Mês da Consciência Negra: quem são os afrodescendentes que fizeram a história de Jaraguá do Sul?

Por: Natália Trentini

26/11/2021 - 19:11

O Dia da Consciência Negra marca a nacionalmente a luta contra a invisibilidade, racismo, discriminação que se arrastam desde a escravidão. Em Jaraguá do Sul, um movimento dentro do Museu Emílio da Silva busca construir esse reconhecimento da importância dos afrodescendentes resgatando a história e evidenciando o presente.

A exposição “Dia da Consciência Negra: Quem Fez, Quem Faz” está aberta para visitação até 4 de dezembro, além de objetos e documentos que trazem essas raízes, as histórias estão recebendo evidência.

Exposição pode ser visitada no Museu Emílio da Silva | Foto Divulgação/PMJS

Segundo o diretor de Cultura, Sidnei Lopes, essa exposição que nasce para marcar a data simboliza o começo de um trabalho para criar dentro do museu um espaço permanente dedicado à etnia que esteve presente na colonização Jaraguá do Sul desde a chegada das primeiras balsas com Emílio Carlos Jourdan.

“Afinal o Emílio da Silva, o patrono do museu, é negro”, ressalta Lopes sobre um dos grandes historiadores do município.

Os colonizadores negros

Quando o fundador de Jaraguá do Sul pisou pela primeira vez no território que iria colonizar, ele não chegou sozinho: Emílio Carlos Jourdan trouxe 66 trabalhadores para iniciar o Estabelecimento Jaraguá. Desses, 35 eram homens negros que foram pioneiros.

Apesar de ser anos antes do fim definitivo da escravidão no país, relatos da época referem-se a esses trabalhadores como homens livres, contratados para esse trabalho.

“Os que vieram para cá eram trabalhadores autônomos, mas ainda havia aquela exploração velada. Esses primeiros negros que vieram para Jaraguá do Sul foram importantíssimos para a história”.

Quem foram?

Confira o breve histórico feito pelo Museu Histórico Emílio da Silva com base no livro “Memórias do Povoado Morro da África: e a história dos negros em Jaraguá do Sul” e no “2º Livro de Jaraguá do Sul”.

Wenceslau Antônio da Rocha: provavelmente o primeiro negro estabelecido na Colônia Jaraguá, encontrado por Emílio Carlos Jourdan quando da sua primeira expedição no Vale do Itapocu. Acharam-no em uma choupana na Ilha dos Monos, na localidade chamada de Retorcida, onde hoje é Nereu Ramos. Caçador de onças e jaguatiricas, trocava as peles desses animais no Estabelecimento Jaraguá por mantimentos. Casou em 1887 com Guilhermina Rosa. Tiveram três filhos: João Wenceslau da Rocha, Cipriana da Rocha, e Deolinda da Rocha. Tanto Wenceslau, quanto seu filho João, trabalharam com os engenheiros Euzébio Depouy, Antônio Bese Gibrat e com Ângelo Piazera na demarcação de terras e abertura de estradas na colônia Hansa-Humbold, atual Corupá, e também na região do Vale do Itapocu.

Calixto Domingos Borges: nasceu em Porto Belo, era filho de uma escrava alforriada e tinha um pai um português, dono de duas escunas que faziam navegação de cabotagem. Calixto foi o canoeiro chefe da primeira expedição do colonizador Emílio Carlos Jourdan, subindo o rio Itapocu em 1876, que teve como finalidade verificar onde se ergueria o Estabelecimento Jaraguá. Participou de outras viagens pelo rio, trazendo equipamentos para o engenho e da construção. Foi o canoeiro que trouxe a esposa de Jourdan, Helena, ao município.

Maria Umbelina da Silva: era babá dos filhos de Emílio Carlos Jourdan, fundador de Jaraguá do Sul. Nasceu na localidade de Rainha, atual Araquari. Era filha de Manoel Silvestre da Silva e Bárbara Massaneiro, provavelmente escravos alforriados. Trabalhou para a família Jourdan por muitos anos, mas permaneceu em Jaraguá quando o colonizador se retirou para o Rio de Janeiro, em 1900. Casou-se com Alexandre Lopes, em 1879. Ele também era trabalhador de Jourdan no tempo do Estabelecimento Jaraguá. Viúva, Maria Umbelina casou-se em segundas núpcias, com Antônio Bárbara Castelho. Ao todo teve sete filhos. Ela é mãe do pesquisador Emílio da Silva, patrono do Museu Histórico de Jaraguá do Sul Emílio da Silva, e avó de Eggon João da Silva, um dos fundadores da WEG.

Antônia Oliveira: nasceu no Jaraguá do Sul, em 1880, sendo uma das primeiras jaraguaenses natas. Nhá Nega Antônia, ou ainda Antônia Pitoca, como era chamada por muitos, era filha de Justino de Oliveira. Casou com Augusto Carlos Nazário, com quem não viveu por muito tempo. Perdeu uma perna por causa de mordedura de cobra, em 1896. Faleceu em 6 de novembro de 1963.

