De pés descalços

Por: Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

29/12/2023 - 13:12 - Atualizada em: 29/12/2023 - 13:24

Eu não gostava muito de andar descalça…

Mas, atualmente, eu gosto de andar descalça; pela casa, pelo chão, durante a yoga, pela areia, pela vida. E, principalmente, pelos caminhos que os meus sonhos criam todos os dias, amparados pela minha fé.

Desde que fui mãe, passei a me transformar. A andar descalça. Sem salto alto. A caminhar comigo e com minha fé. A aproveitar os momentos presentes, com simplicidade e alegria, agradecendo cada oportunidade.

Digo desde que fui mãe, porque este ano eu entendi: renasci ao tornar-me mãe. Contudo, para que esta Ana Kelly renascesse a outra precisou morrer. Muito do que hoje se transformou em meu interior é resultado do processo de transformação vivenciado desde então… Quem é mãe deve me compreender.

Continuo guardando comigo as boas, doces – e, também, amargas – lembranças, que me impulsionam quando a vida me espreme. Assim, encontro um lastro de esperança que me fortalece e ampara em muitos períodos.

Aliás, sempre pensei que eu carecia de força (física). Mas, igualmente, tenho descoberto minha força (física e psíquica). Todavia, sigo economizando-a, e procurando preservá-la para quando eu mais necessitar… Pois há dias em que eu tenho de acessar (e muito!) a reserva de força e energia!

Nesse ínterim, enquanto a vida corre seu fluxo, lanço-me a ela, por meio de interações mil: de boas leituras, da escrita – inclusive escrevendo meus textos –, de inúmeras anotações e listas de coisas pra fazer (anoto tudo!), de viagens, de contemplações da natureza e observações cotidianas… da lua e das estrelas no céu.

Invento tanto que devo cansar quem está a minha volta! Invento coisas profissionais e pessoais… e movimento a vida de quem está ao meu redor, com passeios, anseios, viagens, esportes, lazer, reuniões, mesa posta e cheia, e seguimos desbravando novos roteiros e, ao mesmo tempo, desfazendo-os, porque no meio do caminho sempre encontramos o imprevisível e temos de renunciar a algumas certezas para fluir junto à vida.

Sou pequena. Sempre pareci frágil e delicada. Voz mansa (num Colégio recebi, certa vez, sugestão para me impor mais por meio da voz, pois “a aparência já era de menina”). No entanto, sem que eu me dê conta, surgem tantas de mim que nem eu mesma consigo entender ou calcular… Imagina, então, os que estão ao meu redor?!

Bom, certo é que sou muitas. Intensamente. Mas muitas que amam. E o meu coração? Ah, meu coração! Só quem convive sabe! É cheio de amor, sorrisos, apertos, poesia, romantismo, idealismo, letras, histórias, curiosidades, música, dança, alegria, cheiros, inquietudes, desejos e medos… Além de um quentinho cheinho de pessoas e lugares com os quais me relacionei; convivi, convivo, aprendi e aprendo.

Enfim, mudei. Algumas vezes sem querer e outras por querer. Sigo amando estar descalça, embora às vezes eu me coloque “toda-toda” num salto e me junte à fluidez de dado momento mais glamouroso. Porém, vou consciente de quem sou, de quem quero continuar sendo, sorridente para com os meus pezinhos e meu percurso… Acolhendo-me e amando cada nova rota que se abre a minha frente, desnudando-me de amarras e entraves, pois, assim, continuarei a desbravar mais de mim mesma e desse mundo de infinitas possibilidades que se apresenta todos os dias para quem está vivo; quer senti-lo e tocá-lo! Uno-me à vida e, junto dela, descalço-me de determinadas “prisões e imposições” para sentir, amar, perdoar, rezar, agradecer e pertencer!

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Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

Doutoranda em Linguística pela UFSC, atua como professora de Língua Portuguesa e Redação e escritora, membro da Academia Desterrense de Literatura, ocupante da cadeira 6. É autora de livros e artigos na área da Língua Portuguesa, Literatura e Educação.