está pedindo socorro. Mais ainda: a Constituição e a lei pedem socorro. O Senado irá ouvir?