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Prisões ilegais de Moraes mostram democracia castigada

Por: Deltan Dallagnol

10/01/2024 - 06:01 - Atualizada em: 17/01/2024 - 15:48

“Temos encontro marcado com essas alongadas prisões que se determinam em Curitiba”, disse o ministro Gilmar Mendes, em 7 de fevereiro de 2017, durante um julgamento da operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Sete anos depois, no dia 8 de janeiro de 2024, na festa lulista chamada “Democracia inabalada”, não se ouviu uma palavra do ministro Gilmar Mendes sobre as prisões preventivas alongadas decretadas pelo seu colega de STF, o ministro Alexandre de Moraes, contra investigados pelos atos do 8 de janeiro.

Um ano depois, 65 pessoas ainda estão presas preventivamente sem terem sido julgadas. Apenas 33 foram denunciadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR), de modo que há pelo menos 32 pessoas presas há um ano sem denúncia. Em 18 anos como procurador da República, não vi nem mesmo grandes traficantes como Fernandinho Beira-Mar ficarem presos tanto tempo sem serem denunciados. O mesmo pode ser dito de estupradores, assassinos, corruptos, pedófilos e outros traficantes de alta periculosidade.

O prazo máximo da prisão sem denúncia é de um mês e 10 dias, o que foi rigorosamente cumprido na Lava Jato. Nos casos do 8 de janeiro, o prazo está sendo excedido em mais de 10 vezes, mais de 1000%, o que a lei define como crime de abuso de autoridade. Além disso, o art. 312 do Código de Processo Penal exige que a prisão preventiva só seja decretada se houver, entre outros elementos, a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria. Eles são condição necessária para a prisão.

Esses dois requisitos são os mesmos requisitos legais – neste caso, são condição necessária mas também suficiente – para a apresentação de uma denúncia, que é a acusação formal feita pelo Ministério Público para que alguém possa ser julgado pela prática de crimes. Logo, se há pessoas presas há um ano sem denúncia, é porque o Ministério Público não encontrou prova da existência do crime e indícios de autoria, o que é condição necessária para as prisões. Ou seja, não há fundamento nem para a denúncia e nem para a prisão preventiva, o que demonstra que essas alongadas prisões de Alexandre de Moraes são absolutamente ilegais.

Ao contrário do que ocorre agora, a crítica de Gilmar à Lava Jato era vazia, porque as prisões preventivas foram decretadas de acordo com os prazos e as exigências legais. Além disso, era dada prioridade ao julgamento dos réus presos, de modo que em menos de um ano já havia sentença. Todos os réus e investigados da Lava Jato tinham, ainda, ampla possibilidade de recorrer às outras 3 instâncias do Poder Judiciário para que sua prisão fosse reexaminada, um direito que os réus do 8 de janeiro não têm.

Além de não terem ninguém a quem recorrer, já que estão sendo julgados pelo STF, última instância do Judiciário – mesmo sem terem foro privilegiado – os réus do 8 de janeiro sofrem com outros abusos, como a violação do juiz natural, a ausência de provas e de individualização de condutas, penas exageradas (acima até mesmo da de homicidas e condenados no Mensalão) e o julgamento pela mão de juízes que se consideram vítimas dos crimes do 8 de janeiro, o que deveria gerar o impedimento desses juízes, se houvesse algum respeito aos direitos fundamentais individuais e ao devido processo legal.

Que democracia é essa que se está exaltando, se um de seus propósitos centrais, a proteção dos direitos fundamentais, é erodido todos os dias? O silêncio de Gilmar Mendes e dos ministros e “juristas” garantistas sobre os abusos judiciais do STF diz muito: são uma prova recorrente de que as críticas à Lava Jato nunca foram para proteger os direitos fundamentais, mas sim os donos do poder.

E agora vemos o 8 de janeiro ser usado pelo sistema para garantir a blindagem e a impunidade geral dos grandes corruptos brasileiros, que agora posam de “defensores” e “salvadores” da democracia. Quem critica o sistema ou seus atores e busca seu aperfeiçoamento é facilmente taxado de “antidemocrático”. Muitos desses corruptos participaram da festa lulista do último dia 8, a da tal “democracia inabalada”. Ou seria, na verdade, democracia castigada?

 

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