Missão acadêmica na aldeia Guarani-Mbya: Uma aula com os índios guaranis

Por: Rita Grubba

15/07/2017 - 13:07

Muito distante do tradicional ambiente universitário, sala, carteiras e quadro, a aula de antropologia jurídica, da noite do último dia 7 de julho, foi daquelas capazes de, num único encontro, formar e transformar. Éramos cerca de 15 acadêmicos que, acompanhados do dedicado mestre em sociologia política pela UFSC e doutorando em ciência política pela Unicamp, professor Jeison Giovani Heiler, adentramos a aldeia Tiaraju, às margens da BR-280, entre Araquari e Guaramirim, em noite de esplendorosa lua cheia.

Objetivo da missão acadêmica: conhecer e vivenciar um pouco da realidade social, cultural e estrutural da tribo Guarani-Mbya. O choque cultural se fez sentir no interior da ‘Casa de Reza’, a mais ampla edificação de pau a pique, chão batido e cobertura de sapê, local sagrado da aldeia.

Enquanto silenciosamente nos acomodávamos, acontecia um peculiar ritual de casamento. ‘Despidos’ de nossas tradicionais indumentárias e simbologias, véu e grinalda, alianças, juramentos e fotografias, o cacique e dirigentes espirituais se revezavam diante dos adolescentes nubentes e do povo como testemunha.

Pacientemente, valendo-se de ‘ayvu porã’ (‘belas palavras’ na língua guarani), proferiam orientações e aconselhamentos para a futura vida a dois e em comunidade. Encerrado o ritual, o acolhedor cacique Ronaldo Costa sugere uma troca de apresentações e em seguida nos intima a dirigir muitas perguntas.

O grau de curiosidade, medido pelo número de perguntas por parte da ‘tribo da cidade’, certamente não o decepcionou. Chamou-me a atenção o explícito interesse do cacique pela aproximação de tão distintas culturas, não obstante seu compromisso e dedicação em preservar a sua própria.

Subitamente deduzo que tal entusiasmo não se dá, necessariamente, pelo interesse em aprender a nossa cultura, mas em ensinar a deles. A nossa não lhes soma nada de relevante, pelo contrário, subtrai. Já a deles, entre palavras garimpadas, quer subliminarmente nos conferir que, a ‘aldeia da cidade’ é barulhenta, estressada, violenta, individualista, artificial, que polui o ar, os rios, devasta florestas, maltrata animais, tem leis complexas, faz política corrupta e até já fez filme de mocinhos que matam índios.

Mas enfim, por se tratar de uma atividade acadêmica, lá estávamos imbuídos de uma perspectiva jurídico antropológica, o que instigou indagações relativas ao ‘ordenamento jurídico’ da comunidade. Obviamente não há uma lei escrita, mas um código ou padrão de conduta baseado no respeito, unidade social e cooperação, ensinado desde criança.

A carta magna desse povo é regida pela terra e pela natureza, as quais não nos pertence, e sim, somos pertencentes. Penso que, na dimensão do direito, a mensagem que possa ter ficado aos habitantes da ‘aldeia da cidade’, foi de que a lei indígena é simples e pragmática. Por conseguinte, sua justiça é consideravelmente mais orientada pela virtude.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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