Católicos compartilham fé e devoção a Jesus na tradicional Via Sacra do Rio Molha

Foto Eduardo Montecino/OCP News

Por: Leonardo Koch

20/04/2019 - 05:04

O que você faria em nome da fé? Promessa, devoção e histórias de superação levam milhares de pessoas a seguir há séculos a tradição do jejum, das orações e peregrinações.

Nem mesmo o horário impossibilitou os católicos de percorrerem um trajeto de 3,5 quilômetros em direção à Igreja Nossa Senhora do Rosário, no bairro do Rio Molha em, Jaraguá do Sul.

O relógio marcava 5 horas em ponto na madrugada de sexta-feira (19) quando cerca de 4 mil fiéis iniciaram a caminhada para relembrar os 15 últimos momentos de Jesus Cristo até o seu calvário.

Algumas pessoas, antes mesmo do evento iniciar, já aguardavam para seguir a procissão junto com os outros católicos.

Para dar início ao percurso, o padre Hélio Feuser concedeu algumas palavras bíblicas e orientações para os fiéis de como a caminhada iria proceder.

 

 

O silêncio e a escuridão que predominava na rua Adolfo Antônio Emmendoerfer foram substituídas pelas orações e as luzes das velas que os religiosos carregavam consigo.

Após o pároco encerar as suas últimas mensagens de fé, em coro, milhares de devotos foram em direção para acompanhar os mistérios de cada estação.

Na primeira capela, os fiéis relembraram a condenação de Jesus e liam o trecho correspondente aos passos do senhor.

Para demonstrar a fé, amor e respeito à Cristo, algumas pessoas subiram o morro descalços. Muitos, trouxeram Bíblias e terços para reflexão.

Mesmo com os rostinhos cansados e lutando contra o sono, até mesmo os pequenos tiveram a oportunidade de acompanhar a caminhada ao lado dos mais experientes.

A procissão iniciou tímida. Na medida em que os cristãos percorriam o trajeto e pausavam para realizar as orações, o som ecoava pelo ambiente bucólico no Rio Molha.

Nesta época do ano e especialmente na Sexta-feira Santa, o despertador para os moradores da região acaba virando os cânticos dos devotos.

Ao andar pelo morro íngreme, é possível ver os olhares curiosos nas janelas. Alguns aproveitaram para se juntar ao cortejo.

Até mesmo os comerciantes ambulantes se misturaram aos fiéis para relembrar a milenar história de Jesus.

Os sinais de fraqueza e cansaço começaram a serem sentidos quando os religiosos estavam na oitava capela, principalmente pelos mais idosos.

Muitos aproveitavam para recarregar as energias comprando água nas barracas improvisadas pelos moradores do bairro.

O tempo também colaborou durante a via sacra. Fazia frio nas primeiras hora da manhã e demorou para amanhecer. O sol tímido que abria espaço entre as nuvens dava a entender que a procissão estava acabando.

A 12ª estação, onde é lembrada a morte e a ressurreição de Jesus Cristo, foi marcada por emoção. Famílias, casais e crianças se juntavam para orar e refletir.

Ao final, o padre Hélio concedeu a sua última benção e ficou a disposição para quem fosse se confessar.

“As pessoas têm que vir por amor”, destaca padre Hélio

Com grande experiência em procissões em cidades como Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e até mesmo Jerusalém, local onde Jesus Cristo foi crucificado, o paróco Hélio Feuser avalia como positivo a participação da comunidade.

“Foi lindo ver essa quantidade de pessoas aqui. Crianças, jovens. As pessoas tem que vir por amor. E esperamos ver todos no domingo, quando de fato Cristo ressuscitou”, explica.

Segundo Feuser, as paróquias que ele frequentou buscavam mais a parte da encenação.

“São formas diferentes de fazer a fé, mas que levam para o mesmo caminho. A via sacra para a igreja tem um sentindo muito profundo”, salienta.