Maria Rosa: foi uma das parteiras no Povoado Morro da África. Era irmã de Manoel Rosa, o carnavalesco Manequinha. Como outras parteiras, ela também era curandeira e benzedeira. Na foto ela está com a sua afilhada Gracie Pereira.

Infância Rosa: parteira e benzedeira, morava no Bairro da Nova Brasília. Filha do primeiro casamento de Domingos Rosa, um dos trabalhadores do fundador Emílio Carlos Jourdan, com Rita Veríssimo da Conceição.

Ardácia Rosa: parteira e benzedeira. Filha do primeiro casamento de Domingos Rosa com Rita Veríssimo da Conceição.

Pedro Adão Pereira: mais conhecido como Adão policial, era formado pela Academia de Polícia de Florianópolis. Veio para Jaraguá em 1961 e aqui ficou até 1975. Trabalhava na Delegacia perto do atual Mercado Público de Jaraguá do Sul.

Manoel Rosa: mais conhecido como Mestre Manequinha, ou simplesmente Manequinha. Cultivava o Carnaval e a brincadeira do Boi de Mamão. Segundo ele: “[…] esse negócio de Boi de mamão foi meu avô João Estevão que trouxe da África, eles faziam isso lá, trouxe pra cá naquele tempo, meu falecido pai Domingos Rosa aprendeu aquilo, de modo que começou fazer isso aí no morro”.

Armelindo Rosa: funcionário da antiga Fábrica de Pólvora e da Sabões Baratto. Casou com Undina com quem teve sete filhos. Depois desempenhou a atividade de pipoqueiro na Rua Mal. Deodoro da Fonseca, em frente ao atual Colégio Bom Jesus. Era então conhecido como Armelindo Pipoqueiro.

Emílio da Silva: nasceu em Jaraguá do Sul em 1900. Filho de Maria Umbelina da Silva, pioneira na colonização do Vale de Itapocu. Foi um dos primeiros professores da rede pública, vereador, funcionário público até a sua aposentadoria. Pesquisador especializado no estudo de trajetórias da migração alemã na região e fotógrafo amador. Fundador e patrono do Museu Histórico de Jaraguá do Sul, que leva seu nome. Militante da Ação Integralista Brasileira – AIB durante a sua juventude, atuando ao longo da sua vida no movimento Integralista. Tornou-se uma das personalidades mais influentes entre os camisas-verdes na região de Jaraguá do Sul, vivendo até 1999. Filho de Maria Umbelina da Silva e pai de Eggon João da Silva, um dos fundadores da WEG.

Antônio Rosa: nasceu e viveu sua infância no morro da Boa Vista. Trabalhou na fábrica de calçados, carro de pipoca, empresa WEG, Loja Zehnder. Foi engraxate, jornaleiro, carregador de mala, marceneiro. Hoje reconhecido pela sua profissão atual de barbeiro.

Leocádio Osmar Rodrigues: popular Fio, trabalhava como auxiliar veterinário do Doutor Braguinha, na Prefeitura, na inseminação. Como jogador de futebol, foi contratado pelo Acaraí em 1955, com a missão de suceder Antoninho Maba e Chiquinho no gol, da equipe rubra. O “Colosso” acaraiano foi um goleiro espetacular, literalmente fechava o gol do time rubro. Foi dono absoluto da camisa 1 do Acaraí até 1965. Jogou também no Estrela de Nereu Ramos, e no Seleto de Guaramirim. Dividiu com o lendário Gaulke as honras de defender o último reduto da seleção jaraguaense de futebol. Filho de Mão de Onça, o grande goleiro do Caxias de Joinville dos anos 30 e 40.

Um histórico em construção

Diferente de região do Norte do país, que reconhecem com mais propriedade o papel do negro na consturção da sociedade, a maior influência da colonização europeia no Sul é um dos fatores que reduziu essa representatividade ao longo dos anos.

“Enquanto departamento de cultura trabalhamos nisso, para não destacar um etnia mais do que a outra. todas tiveram sua colaboração com a cidade no passado e também no presente”, pontua.

Lopes acredita que resgatar e dar lugar a essa história é fundamental na luta contra o racismo.

“A arte e a cultura, o patrimônio cultural num todo é um grande colaborador para levar o conhecimento para as pessoas”, acredita.

Por isso, o diretor de Cultura ressalta que esse é um trabalho em construção e aberto. O museu pede para que pessoas que conheçam outras histórias, personalidades, que tenham fotos e objetos históricos procurem o museu para ajudar a preencher as lacunas.

 

Serviço

O quê: Dia da Consciência Negra: Quem Fez, Quem Faz

Quando: diariamente até 4 de dezembro

Onde: No Museu Histórico Emílio da Silva,de segunda à sexta-feira, das 7h30 às 11h30, e das 13 às 16h30.

 

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