Das sociedades à grandes competições: o início e primeiros títulos do tiro esportivo de Jaraguá do Sul

Por: Natália Trentini

11/12/2021 - 07:12

Jaraguá do Sul é nacionalmente reconhecida pela tradição com o tiro esportivo, selada pela Schützenfest. Mas o início dessa prática, que hoje é rodeada por técnica e reconhecimento, fez parte da vida cotidiana dos primeiros imigrantes, sendo passada de geração em geração.

A trajetória da família Janssen representa bem essa história no município, indo desde os primeiros movimentos do tiro como prática cultural, até a ascensão da modalidade como prática esportiva e olímpica.

Quem narra essas memórias é Roland Walter Janssen, detentor das primeiras medalhas, que se têm registro, conquistadas para o município nos Jogos Abertos de Santa Catarina (Jasc). Uma precisão e concentração para atingir o alvo corre na família, vinda especialmente do pai Roland Leopoldo Germano Janssen – também reconhecido como o “pai do tiro” em Jaraguá do Sul.

Roland Walter relembra as primeiras participações em competições. Foto Natália Trentini/OCP News

Janssen conta que essa habilidade foi sendo passada desde o bisavô, Leopoldo Janssen, que foi intendente na década de 1920, quando a cidade era um distrito de Joinville. Naquela época, a caça era uma prática comum entre os colonizadores.

A mira de Roland Leopoldo foi sendo lapidada ano após ano e, segundo o filho, aprimorada também na passagem pelo Exército Brasileiro, onde foi um exímio atirador.

Foi assim, com um treinador nato como pai, que ele e os irmãos Karl, Walter e Leopoldo aprenderam a atirar. Era algo familiar e praticado na rotina como uma verdadeira paixão.

“Time Janssen” representando Jaraguá do Sul no Jasc. Foto Reprodução

Do cotidiano ao esporte

Como era parte da cultura dos imigrantes europeus, especialmente germânicos na região, a prática de tiro esportivo surgiu paralelamente em muitas localidades do município. Os primeiros registros de sociedades voltadas à prática datam de 1906 com o surgimento da Schützenverein Jaraguá (Sociedade de Atiradores Jaraguá).

Daí em diante surgiram várias sociedades em salões improvisados, casas e ranchos, sempre ligadas a celebrações típicas, bailes e festas, conta o livro “Festas de Rei”, escrito pela historiadora Silvia Kita.

Confira: Podcast OCP Esporte: o caminho histórico do tiro jaraguaense

Entre as primeiras esteve a Sociedade de Atiradores Dr. Lauro Müller e a Sociedade de Atiradores e Sport Rio Serro II, ambas de 1916; a Sociedade de Atiradores Einigkeit (União) de 1928; entre outras.

Os registros dessa época ficaram perdidos na história, por conta da Campanha de Nacionalização em meados da década de 1930 e a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, narra o livro. Muitas sociedades foram fechadas e qualquer referência em alemão era apreendida.

Foi um período sem muitas atividades. Apenas depois da guerra em 1945 as sociedades voltaram às atividades seguindo registros antigos, mas muitas foram fundadas novamente.

Roland Walter conta sobre os primeiros anos do esporte no município. Foto Natália Trentini/OCP News

Em 1968 existe o registro da primeira equipe de Jaraguá do Sul que foi para os Jogos Abertos, formada por cinco atletas: Amadeus Mahfud, Adolfo Oswaldo Saade, Leopoldo Enke, Adolpho Mahfud e Dietrich Hufenüssler.

Segundo o livro “Baependi: 100 anos de muita história”, a equipe que representava o clube conquistou a sexta colocação nos jogos.

Janssen comenta que alguns deles viraram atiradores do Marechal Rondon e também eram associados.

Foi nesse segundo período que surgiu o Clube de Caça e Tiro e Pesca Marechal Rondon, em 1959, tendo seu Roland Leopoldo como um dos fundadores.

Diferente das demais sociedades que tinham o tiro como parte de festividades de rei e rainha, a prática esportiva foi o principal objetivo. O clube não realizava festas típicas.

Esse foco foi ganhando ares olímpicos em 1989 com o surgimento da Schützenfest, criada pela Associação dos Clubes e Sociedades de Tiro do Vale do Itapocu (ACSTVI). Nessa época, Roland Leopoldo era presidente do Marechal Rondon.

Membros do Marechal Rondon na Schützenfest. Foto Reprodução

Segundo Janssen, o clube comprou munições e usou as armas para tiro olímpico emprestadas pelo empresário Werner Schuster para treinar para a Festa dos Atiradores.

“Não lembro bem se ganhamos alguma coisa, por equipe ou não na primeira, mas depois, em uma década de Schutzenfest, ganhamos tudo, tanto no masculino, como no feminino”, relembra Janssen.

Daí por diante a trajetória da família com o tiro esportivo começou a deslanchar. Janssen relembra que Oscar Schultz, na época presidente da Federação Catarinense de Caça e Tiro Esportivo, era muito amigo de Roland e convidou o clube para participar primeiramente de um campeonato catarinense, depois veio o primeiro Jasc.

“Bastou um ano de treinamento, em 1991, na cidade de Chapecó, conquistamos o campeonato de carabina apoiada. Medalha de ouro em equipe, medalha de ouro para o meu irmão, e eu conquistei medalha de prata, e com a soma de mais alguns resultados ficamos campeões”, conta.

Medalhas conquistadas em 1991, no primeiro Jasc da família Janssen. Foto Natália Trentini/OCP News

Apenas de membros da família Janssen, a equipe de tiro estava completa, tendo Roland Leopoldo como treinador. A equipe participava anualmente dos Jogos Abertos e voltava com medalhas. Nos anos seguintes, novos atletas foram chegando, entre eles Samuel Lopes – responsável por levar Jaraguá do Sul a brasileiros e mundiais de tiro esportivo.

Em 1997, comandados por Roland, a delegação formada por Romeu Milton Herber, Karl Heinz Janssen, Roland Walter Janssen, Samuel Leandro Lopes, Ciliane Raquel Bihr, José Amaro da Silva, Márcio Koch, Walter Janssen Neto e Jorge Guniberto Bihr levou o primeiro troféu geral do Jasc de Armas Longas, em Concórdia.

No ano seguinte, a equipe treinada por Roland conquistou o Campeonato Brasileiro e foi emplacando novas medalhas e troféus a cada novo campeonato.

Walter (E), Roland Leopoldo e Roland Walter. Foto Reprodução

Visão de um grande treinador

Roland Leopoldo Germano Janssen não recebeu o título de “pai do tiro” à toa. A visão dele para a prática com o viés esportivo e olímpico consolidou Jaraguá do Sul como uma das potências da modalidade.

Primeiro, treinando os próprios filhos que conquistaram medalhas ao longo de muitos anos, depois treinando as equipes que representavam o município nos jogos.

Janssen conta que o pai tinha inteligência, visão e um verdadeiro ardor pelo tiro esportivo. Esse entusiasmo ajudou a construir bases que hoje elevam muitos atletas.

“Meu pai chegou a ir para a Alemanha ver os jogos lá, ir a Schutzenfest também na Alemanha. Trouxe um técnico da Alemanha que deu um curso para nós. E cada um que participou do curso, eles eram muito rígidos, tinha que ter aquelas horas, se não, não ganhava o diploma”, relata Janssen.

Do início difícil, sem material e estrutura disponível, era a força de fazer acontecer que fez o esporte ser tão praticado e trazer revelações a Jaraguá do Sul.

O “pai do tiro” e suas medalhas. Foto Reprodução

“Quando nós, os Janssen, deixaram de participar dos Jogos Abertos, já tinha bastante gente no meio da turma. Mas a maioria treinados pelo meu pai”, comenta.

Por essa colaboração, em 2001, já com seus 70 anos, Roland recebeu a medalha de mérito municipal de Jaraguá do Sul pela contribuição e engrandecimento ao esporte jaraguaense. Janssen conta que foi um momento de muita alegria para o pai, pelo reconhecimento do trabalho.

Atualmente, esse legado segue vivo. O viés esportivo do tiro segue sendo levado pelo Clube de Atiradores Jaraguá, que nesse ano foi campeão dos Jogos Abertos pela décima segunda vez, tendo como técnico e competidor Samuel Lopes.

 

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