Entre tantas bagagens durante a peregrinação, o padre relembra a primeira vez que esteve em Jerusalém. Segundo ele, foi um momento único que marcou a sua jornada como católico.

“Eu tive a graça de fazer no lugar onde Jesus assumiu a cruz. Lá eu tive um sentimento muito diferente. As pessoas não acreditam na fé de Cristo”, lamenta.

Em uma das situações inusitadas, Feuser recorda o momento que ao invés da comunidade rezar junto com os fiéis, alguns os xingavam durante a peregrinação.

Hélio ressalta também a importância da semana para os cristãos. “Hoje não é dia de passeio para os católicos. Cada um busca a fé do seu jeito, mas para a gente é o momento de reflexão”, salienta.

Tradição familiar e fé

Enquanto esperava o cortejo seguir para a segunda estação, o comerciante Valério Kazmierske, 64 anos, orava. Há mais de 15 anos ele comparece na via sacra. Sempre trouxe a esposa, mas na madrugada desta sexta-feira (19) resolveu ir sozinho.

“Vim agradecer a Deus por tudo que ele fez por nós. Passar por essa caminhada pode parecer fácil para a gente. Mas para Jesus não foi”, explica.

Quem também acordou cedinho e foi até a procissão para relembrar os últimos passos de Jesus foi a mãe Marisa Titzkuehner e seu filho. E engana-se quem pensa que foi a Marisa quem obrigou o pequeno a ir na caminhada.

 “Ele quis participar pela primeira vez. Trouxe para sentir o momento e fazer orações. É um momento único”, revela.

Tímido, o pequeno não trocou muitas palavras e seguiu junto ao cortejo segurando a vela enquanto rezava.

Diferente da família Titzkuenhner, o trecho em direção a Igreja Nossa Senhora do Rosário é um trajeto bem conhecido para a mãe Laura Roberto da Silveira e o filho Roberto da Silveira. Desde 2010, os dois participam da caminhada.

“Vim agradecer por conta das conquistas que tivemos nos últimos anos. Umas delas foi em poder participar da Jornada Mundial da Juventude no Panamá em janeiro e encontrar com o Papa”, revela Roberto.

Sentada na oitava capela, Araceli Spezia acendia uma vela enquanto rezava. Há dez anos, a costureira participa da peregrinação. Mesmo não tendo pago nenhuma promessa, a jaraguaense subiu o Rio Molha para poder sentir o sofrimento de Jesus Cristo.

“Quase todos os anos participo. É um momento importante para nós cristãos. Dia de rever as nossas atitudes”, explica.

Caminho de peregrinação

Enquanto milhares de fiéis percorriam a subida do Rio Molha, a jovem Bruna Azartezo, 26, caminhava descalços o trajeto das 15 estações. “Paguei uma promessa. Vim cumprir”, relata.

Acompanhada de sua amiga, Bruna revela que vem desde pequena na procissão. “É uma experiência incrível, só quem vem aqui pela fé sabe o que estou falando”, completa.

Fé. Sentimento que para muitos é levado a risca. Em jejum desde a hora que acordou, o carioca Cristiano de Castro, veio pela primeira vez na caminhada.

“Vim reviver um pouco do que ele (Jesus) sentiu por nós. Participar do sofrimento dele”, salienta.

De muleta, quem também percorreu os 3,5 quilômetros foi Ademir Alves. Ele sofreu um acidente quando caiu da escada.

“Vim para me recuperar da saúde e pela fé mesmo”, revela.

Para o  casal Marcos Mahfud e Bruna Vitkowsky, a peregrinação tem um significado muito importante em suas vidas. Este ano foi a segunda fez que eles participaram.

“A gente nunca tinha feito e nos marcou muito. Passamos por algumas dificuldades. Viemos esse ano e pretendemos vir nos próximos”, revelam.

A programação da Semana Santa segue neste sábado (20) com a vigília e termina no domingo (21) com a celebração da ressurreição.

 

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