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Enciclopédia de páginas em branco

Foto: divulgação

Por: Raphael Rocha Lopes

16/04/2024 - 10:04 - Atualizada em: 16/04/2024 - 16:01

“♫ Tá no livro, tá escrito/ No sítio do pica-pau/ Pedrinho me fez visconde/ Sabugo de milho intelectual” (De Sabugo a Visconde; Lenine).

Para quem, eventualmente, não sabe o que é uma enciclopédia, dá para definir, resumidamente, como uma coleção de livros que traz, de maneira organizada e metódica, os conhecimentos humanos em ordem alfabética ou por temas.

Tenho o privilégio de ser filho de pais preocupados com a educação dos filhos. E mais privilégio ainda por ter um pai fã de enciclopédias. Lembro de algumas lá em casa dos tempos de criança: Novo Tesouro da Juventude; Delta Universal; Delta Júnior. Talvez mais alguma que não lembro o nome. Eu as lia. Gostava de, aleatoriamente, pegar um volume e aprender sobre história, ciência, cultura. E ainda existiam as mais famosas (e caras): a Barsa, a Britânica. Provavelmente itens de colecionadores hoje em dia.

Atualmente as pessoas levam celulares para o banheiro; naquela época eu levava tomo de enciclopédia. A propósito, fica a dica: nesse link esclareço por que eu não levo – e você não deveria levar – celulares para o banheiro. Ainda que você não acredite ou ache um exagero o que explico nesse vídeo, convenhamos que um percentual bem considerável das pessoas fica nos joguinhos nesses momentos de extrema intimidade.

Voltando às enciclopédias: será que alguém ainda as usa?

A nova enciclopédia.

Aquelas enciclopédias lá de casa estão, hoje, em alguma prateleira ou caixa na casa de praia dos meus pais. Elas facilitaram muito minha vida na época do colégio. Trabalhos da escola em grupo normalmente eram realizados lá em casa, pois dividíamos as tarefas para o desenvolvimento do conteúdo. Um exercício coletivo de encaixes.

Hoje o dr. Google resolve tudo. Afinal, como diz o ditado moderno, se não está no Google, não existe. O Google que superou (leia-se engoliu) todos os sites de pesquisa do mundo (quem aqui lembra ou já usou AltaVista, Cadê, Aonde?), inclusive os que ainda sobrevivem, como o Bing. Yahoo, DuckDuckGo, entre outros.

Seria o Google a nova enciclopédia? Ocorre que agora ela está ameaçada pelas tais inteligências artificiais. Nem vou entrar, aqui, no mérito dos problemas de direitos autorais e de informações duvidosas que os aplicativos ChatGPT, Bard e afins podem trazer em seu âmago. O fato é que tem crescido o número de alunos se aproveitando desta tecnologia para suas atividades escolares, com professores pouco preparados para enfrentar o desafio (isso quando não se rendem temerariamente às facilidades dessas IAs).

Páginas em branco.

São as IAs de pesquisas e respostas as novas enciclopédias com páginas em branco?

Sou do tempo em que os trabalhos eram manuscritos. Simplesmente não havia computadores pessoais nas escolas e muito menos em casa. Eu lia as enciclopédias e resumia ou fazia um condensado das várias fontes e escrevia nas folhas de papel almaço com pauta (quem aí é desse tempo?). Os mais preguiçosos só copiavam o texto. Mesmo assim, dificilmente não aprendiam nada, pois tinham que transcrever.

Atualmente, as crianças estão perguntando a tabuada para a Alexa (será que professores ainda cobram tabuada?) e os adolescentes pedindo para o ChatGPT desenvolver as pesquisas de escola, passando para o sistema com um control C control V.

Estranhamente (ou não, claro que não), as escolas dos magnatas da tecnologia, no Vale do Silício, em regra não usam computadores ou internet. Está na hora de pensarmos isso por aqui em vez de gastarmos dinheiro nas escolas públicas com mini computadores ou tablets entregues a crianças que não tem internet em casa e que ficam ultrapassados rápido.

Sem contar que a falta de aulas de caligrafia está trazendo problemas de coordenação (entre outros) para as crianças. Mas isso é assunto para outra conversa.

 

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Raphael Rocha Lopes

Advogado, autor, professor e palestrante focado na transformação digital da sociedade. Especializado em Direito Civil e atuante no Direito Digital e Empresarial, Raphael Rocha Lopes versa sobre as consequências da transformação digital no comportamento da sociedade e no direito digital. É professor da Faculdade de Direito do Centro Universitário Católica Santa Catarina e membro da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs.