“Há como negociar com gente do mal?”

Por: Emílio Da Silva Neto

03/09/2021 - 04:09

Em setembro de 1938, reuniram-se em Munique o primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, Adolf Hitler, Benito Mussolini e Édouard Daladier, entre outros, adeptos da chamada “política de apaziguamento”.

Hitler organizou a reunião e conseguiu o que queria (a anexação dos Sudetos, região da atual República Tcheca), com a promessa de que seria sua última reivindicação territorial (não vale rir !!!).

Chamberlain assinou o famigerado “Acordo de Munique” e voltou triunfante para a Inglaterra.

Ao desembarcar no antigo aeroporto de Heston, em Londres, recebido com festa por todos que colocaram seus delírios e utopias pacifistas acima da realidade, proclamou o infame discurso “peace in our time” (“paz em nosso tempo”).

Winston Churchill, ao falar sobre o acordo, presenteou o mundo com uma das suas mais famosas frases: “entre a desonra e a guerra, escolheram a desonra e … terão a guerra”

O resto é história (!!!): em 10 de março de 1939, Hitler “dá uma banana” para o acordo e invade a antiga Tchecoslováquia. Em 1º de setembro, a Alemanha ataca a Polônia e começa a Segunda Guerra Mundial.

Outro exemplo de que acordo com ‘gente do mal’, quase sempre “dá zica”: em fevereiro de 2020, o governo norte-americano assinou um acordo com o Taliban, em que estes prometiam não apoiar terroristas, dar refúgio a quem solicitasse e permitir a saída de quem desejasse sair do território afegão, tudo documentado, validado e assinado entre as partes negociantes.

Dispensável narrar o resultado. Claro que o Taliban não cumpriu nada, pois continuou tão Taliban como sempre, só que agora, armado pelas armas que os EUA forneceram ao governo afegão, que caiu, em agosto de 2021. É o tal negócio: “nenhum tigre nunca perde suas listras”.

Estes dois casos remetem ao ensinamento de Ariano Suassuna, segundo o qual, de nada adiantam acordos com quem não têm a intenção/possibilidade de cumprir ou, na pior das hipóteses, não possa ser forçado a cumprir o acordado.

Em sua peça de teatro “Auto da Compadecida”, de 1955, o genial dramaturgo, romancista, ensaísta, poeta, professor e advogado, Ariano Suassuna, criou os irreverentes e divertidos Chicó e João Grilo, cheios de espertezas e travessuras.

Em uma das cenas, Chicó, apaixonado, promete ao pai de Rosinha, um grande dote para que possa casar-se com ela, sob pena de que, se ele

não viesse pagar o dote, o pai de Rosinha poderia arrancar uma “tira” de suas costas, pelo não cumprimento do acordo, ou seja, Chicó, literalmente, “pôs a pele em jogo”

Na hora de pagar o prometido – com uma tira do couro de suas costas, é claro, porque dinheiro Chicó nunca teve, mesmo – Chicó implora e, João Grilo, com sua costumeira perspicácia intercede: “pode tirar o couro, mas sem sangue, sem uma gota de sangue, porque o sangue não estava no acordo”. Assim, diante da impossibilidade de tirar o couro sem sangue, o pai de Rosinha desiste de tirar o couro de Chicó, que acaba, então, se casando com Rosinha.

Ou seja, mesmo com um acordo celebrado, “de direito líquido e certo” (com garantias em troca), “deu zica”, ou seja, ele não foi cumprido.

Em síntese, a lição de Ariano é que o resultado e a formalização da negociação é fundamental, mas não é mais importante que a vontade/possibilidade das partes de cumprir o acordado e o necessário poder de forçar o cumprimento se necessário for.

Isto há que ser lembrado, a cada nova negociação, particularmente no Brasil, quando de acordos políticos e pactos morais do poder judiciário, pois “entre gente do bem, não há necessidade de ‘papel’, mas entre gente do mal … não adianta !!!”

Ainda, que a sobrevivência depende muito do entendimento de “quem é quem do outro lado”.

Fontes: Erik Von Kuehnelt-Leddihn, Áustria | José Neumário Faria Vieira, Brasil

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Emílio Da Silva Neto

Dr. Eng., Industrial, Consultor, Conselheiro, Palestrante, Professor (*) Sócio da ‘3S Consultoria Empresarial Familiar’ (especializada em Processo Decisório Colegiado, Governança, Sucessão, Compartilhamento do Conhecimento e Constituição de Conselhos Consultivos e de Família). Doutor em Engenharia e Gestão do Conhecimento.

Curriculum Vitae: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4496236H3
Tese de Doutorado: http://btd.egc.ufsc.br/wp-content/uploads/2016/08/Em%C3%ADlio-da-Silva.pdf
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