“Onde há luz, a sombra não prevalece” – um dito comum que nos lembra da importância da claridade em meio à escuridão. Uma democracia sólida e confiável não é construída com cortinas de sigilo, mas com pilares de transparência. Recentemente, a aprovação do advogado Cristiano Zanin para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Senado, em votação secreta, trouxe à tona uma questão que temos negligenciado em nosso sistema democrático: a falta de transparência. Uma questão que se torna especialmente preocupante quando consideramos o impacto das decisões do STF na vida de milhões de brasileiros.
O STF deveria ser nossa maior fortaleza jurídica. É a última instância do poder judiciário, incumbida da missão sagrada de fazer valer a Constituição. Assim, cada nova nomeação não é um simples movimento no tabuleiro do poder, mas um terremoto que pode mudar o terreno da nação. Tal peso desaba sobre os ombros de nossos representantes no Senado.
Contudo, vimos o Senado aprovar a nomeação de Zanin para o STF, onde poderá permanecer até 2050. Apenas 22% dos brasileiros aprovavam seu nome, segundo pesquisa da Genial/Quaest divulgada nesta semana. Mais de metade dos brasileiros desaprova a escolha. Como já disse antes da indicação, a escolha de Zanin não atende a exigência constitucional de notório saber jurídico, caracteriza estelionato eleitoral diante da quebra de promessa de campanha de Lula, fere a impessoalidade e a moralidade, coloca o interesse privado acima do público e caracteriza desvio de finalidade.
No entanto, o voto decisivo dos senadores é lançado na escuridão do sigilo. A aprovação do nome por 58 votos a 18 gerou perplexidade dos eleitores que esperavam algo diferente de um Senado em grande medida conservador. Embora o sigilo do voto pareça um escudo para proteger a independência dos senadores, na verdade, age como uma cortina de fumaça no teatro da democracia. Como podemos avaliar a atuação de nossos protagonistas se seus roteiros são mantidos em segredo? Como podemos responsabilizá-los por suas ações se o seu palco é coberto pela escuridão?
O voto secreto é um quebra-cabeças em que falta peças. É como pedir aos nossos filhos para confiarem em nós enquanto tomamos decisões que moldam suas vidas, sem nunca mostrar-lhes o porquê. Essa prática distorce a realidade, transmitindo a mensagem equivocada de que decisões que alteram o curso de milhões podem ser tomadas nas sombras.
O sigilo na votação para o STF é um muro alto que impede que vejamos o que acontece atrás dele. Protege os senadores de prestar contas à sociedade. Ao escolhermos um representante, esperamos que ele seja nosso espelho, refletindo nossos interesses. Mas, como podemos verificar nossa imagem refletida se o espelho é mantido no escuro? Como responsabilizar eleitoralmente aqueles que agem em desacordo com a vontade do povo se não temos como descobrir quem são?
Insisto que a aprovação de um novo membro do STF deveria ser um espetáculo aberto, onde cada movimento dos nossos representantes é iluminado pela luz da transparência. Eles têm o dever de explicar suas escolhas publicamente, permitindo que o público compreenda os porquês de suas decisões e, sobretudo, permitindo que respondam por elas, inclusive, se for o caso, nas urnas.
A transparência é o farol que guia o navio da democracia, é uma aliada da democracia, não uma ameaça. O voto secreto em questões de tamanha importância, como a aprovação de um novo ministro do STF, coloca uma venda nos olhos dos cidadãos e mina a confiança na integridade de nosso sistema democrático. Precisamos remover essa venda e abrir as portas do Senado para o escrutínio público. Afinal, a democracia pertence a todos nós, e a transparência é o mínimo que merecemos. A democracia é um livro aberto e nós, os cidadãos, temos o direito de ler cada página.